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Suzana de Souza Gutierrez

Mapeando caminhos de autoria e autonomia: a inserção das tecnologias educacionais informatizadas no trabalho de educadores que cooperam em comunidades de pesquisadores

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação. Orientadora: Profª. Drª. Carmen Lucia Bezerra Machado

Porto Alegre 2004

Suzana de Souza Gutierrez

Mapeando caminhos de autoria e autonomia: a inserção das tecnologias educacionais informatizadas no trabalho de educadores que cooperam em comunidades de pesquisadores

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.

Aprovada em 22 de julho de 2004.

________________________________________________ Profª Drª Carmen Lucia Bezerra Machado – Orientadora

________________________________________________ Prof. Dr. Augusto Nibaldo Silva Triviños – FACED - UFRGS

________________________________________________ Prof. Dr. Lucídio Bianchetti – FACED - UFSC

________________________________________________ Profª Drª Margarete Axt – FACED - UFRGS

________________________________________________ Profª Drª Marlene Ribeiro – FACED - UFRGS

... à minha família

Ao concluir esta etapa quero agradecer

a todos que de alguma forma me

acompanharam no caminho...

... à minha orientadora Carmen Lucia Bezerra Machado, pelo cuidado, pela coerência e pela liberdade.

... às colegas e aos colegas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, da Faculdade de Educação - FACED/UFRGS, do Programa de Pós-graduação em Educação - PPGEDU/UFRGS, do Programa de Pós-graduação em Informática na Educação - PGIE/UFRGS, do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Trabalho, Movimentos Sociais e Educação - TRAMSE/UFRGS, do Grupo de Pesquisa sobre a Formação de Professores para o Mercosul – Cone Sul, do Programa de Educação Continuada - PEC/UFRGS, do Laboratório de Informática no Ensino Superior LIES, pelo apoio, carinho e paciência.

... em especial às colegas Mara Silva e Vera Corazza, e aos seus ombros e ouvidos incansáveis, pela interlocução inteligente e o carinho.

... aos professores Augusto Nibaldo Silva Triviños e Lucídio Bianchetti e às professoras Tânia Raitz e Marlene Ribeiro.

... à equipe do [zaptlogs], co-autora deste trabalho.

... às colegas e aos colegas do Colégio Militar de Porto Alegre, pelo apoio e compreensão.

...

e

a

todos

que

circulam

pelas

infovias,

linkania

sempre

possível.

RESUMO

Este trabalho se insere no ponto de interseção entre educação, trabalho e tecnologia. Parte da questão: a interação entre educadores pesquisadores na elaboração e desenvolvimento de seus projetos contribui para a constituição de comunidades de pesquisadores e para a construção de alternativas para a formação de educadores autores e autônomos no trabalho com as tecnologias educacionais informatizadas (TEI)? Tem como objetivo investigar a constituição e o desenvolvimento de comunidades de pesquisadores, identificando e analisando as contradições em movimento neste processo, a fim de contribuir para a construção de alternativas para a formação de educadores no trabalho com as TEI. Para isso, realizo uma experimentação na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no período de junho de 2003 a maio de 2004. No projeto, utilizo weblogs como ambientes de aprendizagem por entender que seu formato dinâmico, aberto e público seria um fator diferencial para a investigação. A investigação é de natureza qualitativa, caracterizada como pesquisa-ação crítica. Os resultados da pesquisa indicam que a interação em comunidades de pesquisadores contribui para um processo de formação de educadores autores e autônomos na construção e na utilização das TEI e possibilitam propor uma alternativa para a formação de educadores. Uma rota possível que passa por trazer as TEI para a formação e para o trabalho dos professores por meio dos seus projetos e fazendo esta inserção de forma consciente e crítica.

Palavras-chaves: educação, formação de professores, trabalho, tecnologias educacionais informatizadas, weblogs.

ABSTRACT

This work is inserted in the point of intersection among education, work and technology. Starting from the question: Does the interaction among researchereducators in the elaboration and development of their projects contribute to constitute communities of researchers and to build alternatives for the education of author and autonomous teachers working with computer educational technologies (TEI)? Its goal is to investigate the constitution and development of researchers' communities, identifying and analyzing the contractitions in this process in order to take part in forming alternatives for teacher education. Therefore, the insertion of TEI in the researcher-educators' work is experimental and was carried on in Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (College of Education of the Federal University of Rio Grande do Sul, Brazil), from June - 2003 to May - 2004. The project uses weblogs as learning environments for considering that their dynamic open and public format can be a distinguishing factor to this survey. This is a qualitative research characterized as a critical action-research. The results indicate that the interaction in researchers' communities helps to bring about the education process of author and autonomous teachers who are able to build and use TEI, as well as, make possible to consider an alternative to teacher training. Consequently building a pathway bringing TEI to the education and work of teachers in a conscious critical manner.

Key words: education, teacher training/teacher educational technologies, weblogs.

education,

work,

computer

LISTA DE FIGURAS Fig. 1 – Post do blog Um Novo Tempo

126

Fig. 2 – Post do blog Prática Educativa

128

Fig. 3 – Interface de edição de um weblog

129

Fig. 4 – Projeto Relendo Clássicos – PPGEDU-UFRGS

130

Fig. 5 – Wbloggar, imagem capturada da tela

132

Fig. 6 – Imagem de http://brainoff.com/geoblog em 17/04/2004

133

Fig. 7 – Post em http://esefipa.blogspot.com

137

Fig. 8 – [zaptlogs] em março/abril de 2003

141

Fig. 9 – gráfico sobre o uso do correio eletrônico

147

Fig. 10 – [zaptlogs] – link Atividades

148

Fig. 11 – [zaptlogs-ativ]

148

Fig. 12 – auto-re-organização dos ambientes e processos

159

Fig. 13 – Blog de Camila em ago/2003

162

Fig. 14 – Blog de Camila em fev/2004

162

Fig. 15 – Blog de Daisy em jul/2003

163

Fig. 16 – Blog de Daisy em set/2003

163

Fig. 17 – Blog de Mara em ago/2003

164

Fig. 18 – Blog de Mara em mar/2004

164

Fig. 19 – Vista geral de uma blogquest no [zaptquests]

169

Fig. 20 – A mesma blogquest da fig. 19 vista por um leitor de RSS

170

Fig. 21 – Vista geral do InTramse

173

Fig. 22 – Relendo Clássicos Brasileiros, turma 2003/2

174

Fig. 23 – Relendo Clássicos, turma 2004/1

175

Fig. 24 – Argumento

178

Fig. 25 – Prática Educativa, turma 2004/1

178

Fig. 26 – Prática Educativa: relações estabelecidas na aula presencial

179

Fig. 27 – Prática Educativa: relações ampliadas pelo uso do blog

180

Fig. 28 – Rede construída pelo Projeto [zaptlogs]

181

Fig. 29 – Subprojetos e relações em junho/2003

188

Fig. 30 – Subprojetos e relações em outubro/2003

188

Fig. 31 – Subprojetos e relações em março/2004

189

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CERN – European Center of Nuclear Research. FACED – Faculdade de Educação. EAD – Educação à Distância FEE-RS – Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul. FMI – Fundo Monetário Internacional. html – hypertext markup language. IPA – Instituto Porto Alegre da Igreja Metodista. IRC – Internet Relay Chat. LDBN – Lei de Diretrizes e Bases Nacional. LIES – Laboratório de Informática no Ensino Superior. NCSA - The National Center for Supercomputing Applications. NTE – Núcleo de Tecnologia Educacional. PEC – Programa de Educação Continuada. PPGEDU – Programa de Pós-graduação em Educação. PUCRS – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. RSS – Really Simple Sindication ou Rich Site Summary TAZ – Temporary Autonomous Zone. TEI – Tecnologias Educacionais Informatizadas. TIC – Tecnologias da Informação e da Comunicação. TRAMSE – Núcleo de Estudos, Experiências e Pesquisas em Trabalho, Movimentos Sociais, Saúde e Educação. UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. UNESCO – United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization. www ou web – world wide web. xml – extensible markup language. ZAPT – Zona de Apoio a Pesquisa em Tecnologias.

SUMÁRIO

RESUMO ABSTRACT Lista de Figuras Lista de abreviaturas e siglas 1

QUEM É A ORIENTADORA

10

2

O TERRITÓRIO

18

3

NO PORTAL

27

3.1 3.2 3.3 3.4

31 41 50 68

4

Os tempos e os espaços de produção da vida Uma nova forma de fazer ciência A digitalização do mundo Os espaços-tempos educacionais

CONSTRUINDO A REDE

73

4.1 Os nós 4.2 Os links acessados

75 77

5

ROTAS OU LINKS SÃO ESCOLHAS

79

6

UMA ROTA POSSÍVEL

85

6.1 Educação, pesquisa e tecnologia 6.2 As novas tribos 6.3 Os não-lugares, seus textos e suas práticas 6.4 Viajando pela blogosfera 6.5 Cartografia de uma publicação na web 6.6 O [zaptlogs]

86 104 114 122 125 136

7

RE-LINKAR

186

8

LOG OUT : FECHANDO JANELAS

197

9

REFERÊNCIAS

199

APÊNDICES

209

1 QUEM É A ORIENTADORA1

Quando redigi meu memorial descritivo para a seleção para o mestrado lembrei de Marcel Proust. Lá estava eu, num momentâneo presente, tentando seguir as pegadas que havia deixado e recuperar o tempo. Pude sentir a mesma solidão e a urgência que quase nos toca a pele ao ler Em busca do tempo perdido: “eu não estava situado fora das contingências do tempo, mas submetido às suas leis, tal como aquelas personagens de romance [...]” (PROUST, 1982, p. 42). Sobretudo, descobri a fluidez do tempo, a sua face mutante. Descobri que, quando se pensa o passado, se refaz o passado e se altera o futuro. O tempo se espacializa e funde trajetórias: combina ciclos, linhas e saltos, pontua; ora se lineariza, ora parece ganhar volume, se esconder em dobras.

Um tempo que segue as sendas dos

astros, do dia e da noite, da jornada de trabalho que se conta no relógio e, inesperadamente, um tempo que se conta em batidas do coração, tempo do sentimento e de todas as viagens da alma. Encontrei um tempo sem começo e nem fim, e que só pode ser atestado pelos que contam seu tempo conosco. Nosso presente é inacabado, reinventado a cada vez que planejamos o futuro ou relembramos o passado. Nascemos para nós mesmos a cada instante e não coincidimos conosco. Nosso todo se reflete apenas

1

Orientadora, no sentido usado neste texto, significa aquela que prática a Orientação. Orientação é o nome de um desporto “onde o praticante desloca-se em terreno desconhecido localizando, com o auxílio de uma bússola, pontos de controle marcados no mapa” (GUTIERREZ, 2000, on-line). No texto usarei a palavra Orientação com esta grafia para designar o desporto. Sobre a Orientação consulte http://run.to/orienta.

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no olhar do outro, que registra cada uma de nossas mutações e terá, talvez, o destino de desenhar o nosso ponto final. Entre outras coisas, descobri que meu mestrado iniciou bem antes de seu projeto e, isso, assume uma maior clareza hoje, quando refaço os caminhos que trilhei. Nasci em Porto Alegre, na madrugada de uma segunda-feira de carnaval e há quem diga que isso, por si só, já implica e explica muitas coisas. Fui uma criança amada que cresceu num bairro de casas simples onde todos se conheciam. Tive uma bela e curiosa infância, uma rebelde e engajada adolescência e uma juventude batalhadora. Não lembro quando aprendi a ler, mas lembro dos livros. Fecho os olhos e vejo meus livros de pano, grandes nas minhas mãos pequenas. E faço um jogo. Qual a coisa mais antiga que consigo lembrar? Lembro de um quintal com plantas e musgo e de uma lata de lixo do meu tamanho que um dia me apertou a mão. E lembro dos livros. Do seu som na voz dos meus pais, do seu colorido e do seu cheiro. Cresci com eles, os poucos que tínhamos na família. Li e reli tudo o que podia ser lido, principalmente as condensações do Reader’s Digest e a enciclopédia Delta Larrousse que ainda guardo.

Lá pelos oito anos descobri um lugar

maravilhoso chamado biblioteca. No tempo em que as crianças podiam circular sozinhas pelo bairro, encontrei a pequena biblioteca pública que ficava numa praça. Muito do que lia não entendia e só vim a compreender na adolescência na terceira ou quarta releitura. Por esta época, já não conseguia dormir sem ler e ainda hoje durmo no meio dos livros. Ler é uma das minhas maneiras preferidas de conhecer e significa, para mim, ir além das circunstâncias. Quando um assunto me interessa, o primeiro

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pensamento é: Em que livro encontro isso? E, dentro do possível, eles nunca me faltaram, pois meus pais, embora tivessem freqüentado pouco a escola, sempre respeitaram e valorizaram o conhecimento como algo quase que sagrado. Vivi com a maior alegria o meu primeiro dia na escola. O primeiro ano do chamado “jardim da infância”. Ir à escola alargou minhas fronteiras em todos os sentidos, com novos espaços de descoberta, novas possibilidades de relações. Minha formação (primário, ginásio e científico) foi toda realizada em escolas estaduais. Fui o que se considerava uma boa aluna. Disciplinada, cumpria da melhor forma possível o que me era solicitado. Não me sentia motivada ou autorizada para ir muito além do pedido, na forma e no conteúdo, com exceção das artes, da literatura e da educação física.

Estas abriam espaços para a expressão e a

criatividade. No ginásio, passei a questionar estes limites que a escola impunha e que engessavam nossas formas de ver o mundo e construir referenciais. Minha corporeidade se constituiu em meio à música, à literatura, ao cinema, às competições esportivas, às manifestações e passeatas no final dos anos 60. Namorar, jogar, correr para comprar o Pasquim2 antes que fosse recolhido das bancas. O segredo dos livros passados de mão em mão e dos panfletos carregados nas meias. Destas vivências ficou-me a convicção de que precisamos ser radicais na busca de nossas referências, ir além do que nos é mostrado e ensinado. Cursar Educação Física não foi fruto de muita reflexão ou conseqüência de um grande interesse nesta área. Queria ser escritora e cheguei a pensar em letras ou jornalismo. O pragmatismo familiar rebatia com medicina ou engenharia, estas sim profissões. Escolher Educação Física deu-se mais por interesses esportivos e 2

Semanário carioca fundado em junho de 1969, um tablóide contestador muitas vezes censurado e retirado das bancas, que tinha na equipe Jaguar, Ziraldo, Millôr, Paulo Francis e Henfil.

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técnicos do que por vocação para ensinar. Todavia, o curso de Educação Física descortinou outros caminhos que não apenas o técnico. Comecei a dar aulas já nos primeiros semestres, descobri que gostava disso e não parei mais. Pouco tempo depois, ingressei na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), no curso de Engenharia Civil. Nesta escolha, segui a orientação da família e, também, a minha tendência natural de fazer várias coisas ao mesmo tempo. Daí em diante, meu dia ficou cheio: Engenharia de manhã, lecionar à tarde, Educação Física à noite. Este foi um período acrítico, com muita ação e pouca reflexão. Um período de dúvidas sobre o destino desta formação profissional que seguia caminhos tão divergentes. Dei prioridade à Educação Física e concluí o curso no tempo mínimo previsto.

Apesar de ter ficado em segundo plano, a

Engenharia ocupou espaços, fazendo com que eu me interessasse pela informática, uma das disciplinas do curso, e que procurasse aperfeiçoar os conhecimentos obtidos. Nesta época, eu já lecionava no Colégio Americano e, após a formatura, comecei a lecionar na Faculdade de Ciências da Saúde do IPA, na disciplina de Ginástica Olímpica. Continuei lá até 2002, tendo as mais variadas experiências profissionais. Lecionando diferentes disciplinas mantive a consciência de que contribuía para a formação de um professor, um todo indivisível em aspectos técnicos, pedagógicos ou pessoais. Embora tentando ser abrangente na totalidade, ainda assim, seguia o modelo que dissociava a teoria e a prática, o técnico e o pedagógico. As dificuldades por mim enfrentadas no trabalho na escola provocavam a necessidade de aprofundar o âmbito pedagógico de minha formação, para que melhor pudesse resolver as questões emergentes no meu cotidiano de professora.

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Posso dizer que de um tecnicismo ingênuo inicial passei para novas formas de relação com o conhecimento, por meio de um movimento ação-reflexão progressivamente mais crítico e maduro. Minhas certezas diminuíram e comecei a considerar bem vindas as dúvidas. Conjuntamente, exerci funções de chefia de departamento e assessoria à coordenação do Curso de Educação Física, o que me proporcionou uma visão geral da instituição, da sua inserção no sistema educacional e de todos os cenários onde acontecia o nosso viver em educação e trabalho. Fazendo malabarismos com a felicidade, as contas a pagar e o meu ser professora, casei e tive meus dois filhos. Conclui o curso de Engenharia Civil e a especialização em Metodologia do Ensino Superior.

Na especialização, meu

trabalho de conclusão foi uma pesquisa sobre o perfil profissional do professor de educação física e sua construção ao longo do curso. Foi um trabalho de iniciante, numa abordagem eminentemente quantitativa, sob a ótica positivista que permeava as ciências humanas naqueles tempos. pedagógica”.

Assim mesmo, foi a minha “virada

Autores como Vygotsky, Piaget, Paulo Freire, Vítor Marinho de

Oliveira, Gadotti, João Batista Freire, entre muitos outros, vieram enriquecer minhas referências teóricas sobre educação e educação física. Nesta época, passei a lecionar a disciplina de Estágio Supervisionado e segui acompanhando o percurso dos alunos nesta etapa que entrelaça a finalização de sua formação na graduação e o início de sua caminhada oficial como professor. Pouco depois, acrescentei a disciplina de Prática de Ensino ao trabalho que já realizava na faculdade e voltei a trabalhar com o ensino fundamental e médio. A falta de movimento e desafios no trabalho me inquietava. Esta situação, me motivou a participar de concursos para professor em nível municipal, estadual e federal. Aprovada em todos, tive uma passagem meteórica pelo município e estado,

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escolhendo permanecer no Colégio Militar de Porto Alegre. Assim, voltei a trabalhar no ensino fundamental e médio o que veio a enriquecer meu trabalho na licenciatura. Meu interesse por informática continuava. Aos poucos fui construindo bons conhecimentos no uso das tecnologias computadorizadas, incluindo o uso de editores de texto e imagem, ferramentas de desenvolvimento de páginas e documentos para a web3, planilhas eletrônicas e banco de dados , editores de html4, e ferramentas de internet como o correio eletrônico e os mecanismos de busca. Aperfeiçoei a lógica e o uso de algumas linguagens de programação. Sempre estive apaixonada por computadores. Mesmo na época da engenharia, reinado do monstro comedor de cartões que ficava fora das nossas vistas. Nos correspondíamos! Conheci os microcomputadores ao final do curso e, assim que pude, comprei um. A internet veio bem depois e descortinou um mundo de novas possibilidades. E uma das mais maravilhosas destas possibilidades é a do encontro, da interação quase que sem limites entre as pessoas. Somos seres que construímos nossa identidade na relação com o outro. Nas relações sociais que envolvem a aprendizagem, o trabalho, o afeto, o lazer. Mediados pela comunicação que integra cada uma destas relações, formamos comunidades. Nestes últimos anos, tempo e espaço vêm sendo as categorias mais marcantes para mim. Anacronia de eventos que emergiram fazendo seu espaço num tempo que representava a continuidade de projetos que traçariam os meus rumos num futuro próximo.

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web ou www – rede mundial de computadores. html significa linguagem de marcação de hipertexto e é uma das linguagens para construção de páginas na web. 4

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Hoje, voltando o olhar sobre este período, reconheço a profundidade das mudanças e, também, a sua indeterminação sob uma aparente determinação inicial. Em relação às mudanças, algumas foram planejadas com maior ou menor cuidado, outras desejadas e outras ainda, não esperadas. Em 1999, participei da seleção para o mestrado no Programa de Pósgraduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGEDU – FACED – UFRGS). A proposta era estudar a formação de professores no contexto das tecnologias da informação e da comunicação. Fui aprovada na prova escrita, porém não fui selecionada para a única vaga da linha de pesquisa Formação do Professor na Sociedade Informatizada. A convite do professor Augusto Triviños, titular desta linha de pesquisa, passei a cursar a sua disciplina no PPGEDU como aluna do Programa de Educação Continuada (PEC).

O contato com os educadores do PPGEDU, por meio das

disciplinas e dos grupos de estudo e, também, das reflexões e trabalhos efetuados, foi de grande influência na concepção teórica que norteia meu trabalho em educação. Inspirou-me a expressar o que estudava em textos, apresentações e projetos. No final de 2001, passei por três seleções para o mestrado e pude optar pelo curso que mais desejava. Tive projetos aprovados e o reconhecimento de um trabalho que vinha construindo há bastante tempo.

Ao mesmo tempo, sofri os

revezes de quem é educador sob uma visão de mundo onde o critério dominante é o do menor custo e máximo lucro. Integrei nos meus caminhos os espaços da FACED. Tracei suas trilhas e seus desníveis, situei pontos de referência. Nas andanças, me afeiçoei aos trajetos e aos caminhantes. Perturbei, deixei a minha marca no espaço-tempo. Conheci e me

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dei a conhecer, estabeleci ligações, tecendo e integrando a rede sem centro e sem limites das afinidades, dos afetos, do conhecimento compartilhado. Aprendi muito e creio que ensinei bastante, também. Cá estou, com toda esta bagagem e sempre a caminho, avançando, recuando, enfim, me atrapalhando como todo mundo. Vivendo vida plena de quem não veio a este mundo para ser apenas espectador.

2 O TERRITÓRIO

- Ora essa, parece um grande tabuleiro de xadrez – terminou por dizer. – Deve haver algumas peças sendo mexidas por ali... e lá estão elas! – acrescentou, encantada, e seu coração ficou aos pulos enquanto continuava a falar: - É uma grande partida de xadrez que está sendo jogada no mundo inteiro... se é que isso é o mundo. Oh, mas que coisa engraçada é isso tudo. Como eu gostaria de ser um deles! Não me importaria se eu fosse apenas um peão, contanto que pudessse... 5

Um mapa6 é uma representação distorcida, mas regulada, da realidade. O mapa fixa, num determinado momento, o movimento da realidade. Como não pode coincidir ponto a ponto com o terreno, ele distorce a realidade segundo certas regras, se valendo de três mecanismos: a escala, a projeção e a simbologia. Estes são mecanismos autônomos que exigem que o cartógrafo tome decisões segundo a finalidade do mapa. Alguns mapas podem privilegiar a representação, outros a orientação. O mapa que abrange uma grande área e, por isso, é feito em pequena escala, favorece a orientação geral e o movimento pela visibilidade total das rotas, mas não representa o terreno em riqueza de detalhes. 5

O mapa que abrange uma

(CARROL, s/d, p.33) A necessidade de caçar ou buscar alimentos longe de sua habitação fez com que o homem desenvolvesse estratégias que lhe possibilitassem retornar. Por detalhes marcantes do terreno e, mais tarde, utilizando-se da posição dos astros, pode o homem orientar-se no tempo e em caminhos que o levavam cada vez mais distante. Há dois mil anos, os chineses inventaram a bússola, conferindo um enorme impulso à navegação e ao deslocamento em territórios desconhecidos. Na época das grandes navegações, séculos XV e XVI, as técnicas de orientação foram progressivamente se aperfeiçoando e difundindo, pela necessidade de percorrer milhares de quilômetros em alto mar. Situação esta onde a bússola e o sextante não permitiam determinar as coordenadas exatas. A necessidade de guardar e comunicar trajetos e rotas fez com que estes fossem representados por meio de símbolos, ícones e caracteres escritos. Estas representações são os mapas que evoluíram juntamente com os demais conhecimentos humanos. Na época das grandes navegações, um portulano – espécie de mapa/diário que incluía todas as informações possíveis sobre rotas e portos – valia fortunas e era causa de vida e de morte. De guerra entre os navegadores e entre as nações. 6

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área pequena pode ser feito em grande escala, o que privilegia a representação e a posição, facilitando o deslocamento local, pela riqueza dos detalhes que pode conter, mas não diz muito sobre a totalidade. Os mapas fixam um momento da realidade objetiva que está sempre em movimento. Assim, eles capturam as dimensões de comprimento, largura e altura, situam a realidade por meio das coordenadas de latitude e longitude e a representam na superfície plana. Não mostram o território em si, mostram as diferenças de altura, de constituição do terreno e os elementos que expressam a intervenção humana. São obras de nossas mãos e, nelas, adquirem uma quarta dimensão, que é o tempo. O tempo-duração que ‘gastamos’ ao percorrê-los, a flecha do tempo inscrita em cada mutação, em cada diferença existente entre a realidade sensível e a realidade representada. Os mapas, assim como as obras de arte, são representações de uma determinada época. O mapa de um percurso teórico-prático deve considerar todas estas características e atributos dos mapas cartográficos. É uma proposta que se sabe de antemão inacabada e em constante mudança. O mapa de um percurso de investigação é hipertextual, é recursivo, onde cada caminho trilhado reorganiza a totalidade representada. Assim, deve oferecer uma visão clara da totalidade do território, para que se possa escolher o ponto inicial e pensar as possíveis etapas rumo ao ponto final desejado. Embora possamos viver num mesmo território, não utilizamos os mesmos mapas para percorrê-lo. Por outro lado, não raramente utilizamos o mesmo mapa para percorrer territórios diferentes. As redes de computadores, com sua multiplicidade de infovias e de territórios, vieram trazer mais complexidade a esta característica de nossos espaços conhecidos. De suas inumeráveis e cambiantes

20

conexões, emergem lugares outros, onde as fronteiras se diluem e os contornos perdem definição. Estas redes, convulsionando o espaço-tempo, transformaram, mais uma vez, as nossas relações entre mapas e territórios. A prodigiosa aceleração, que nos arranca de nossas referências e símbolos, torna-se apreensível momentaneamente nas metáforas que construímos. Podemos pensar que, no acesso aos espaços virtuais, está implícito o abrir de uma janela para outra dimensão, rica em novas possibilidades interativas, ou um abrir de comportas para um dilúvio de informações, que tanto podem nos potencializar o conhecimento, quanto nos sufocar na alienação e na banalidade. A primeira metáfora lembra um livro que eu gosto muito: Aventuras de Alice Através do Espelho, de Lewis Carroll (s/d), onde uma menina, ao saltar para dentro de um espelho, encontra um mundo onde o tempo e o espaço assumem diferentes formas. Neste mundo desconhecido, ela parte para aventuras, tendo que reorganizar sua forma de pensar e mobilizar de modo diferente os seus conhecimentos. A segunda metáfora subentende a aceitação do movimento, do fluxo das interações. Ação, no primeiro caso, reação, no segundo. Penso que as duas coisas acontecem, pois ambas estão inseridas no movimento das contradições de nosso humano viver, uma é o resultado do diálogo com a outra. Foi com este jeito alice que conectei pela primeira vez à internet. Fazia algum tempo que eu possuía um computador, quando pude ampliar suas capacidades, melhorando a memória, o espaço em disco, instalando um moden7 e multimídia8.

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Modem quer dizer modulador-demodulador. É um aparelho que modula sinais para transmissão por linhas telefônicas e, também, demodula os sinais recebidos, permitindo assim a comunicação entre computadores. 8 Multimídia é a integração de vários meios de informação no computador, tais como sons, imagens e texto.

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Minha tela passou a contar com novos ícones, portas para novas descobertas que fui acessando aos poucos. Em princípio, tratei de aprender como manejar o correio eletrônico e o navegador. Fiz isso explorando, testando, errando, perguntando, lendo os arquivos de ajuda. Havia um determinado ícone da tela, colocado por iniciativa do técnico que fizera a instalação, que se tornou muito importante na minha aprendizagem. Era o acesso para um aplicativo chamado Avalanche que, quando executado, fazia conexão com algum tipo de lugar e abria uma janela oferecendo várias opções de acesso desconhecidas. Depois de algumas tentativas sem encontrar nada, escolhi a opção chamada #scripts e abriu-se uma grande janela. Digitei, então, a frase que foi a

minha

primeira

interação

com [01:00] Telemar.SSA.BA.Brasnet.org[0] 0

pessoas na internet:

460063 25521 4868252 291879 209416 0 [01:00] Vetorialnet.RGD.RS.Brasnet.org[0] 804796 453902 24695 11835 615 10553 0

o que são scripts?

A

frase

surgiu

[01:00] End of /STATS report

na

tela.

Aparentemente, marginal era eu. script é isso que vc ta usando para entrar aqui.

[01:00] a vetorialnet ta com muito lag [01:00] pode ver o sendq muito maior... [01:01] 804796 [01:04] qual o nº q se olha? o 1º? [01:05] isso [01:05] como vc pegou estes dados? [01:05] SendQ SendM SendBytes RcveM

Na conversa que se seguiu,

RcveBytes Open_since Idle [01:05] o comando eh /stats l

descobri que Avalanche era um script

(fragmento de diálogo na rede Brasnet, em 1999.)

criado para um aplicativo chamado mIRC e que IRC9 era o tipo de rede que eu estava acessando. Foi neste espaço que comecei a aprender sobre a internet e seus usos. Da navegação solitária passei aos

9

IRC é uma rede de redes, que abriga salas ou canais, onde se reúnem pessoas para os mais variados contatos: amizade, interesse comum, trabalho etc.

22

territórios povoados e colaborativos. Ouvindo, perguntando, seguindo dicas, pesquisando ... O contato com aquelas pessoas, algumas distantes e desconhecidas, me fez compreender a rede e muitas de suas possibilidades. Fez com que eu pudesse transpor para a internet e exercitar, também, a forma de aprender que já estava implícita na minha relação com os livros. Aprender de forma independente, autônoma, fora dos limites dos programas e currículos, buscando o conhecimento que está no mundo nas práticas das pessoas. Não só descobri o que era um script, como construí um, o RuNNer10, no início para uso próprio e, mais tarde, para alguns amigos. Isso depois que explorei tanto alguns scripts, desconstruindo-os a ponto de chegar-lhes nas tripas, descobrindo que eram programados usando uma linguagem parecida com as que eu aprendera no curso de engenharia. Mais tarde, devido às solicitações, decidi disponibilizar o RuNNer na rede. Como uma coisa leva a outra, aprendi html para poder fazer a página. Foi nessa época que me tripliquei na rede: suzzana, a usuária comum; RuNNer, a scripter que todos imaginavam ser algum adolescente; SusieQ, a Ircop, uma das poucas operadoras da rede Brasnet 11. Foi possível constatar que construir conhecimento passa pelo contato com informações distribuídas nos mais variados espaços. Uma condição de possibilidade mediada pelas pessoas que interagem nas redes, dialogando, cooperando, construindo sentido. Uma possibilidade, quase sempre, anulada nas escolas e nos locais de trabalho, quando bloqueiam o acesso a redes de IRC e a outros canais de comunicação, para que alunos e trabalhadores não percam tempo em brincadeiras e bate-papos. 10 11

RuNNer Script – ainda pode ser encontrado em http://get.to/runner Brasnet é uma rede de servidores de IRC (internet relay chat) – http://www.brasnet.org

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Ao mesmo tempo em que travava diálogos como este, informação que foi guardada para consulta e que, hoje, é resgatada numa dissertação que, na

época,

eu

nem

imaginava,

[Session Start: Thu Jul 29 13:26:36 1999 [13:26] oie [13:26] me ajuda num treco [13:26] nao sei o que é g-line

continuava a minha interação nos territórios conhecidos, na escola e na

universidade.

dialogicamente,

Aprendendo

comparando

as

práticas, percebendo os pontos de

[13:26] claro [13:26] se puder [13:27] vc sabe? [13:27] g line é ban do servidor [13:27] nao é o mesmo que k line? [13:27] mesma coisa? [13:27] kline é da brasnet [13:27] nao entra por nenhum server

intersecção, onde as minhas novas práticas encontravam as antigas.

[13:28] mas eu dou kline [13:28] e nao sou admin geral [13:28] achei q kline so bania da conesul

Sentindo as conexões entre elas se estabelecerem,

transformando

o

[13:28] pera ae entao [13:28] eheheh [13:28] xo consulta uma hp [13:28] pera la

meu trabalho. Tentando compartilhar meus achados com os colegas, constatei

[13:28] nao sera invertido? [13:29] acho que sim entao [13:29] ehehehe [13:29] pera ae que te falo com certeza

as

dificuldades,

as

resistências.

Acompanhando algumas tentativas

[13:29] nao tem no operserv help [13:31] vc tem razao (fragmento de conversa na rede Brasnet, em 1999.)

de alfabetização digital, promovidas pelas instituições às quais eu estava ligada, pude perceber que estas iniciativas, na maioria dos casos, consistem em treinamentos ou cursos em informática puramente instrumentais. Não têm vínculo com as práticas e os projetos dos professores e não permeiam o curso de formação onde são implantadas.

Muitos laboratórios de

informática se constituem em guetos altamente especializados e, até, privatizados, completamente dissociados dos cursos a que pertencem.

24

Assim, surgiram as primeiras questões que, em seu movimento, deram origem a esta investigação e que tiveram visibilidade durante o seu processo, como se pode constatar no diálogo anterior. Por que a grande maioria dos professores não aplica o que aprendeu nestes cursos de formação para o uso das tecnologias educacionais informatizadas (TEI)? Por que seu aprendizado se limita ao curso e cessa quando este termina? Por que a escola, os professores, os alunos resistem à inserção das TEI nas suas práticas? Que possibilidades a interação e a colaboração nestas comunidades12 que se formam na internet traria para a educação? Que característica teria a aprendizagem nestas comunidades?

Quais as relações entre as comunidades materiais e as

comunidades que se formam na rede? Movida por estes interesses, difusos ainda, construí meus primeiros projetos na faculdade onde trabalhava. A maior parte do tempo me sentindo como alguém que vê algo que os outros não estão vendo. Propus a criação de um núcleo de apoio à inserção das tecnologias educacionais informatizadas que trabalhasse a partir dos projetos dos professores, alunos e grupos. Este projeto vegetou por quase dois anos até conseguir sair do âmbito da minha disciplina, ser aprovado pelas comissões e encaminhado à direção. Sua aprovação, no entanto, aconteceu simultaneamente à minha saída da faculdade. A contradição é realmente o cerne do movimento das coisas... Numa semana, aprovaram meu projeto e me deram um aumento de carga horária e de salário para sua realização. Na semana seguinte, fui demitida, juntamente com todo a maioria dos professores e funcionários com mais tempo de casa, para diminuição dos custos. [Su, 28/08/2002, Onde anda, Su?]13

12

As comunidades que se formam na internet são usualmente chamadas de Comunidades Virtuais. O termo virtual é controverso e muitos autores optam por usar outras expressões, como “comunidade on-line”, “comunidade baseada na comunicação mediada por computador”. Outros preferem abolir o termo comunidade, substituindo a palavra por “rede”, “grupo”. Para um maior aprofundamento deste assunto, consultar Castells (1999) e Jones (1997).

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De modo geral, o computador e a internet ainda são muito considerados como ferramentas que podem facilitar certas tarefas ou ampliar as faculdades humanas quando necessário. Não faz muito tempo que chegou ao debate a possibilidade destes meios alterarem a ecologia do ambiente onde estão inseridos e colaborarem para definir novas relações com o saber e novas relações entre as pessoas. No entanto, comunidades estão se constituindo em e na rede, de uma maneira inteiramente diferente da formação das comunidades humanas até então vistas e estudadas. Comunidades constituídas em circunstâncias onde tempo (sincronia) e espaço (território) podem deixar de ser centrais ou limitantes e o foco pode se voltar para os interesses, para a comunhão de pensamentos e sentimentos, uma nova polis que emerge com a técnica. Estas comunidades se comunicam e interagem em ambientes virtuais e neles se manifestam por meio da linguagem como autores e co-autores de um gigantesco hipertexto14 em devir, sempre inacabado, sempre aberto à inclusão de outras vozes. Criam, assim, condições para a construção do conhecimento, a colaboração e a autoria. Existem

muitas

questões

a

serem

investigadas

relacionadas

ao

ciberespaço15, a cultura e as relações sociais que nele emergem. Questões como as formuladas anteriormente e outras, como a construção de identidades, a formação de coletivos inteligentes, a retribalização do mundo, a autoria, a liberdade

13

Todas as imagens nesta dissertação foram por mim elaboradas, com exceção da imagem de fundo do sumário que é de Ross Mayfield. As carinhas marcam as falas dos diversos educadores, inclusive as minhas. O uso de nomes ou apelidos foi autorizado pelos educadores participantes da investigação, conforme Termo de Consentimento Informado (apêndice E). Foram anotadas literalmente dos ambientes virtuais, inclusive com os erros ortográficos, gramaticais e de digitação. 14 Hipertexto é a escrita não linear usada nas páginas de internet, onde a cada momento o leitor pode ser desviado para outros textos ou mídias, compondo ao final um percurso seu, sendo de certa forma um co-autor. 15 “Eu defino o ciberespaço como o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores.” (LÉVY, 1999a, p. 92)

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e a corporeidade, por exemplo. A maior parte destas questões está presente nas chamadas comunidades virtuais16 que interagem com as comunidades materiais, complementando e enriquecendo sua visão de mundo. Um movimento comunal como processo, plural, multicultural e inclusivo que se reinventa na interação e na busca da re-contextualização do humano em sua dignidade. Encontro, na complexidade destas relações, um espaço de emergência da cooperação, da solidariedade, da proximidade de povos e culturas distantes. Encontro, também, a possibilidade do entrelaçamento das comunidades de interesse compondo uma rede multidimensional com as comunidades geográficas. Penso que é importante traçar rotas teóricas que orientem e registrem os nossos percursos, nossas idas e vindas no território, tangenciando os limites das possibilidades, mapas que confiram materialidade ao nosso tempo.

16

É possível falar em comunidade virtual? Acredito que sim se pensarmos numa virtualização da comunidade como possibilidade de questionamento, conforme descreveremos mais adiante. Assim, tanto uma comunidade que interage presencialmente, quanto uma comunidade que interage por meio da internet poderiam ser virtualizadas. Comunidade virtual é um termo consagrado para designar as comunidades que interagem na rede e é nesse sentido que vem sendo utilizado neste trabalho.

3 NO PORTAL

... o quê os mapas mostram e, ao mesmo tempo, escondem.

Construindo a proposta de dissertação, ao mesmo tempo fui criando um mapa que me orientasse nos caminhos da teoria-prática da investigação e que pudesse me auxiliar a levar comigo, pelas rotas que fui escolhendo, todos aqueles que, por diversos motivos, acompanhavam o meu trajeto. Num determinado ponto da elaboração do projeto, a recorrência das analogias com mapas, caminhos, orientação me fez optar por deixar que esta metáfora, que vinha me guiando interiormente, permeasse o texto e se tornasse visível no projeto como um fio condutor da minha construção. Hoje, avalio esta construção como uma forma de auto-organização do conhecimento e dos aportes teóricos que vinha reunindo. Não um fenômeno espontâneo, mas uma autoorganização dialeticamente tecida no movimento teórico-prático de conhecer a realidade. Este movimento, de certa forma, ficou mapeado, registrando o processo, o que fica evidente em algumas repetições e redundâncias. Necessidade minha de pesquisadora iniciante de reafirmar os passos, de confirmar e re-confirmar as escolhas. Este processo partiu da minha prática social, pois no meu cotidiano como professora de educação física, trabalho com a orientação na Orientação. Orientação é o nome de um desporto “onde o praticante desloca-se em terreno desconhecido

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localizando, com o auxílio de uma bússola, pontos de controle marcados no mapa” (GUTIERREZ, 2000, on-line). É considerado um desporto para todos, pois dele podem participar pessoas de qualquer idade ou condição física. Pode ser praticado como atividade utilitária, como competição ou como recreação, além de poder ser utilizado como meio para a aprendizagem em várias disciplinas. Orientar-se significa conhecer a simbologia dos mapas, pensar e planejar caminhos, fazer escolhas, tomar decisões, reagir ante o imprevisto. Significa, também, enfrentar a solidão e ter autonomia quando sozinho e, quando em grupo, cooperar e compartilhar decisões. A aprovação do projeto de dissertação me colocou numa nova zona de partida17 e com uma escolha a fazer: optar entre o mapa do mestrado e o mapa de percurso mais longo do doutorado. A banca de qualificação entendeu que meu projeto tinha as características e a abrangência necessárias para ser um projeto de doutorado e, na sua avaliação, recomendou que fosse encaminhada esta alteração no nível dos estudos. A indicação para mudança de nível e o reconhecimento do meu trabalho que ela evidenciou foi um dos melhores acontecimentos da minha vida. Porém, a situação funcional de professora do ensino fundamental e médio federal e as condições materiais de vida e trabalho condicionaram minha escolha. Preciso terminar o percurso mais curto do mestrado para poder iniciar o percurso mais longo do doutorado. Nesta nova zona de partida, senti a necessidade de renovar o fio condutor, reforçando e ampliando as relações. Da metáfora dos mapas e dos percursos no

17

Em uma competição de Orientação, a zona de partida é o local onde os participantes se reúnem antes da largada. A área de concentração é onde os participantes de uma competição de orientação se reúnem antes de serem autorizados a ir para a zona de partida.

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território, cheguei à meta-metáfora dos percursos híbridos, onde a rede se esgarça e toca o chão, os mundos se interpenetram e abre-se o Portal. O Portal18 apresenta ao viajante um mapa dos mapas. É uma das entradas da rede, um nó entre nós. No portal, podemos analisar os mapas disponíveis, buscar outros mapas adiante, fazer algumas escolhas. Estar no portal é como estar na área de concentração de uma competição de Orientação. Porém, enquanto na área de concentração o tempo marcado condiciona as ações, no portal, podemos condicionar o nosso tempo dentro das

temporalidades que ele movimenta.

Enquanto na área de concentração recebemos um determinado mapa, com pontos de passagem obrigatórios e ordenados, no portal escolhemos/construímos o mapa e os nós por onde passaremos. As rotas que escolhemos, numa competição de Orientação, remetem aos links19 de uma página na web. Em alguns tipos de terreno, o orientador pode abrir caminhos novos. Em alguns tipos de sites, o cibernauta20 pode criar links novos. Desta forma, ambos os viajantes alteram o território por onde passam. Enquanto o território físico pode ser descoberto, desbravado, ocupado, o território virtual pode ser criado, expandindo a rede, multiplicando as conexões e os espaços de interação. Foi na intersecção entre estes dois territórios, nas suas dimensões que se tocam, nos seus espaços híbridos, que construí os mapas e escolhi as rotas desta investigação. No percurso teórico-prático de uma dissertação, além de definirmos as estratégias do percurso, construímos o próprio mapa que vamos usar, definimos

18

Um site, ou sítio é um conjunto de páginas na web. A primeira página de um site que abriga ou é entrada para outros sites é chamada Portal. 19 Um link é uma ligação. Uma porção de texto ou imagem configurada de tal forma que, ao ser clicada com o mouse, abre uma outra página ou remete para um outro lugar da mesma página. 20 cibernauta ou navegante ou surfista na web.

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qual o ponto de partida, escolhemos a rota, verificamos pontos de controle e procuramos definir o ponto de chegada. Este processo é reflexivo e dialético, pois se faz e se refaz em constante diálogo com a teoria e a realidade. Neste percurso, optei por rotas que, além de me permitirem estudar e descrever a realidade, abrissem a possibilidade de contribuir para a transformação desta realidade. Um mapa que foi emergindo da construção teórica e da prática da investigação, um mapa que se fez entre o andar e o navegar. Para sair das indagações fragmentadas e elaborar as questões que propus no projeto e que, posteriormente, foram re-elaboradas no movimento da realidade investigada, foi preciso aperfeiçoar os mapas do território. Ver o que os mapas mostram e, ao mesmo tempo, escondem. Locar os conceitos mais importantes, recuperar historicamente as transformações do conhecimento e das formas de organização social, dentro do contexto de uma sociedade que vem se construindo imbricada num modo de produção global e hegemônico que é o capitalismo; analisar a ciência e mapear alternativas ao pensamento científico de raiz positivista que, hoje, ainda se mantém; considerar as tecnologias da informação e da comunicação, seu desenvolvimento, suas tendências e contradições, suas influências na vida, na educação e no trabalho; pensar a educação, a pesquisa e a formação de professores, no contexto atual e em sua intersecção com a tecnologia. A perspectiva, a escala e a simbologia das cartas construídas no projeto e durante a investigação hoje se confirmam nos achados empíricos e nas falas dos sujeitos que trago para dentro destes referenciais.

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3.1 OS TEMPOS E OS ESPAÇOS DE PRODUÇÃO DA VIDA

Quando tentamos recuperar o tempo, na realidade, encontramos o espaço, nas diversas imagens que afloram e se decodificam na linguagem. O que é lembrado vem defasado pela distância, pela resolução da imagem, pela limitação dos signos. Tempo e espaço se confundem no movimento da prática social. Todo o ser humano é único e constitui sua existência no contexto de um determinado tempo-espaço, em meio a um conjunto de relações sociais e um universo cultural específicos da sua época histórica. Na prática social, cria e recria o mundo e a sociedade e, neste processo, cria-se a si mesmo.

Assim, ao buscar o

tempo, encontra o espaço e a prática social que configura a vida. Por volta dos anos 60 do século XX, muitos autores (LYOTARD, 1989; SANTOS, 2000a; HARVEY, 2001; LYON, 1998) sinalizam uma passagem histórica. Seus argumentos baseiam-se principalmente nas evidentes e grandes mudanças no panorama sócio-econômico-político e cultural da modernidade e o advento de um status diferente que alguns chamam de pós-modernidade. Alguns deles, apontam uma ruptura, outros consideram as transformações ocorridas, mas reconhecem nelas uma continuidade do projeto moderno ainda inacabado. Boaventura de Sousa Santos (2000a,b) sintetiza as idéias de vários autores clássicos sobre o desenvolvimento do processo civilizatório da modernidade. Postula que o projeto sócio-cultural da modernidade está assente sobre dois pilares que ele chama de regulação e emancipação.

O pilar da regulação é composto pelos

princípios do estado, do mercado e da comunidade. O princípio do estado, estabelecido por Hobbes e consistindo “na obrigação política vertical entre cidadãos e Estado”. O princípio do mercado, formulado por Locke e Adam Smith como

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“obrigação política horizontal individualista e antagônica entre os parceiros de mercado”. E, finalmente, o princípio da comunidade da teoria social e política de Rousseau, como “obrigação política horizontal solidária entre membros da comunidade e entre associações”. O pilar da emancipação inclui as três lógicas de racionalidade descritas por Weber: “a racionalidade estético-expressiva das artes e da literatura, a racionalidade cognitivo-instrumental da ciência e da tecnologia e a racionalidade moral-prática da ética e do direito”. (Santos, 2000a, p. 50) Santos (2000a) discorre sobre esta fase de transição paradigmática, associando-a à falha do projeto da modernidade em cumprir muitas de suas promessas, ao mesmo tempo em que cumpria outras em excesso; principalmente a falha em cumprir as promessas ligadas a igualdade, liberdade e paz para todos. Ao realizar-se em convergência crescente com o capitalismo, o processo civilizatório moderno tornou-se assimétrico pelo desenvolvimento desigual de seus princípios constitutivos. Os princípios do mercado e da racionalidade científica tornaram-se hegemônicos sobre os demais princípios, impedindo que os ideais modernos de progresso e bem estar para todos pudessem se realizar. Hoje questionamos cada vez mais a idéia de progresso infinito e da razão como medida única do conhecimento. Encontramo-nos em uma época em que o desenvolvimento econômico, científico e tecnológico, ao mesmo tempo em que promove avanços incontestáveis na saúde, produção, consumo e lazer, gera o desemprego estrutural, promove a desigualdade e a destruição do meio ambiente. Somos cada vez mais conscientes que os bons resultados do pretensamente autoorganizado e livre mercado são destinados a uma minoria e que a desigualdade, longe de ser um desvio ou insuficiência a corrigir, é um efeito indesejado, mas normal, considerando a perspectiva neoliberal.

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Porém, a questão não é propriamente o nome que se dá a períodos históricos e nem se a passagem entre um e outro consiste ou não numa ruptura total onde toda a organização social muda. O que importa é que existem fatores que determinam grandes alterações sociais, econômicas, políticas e culturais e vêm interligados, interferindo uns nos outros.

Por exemplo, o desenvolvimento da

agricultura fixou as pessoas ao lugar e isso ensejou alterações na organização social e política que, entre outras coisas, deram origem às cidades. Considero que as transformações se sobrepõem no tempo histórico e não se pode afirmar com exatidão em qual ponto ocorreu e o quê causou determinadas metamorfoses. Além disso, o novo se faz sobre o antigo e leva consigo, indissociáveis, traços que eventualmente emergem e se mostram. Chama-se modernidade ao projeto civilizatório que se estabeleceu nos países centrais entre os séculos XVI e XVIII. Seu fundamento foi a tendência de pensamento, cujos precursores foram racionalistas como Espinosa e Descartes e filósofos políticos como Hobbes e Locke – a Filosofia das Luzes. O Iluminismo, de Kant, Voltaire, Rousseau, Hume, entre outros, representou uma nova maneira de pensar, uma atitude que questionava as tradições, o conhecimento e colocava a sua fé no poder da razão humana como sustentáculo de um progresso sem limites. O homem moderno afirma a razão e o método científico como fontes de todo o conhecimento válido e rejeita toda a forma de dogma e superstição. A modernidade tem como parâmetro os conceitos de autonomia, individualidade e universalidade, dentro de uma visão emancipatória que se destina a todos os homens, considerando valores imutáveis julgados justos, belos e verdadeiros, priorizando suas qualidades criativas e excelência individual na construção de sua própria vida.

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Época de muitas mudanças e desestabilização de tradições e crenças, inevitavelmente teve de lidar com a transitoriedade e a sensação de fragmentação e caos iminente, como condições de seu próprio desenvolvimento (HARVEY, 2001). O projeto da modernidade foi um projeto ambicioso que gerou transformações em todas as esferas da vida humana, conforme indica Harvey:

A idéia era usar o acúmulo de conhecimento gerado por muitas pessoas trabalhando livre e criativamente em busca da emancipação humana e do enriquecimento da vida diária. O domínio da natureza prometia liberdade da escassez, da necessidade e da arbitrariedade das calamidades naturais. O desenvolvimento de formas racionais de pensamento prometia a libertação das irracionalidades do mito, da religião, da superstição, liberação do uso arbitrário do poder, bem como do lado sombrio da nossa própria natureza humana. Somente por meio de tal projeto poderiam as qualidades universais, eternas e imutáveis de toda a humanidade ser reveladas. (HARVEY, 2001, p. 23)

Centrando-se na pessoa e em sua razão, a modernidade deslocou a fé na providência para o progresso, como fonte de segurança. O afastamento da religião ensejou uma diferenciação na ética e na moral com conseqüências permeando todos os espaços de ação humana. O desenvolvimento da ciência proporcionou a criação de novas técnicas e instrumentos transformando a economia e o mundo do trabalho. A racionalização e a secularização tornaram autônomas as produções culturais, em especial a arte modernista que se aproximou do mercado com conseqüências que até hoje interferem na produção artística. A autoria como uma “aura de criatividade, de dedicação à arte pela arte, para produzir um objeto cultural original, sem par e, portanto, eminentemente mercadejável [...]” (HARVEY, 2001 p. 31). Na economia, o capitalismo e o socialismo como modos de produção foram processos que ocorreram paralelamente ao processo civilizatório da modernidade.

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Todavia, a hegemonia do capitalismo industrial, cooptou o processo civilizatório da modernidade e os dois processos, embora autônomos, se entrecruzaram. O desenvolvimento científico colocou-se a serviço do capital acarretando transformações nas forças produtivas e nas relações de produção, intensificando a divisão do trabalho e acelerando a acumulação, num processo não-linear onde ciência e capitalismo se entrelaçavam. Estas assimetrias no desenvolvimento do projeto

sócio-cultural

da modernidade, tiveram origem nas suas próprias

contradições internas. Conforme Harvey (2001, p. 24): [...] o pensamento iluminista internalizava uma imensa gama de problemas e não possuía poucas contradições incômodas. Para começar, a questão da relação entre meios e fins era onipresente, enquanto os alvos em si nunca podiam ser especificados precisamente exceto em termos de algum plano utópico que com freqüência parecia tão opressor para alguns enquanto emancipador para outros. Além disso, a questão de determinar de maneira exata quem podia considerar-se possuidor da razão superior e sob que condições esta razão deveria ser exercida como poder tinha de ser honestamente enfrentada.

As contradições inerentes ao projeto sócio-cultural da modernidade foram gerando críticas de toda a espécie. A teoria de Malthus apontava para um futuro de necessidade e carência de recursos naturais, principalmente pelo crescimento populacional. O processo penoso da Revolução Francesa com seus excessos solapou em muito as esperanças Iluministas. No final do século XIX, Nietzsche chamou a atenção para a emergência do niilismo21 e para a falência dos ideais modernos desmascarados como vontade de poder (NIETZSCHE, 1945). A descrença, o desespero, a aceitação do destino era tudo o que estava reservado para os seres humanos. O modernismo, por trás do desenvolvimento da ciência esconde a destruição e a alienação. Ao mesmo tempo criar e destruir.

21

Doutrina da negação radical ou da descrença absoluta (LUFT,1987).

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Assim, o conceito de destruição criativa22 é importante na compreensão da modernidade porque representa a forma como foram resolvidos os impasses do processo civilizatório: destruir para dar lugar ao novo. Aqui se pode considerar uma mistura da lógica capitalista do lucro acima de tudo, com a razão instrumental e a burocracia de Weber, colocando a razão humana acima do bem e do mal, do verdadeiro, do ético e do justo. A conseqüência é a angústia humana ao tentar representar o eterno e universal: Se o modernista tem de destruir para criar, a única maneira de representar verdades eternas é um processo de destruição passível de, no final, destruir ele mesmo estas verdades. E, no entanto, somos forçados, se buscamos o eterno e imutável, a tentar e a deixar a nossa marca no caótico, no efêmero e no fragmentário. (HARVEY, 2001, p. 26)

Marx anteviu o direcionamento do grande desenvolvimento técnico e científico da modernidade para os princípios fundantes do capitalismo. Antecipou, também, a própria evolução do capitalismo através de crises periódicas. [...] toda esta sociedade burguesa moderna, que fez surgir tão poderosos meios de produção e de troca, assemelha-se ao mago que já não é capaz de dominar as potências infernais que desencadeou. Desde há dezenas de anos, a história da indústria e do comércio não é mais do que a história das forças produtivas modernas contra as atuais relações de produção, contra as relações de produção que condicionam a existência da burguesia e a sua dominação. Basta mencionar as crises comerciais que, com o seu retorno periódico ameaçam, cada vez mais, a existência de toda a sociedade burguesa. Cada crise destrói regularmente não só uma parte considerável dos produtos já criados, mas ainda uma grande parte das próprias forças produtivas já existentes. (MARX ; ENGELS, 1987, p. 33)

O capital vence estas crises por meio da criação de novos mercados e maior exploração dos antigos. Pouco mais de meio século depois das previsões de Marx, o mundo marchava em direção do conflito, na I Guerra Mundial.

22

Segundo Harvey (2001), a destruição criativa é um conceito que remonta ao mito de Dionísio, onde a afirmação do eu se daria na criação destrutiva e na destruição criativa. Este conceito foi utilizado pelo economista Schumpeter para “compreender os processos do desenvolvimento capitalista” (HARVEY, 2001, p. 26), onde considerava o empreendedor como o herói capaz de levar às últimas conseqüências o desenvolvimento tecnológico e social.

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A modernidade vive ao sabor de suas contradições e são elas que fazem com que esta época reflita uma realidade multifacetada, como contingência e fragmentação. Na modernidade coexistiram e tensionaram-se mutuamente o conservador e o revolucionário, o clássico e o romântico, o local e o universal. Esta agitação explicitava-se através da cultura modernista, na moda, na produção artística, nas inúmeras vanguardas. Seguindo a lógica descrita por Marx, o capitalismo transformava-se acelerando a produção por meio da técnica e da expansão dos mercados. O fordismo, aperfeiçoando as idéias de racionalização do trabalho do taylorismo, com a produção em linha de montagem, determinou a produção em massa e o surgimento de um novo tipo de trabalhador, um novo tipo de indivíduo. Gramsci (1974, p.166), reconheceu que "já que os novos métodos de trabalho são indissolúveis de um determinado modo de viver, de pensar e de sentir a vida; não se podem obter sucessos num campo sem obter resultados tangíveis em outro”. Para Mészáros (2002) a Revolução Russa é filha da primeira crise global do capitalismo, pois teve entre suas causas o agravamento das dificuldades por que passava a Rússia czarista no pós-guerra. Foi uma tentativa de “uma solução póscapitalista para a crise do capitalismo ao mesmo tempo em que permanecia nos confins estruturais do sistema do capital” (MÉSZÁROS, 2002, p.730). Ainda assim, foi um contraponto no período entre guerras, onde o capitalismo se consolidou e expandiu vencendo mais uma de suas crises. A Segunda Guerra Mundial, ápice do capitalismo organizado, foi um exemplo do poder da destruição criativa. Nos anos que se seguiram, a estabilidade do capitalismo aconteceu sob a hegemonia americana. Considerados o apogeu do capitalismo, os anos pós-guerra vivenciaram a certeza de uma prosperidade

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infindável no estado do bem-estar social que, por um longo período abrandou os conflitos entre capital e trabalho. A revolução ficou por conta dos movimentos estudantis e de intelectuais que propunham a revolução cultural em substituição à luta de classes. Período da guerra fria, polarizava o capitalismo keynesiano com a versão totalitária do socialismo stalinista. Nos anos 70 do século XX, o esgotamento do modelo fordista-keynesiano levou o capitalismo a mais uma de suas grandes crises e a uma nova transformação. E esta transformação associa-se a virada cultural para o pós-modernismo. De acordo com Harvey (2001, p.119): Não está claro se os novos sistemas de produção e de marketing, caracterizados por processos de trabalho e mercados mais flexíveis, de mobilidade geográfica e de rápidas mudanças práticas de consumo garantem ou não o título de um novo regime de acumulação nem se o renascimento do empreendimento e do neoconservadorismo, associado com a virada cultural para o pós-modernismo, garante ou não o título de um novo modo de regulamentação. Há sempre o perigo de confundir as mudanças transitórias e efêmeras com as transformações de natureza mais fundamental da vida político-econômica. Mas os contrastes entre as práticas político-econômicas da atualidade e as do período de expansão do pósguerra são suficientemente significativos para tornar a hipótese do fordismo para o que poderia ser chamado de regime de acumulação ‘flexível’ uma reveladora maneira de caracterizar a história recente.

Para Lyon (1998) esta é a sociedade pós-industrial que dá estrutura a sociedade da informação e a pós-modernidade. O autor conceitua o pósindustrialismo e a sociedade da informação como conjunto de idéias originadas nas noções de progresso Iluministas , acrescentando a centralidade do desenvolvimento tecnológico. Harvey (2001) associa não só a transformação tecnológica, como a emergência do sistema de acumulação flexível à pós-modernidade. Realmente, a crise do fordismo-keynesianismo tornou a década de 70 do século XX um período agitado por toda uma reorganização político-econômica. As transformações deste

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período resultaram na acumulação flexível, que tem sua sustentação na flexibilidade, tanto do trabalho quanto dos mercados, dos produtos e do consumo. Neste processo, espaço e tempo são novamente alterados e tem seus limites transpostos. Este sistema privilegia o individualismo nas relações de produção, enfraquecendo a organização dos trabalhadores e tirando o poder de negociação dos sindicatos. A acumulação flexível, com sua mobilidade característica, produz em áreas geograficamente separadas surtos de desemprego e é causa do desemprego estrutural. As novas tecnologias, como a automação e a robótica, colaboram na aceleração do processo de acumulação, permitindo a redução do tempo de giro na produção, na circulação e no consumo.

A acumulação flexível foi acompanhada na ponta do consumo, portanto, por uma atenção muito maior às modas fugazes e pela mobilização de todos os artifícios de indução de necessidades e de transformação cultural que isso implica. A estética relativamente estável do modernismo fordista cedeu lugar a todo o fermento, instabilidade e qualidades fugidias de uma estética pósmoderna que celebra a diferença, a efemeridade, o espetáculo, a moda e a mercadificação das formas culturais (HARVEY, 2001, p.148).

Lyon (1998) acredita que a questão do consumo deve ser levada em consideração muito atentamente nas análises da sociedade atual. O estímulo ao consumo por meio da produção de desejos, alicerçada no poder da mídia prejudica tanto a quem tem potencial consumidor quanto a quem não tem. Esta pressão para o consumo é responsável, entre outras coisas, pela identidade relacionada à posse de certas coisas e pela violência que pode emergir das frustrações nesta identificação.

A felicidade e o bem-estar são mercadorias associadas a outras

mercadorias, bem como a liberdade, uma liberdade que é feita para consumir e que se consome a si mesma nas escolhas que faz.

40

Santos (2000b) propõe uma possibilidade de superação desta realidade por meio da revitalização dos princípios da comunidade e da racionalidade estéticoexpressiva, princípios da modernidade considerados por ele inacabados. Postula um conhecimento-emancipação que define como “um conhecimento prudente para uma vida decente”, centro do paradigma emergente. Embora parta de princípios modernos, o autor entende que a modernidade entrou em colapso, abrindo espaço para um leque de possibilidades, sendo uma delas um futuro não-capitalista e ecosocialista, que chama de pós-modernidade de oposição. Concordando em parte com o autor, penso que, sendo ainda inacabada, a modernidade não esgotou suas possibilidades de por em prática um futuro nãocapitalista, como querem os arautos da pós-modernidade que propõe o fim da história. A chamada pós-modernidade pode ser considerada uma fase histórica que tem como causa, também, o enfraquecimento do movimento de esquerda, ocorrido após a derrocada do socialismo soviético. Isso permitiu que chegássemos ao ponto onde estamos. Por outro lado, todas as idéias e desdobramentos do pósmodernismo servem para revitalizar os projetos do materialismo histórico em pontos além das relações econômicas e políticas, que são as questões culturais e as que têm a ver com o ser humano em sua totalidade. Abrem espaço para a escuta de outras vozes, reconhecendo-lhes a autoria, mesmo que lhes vede o acesso ao universal. Iniciamos o século XXI e vivenciamos cada vez mais intensamente os problemas que criamos. Hoje, modernos ou pós-modernos, estamos juntos num mundo onde os bons frutos da nossa prática social e do nosso conhecimento se multiplicam e, ao mesmo tempo, se concentram nas mãos de uma parte da

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humanidade cada vez menor. Para os outros, a maioria, as condições de vida se deterioram abaixo de qualquer critério de dignidade. Todavia, muitos ainda seguem entre indiferentes, inconscientes, preocupados e desesperados, nas mesmas práticas que a cada dia ameaçam destruir nosso planeta e colocar nosso ponto final como humanidade. Se tudo começou com nossa prática e nossa ciência, talvez a partir delas possamos superar esta situação. Com outra ciência e outra prática social, que não excluam e até resgatem todos os saberes silenciados; que sejam previdentes pela consciência das conseqüências de suas intervenções; que se comprometam com a vida e com o destino da humanidade no planeta.

3.2 UMA NOVA FORMA DE FAZER CIÊNCIA

As obras rompem as fronteiras de seu tempo, vivem nos séculos, ou seja, na grande temporalidade, e, assim não é raro que esta vida (o que sempre sucede com uma grande obra) seja mais intensa e mais plena do que nos tempos de sua contemporaneidade (BAKHTIN, 2000, p. 364).

Fui uma criança que desde que descobriu a leitura e os livros, lia tudo que encontrava pela frente: de rótulos de enlatados até enciclopédias e dicionários. Aprendi muitas coisas nos livros, algumas que só vim a compreender mais tarde, mas que povoaram o meu imaginário durante anos. A vida microscópica, foi um destes assombros. Depois que descobri que em todo lugar, inclusive na minha pele, havia milhões de coisas que meus olhos não podiam ver, mas que, sob um microscópio se moviam, cresciam, multiplicavam-se, passei a olhar o mundo de

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forma diferente. Imaginava que todo o ser na terra se movia aniquilando pequenas criaturas a cada passo e que, assim como não víamos as coisas muito pequenas, talvez não víssemos as muito grandes, também. Pensava que, possivelmente, os terremotos pudessem ser explicados pelas passadas de algum gigante descuidado. Outra fantasia poderosa era a de que a Terra toda pudesse ser uma partícula em órbita num átomo qualquer de alguém imensamente grande. Mundos dentro de mundos que nossos sentidos humanos não poderiam captar. Alguém já disse que um ponto de vista é apenas a vista de um ponto e isso foi uma constatação que veio cedo para mim. Não num sentido que tudo fosse relativo, mas no sentido de que algumas coisas não nos são dadas a perceber de imediato e completamente. A forma de olhar ou de não olhar pode condicionar o que é visto e o que fica oculto. Assim, uma nova ciência talvez não seja uma ciência nova, mas sim uma forma nova de olhar, que harmonize as múltiplas faces do conhecimento e que retome e reconfigure cada um dos seus nexos. A ciência teve papel importante em todas as transformações ocorridas com a humanidade desde seu aparecimento no planeta. A partir dela, homens e mulheres sistematizaram seus conhecimentos sobre a natureza e construíram outros, o que lhes permitiu agir sobre a realidade transformando-a. Fazer ciência consiste em construir conhecimento novo, tendo por referência outros conhecimentos já estabelecidos que serão incorporados, transformados, confirmados ou descartados neste processo. Os conhecimentos científicos formam paradigmas que orientam a comunidade científica até o momento em que novas descobertas vem alterar todo o campo do conhecimento (KUHN, 2001). Ciência, técnica e tecnologia muitas vezes são confundidas, porém é importante que sejam esclarecidas as suas diferenças. Ciência é todo um conjunto

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de leis, teorias e métodos que interpretam e explicam a realidade. Tecnologia é a técnica que provém da ciência e pressupõem: [...] um plano, uma concepção, um desígnio a ser realizado. É característica do ser humano a capacidade de inventar técnicas, aperfeiçoá-las e transmiti-las. Ao contrário do que supõe o senso comum, nem toda a técnica deriva da ciência mas, sim, pode fornecer a ela novos objetos de pesquisa e ampliar meios para a própria investigação (CORRÊA, 1997, p. 251).

Técnica vem do grego téchne, que significa arte, destreza. No mundo grego, arte e técnica não se diferenciavam muito. Por meio da téchne, o ser humano transformava a natureza construindo as condições de sua vida. Tecnologia vem do grego technologia, que é a união de téchne, ou arte, com logos, que significa razão ou palavra. Segundo Dias (2000) o termo tecnologia passa a ser utilizado na Idade Moderna, conforme a técnica se funde ao saber científico. Para Lévy (1999 a), a técnica não pode ser considerada nem a solução e nem a causa de todos os males, pois a técnica vem repleta de tudo o que é humano e são humanas as escolhas. Isso nos adverte sobre nossa responsabilidade de criadores. Acrescento que, se a interdependência entre ciência e tecnologia é desconsiderada, teremos a sua separação da prática que elas engendram e, como conseqüência, a legitimação do discurso ideológico que lhes atribui neutralidade. Temos que ter a consciência de que se projeta no aparato técnico-científico os interesses e a visão de mundo que dominam a sociedade num determinado momento histórico Por outro lado, a distinção entre ciência e filosofia é recente. Antes do século XIX, os pensadores trabalhavam com várias áreas do conhecimento ao mesmo tempo, relacionando a ciência natural, a ética, a política, a metafísica, a matéria, o espírito, no todo da obra. A filosofia chamada moderna é a que une todas estas áreas num conceito único fundante: Deus ou a Substância Infinita.

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Esta ciência-filosofia assumiu como características uma maior ênfase no conhecimento da natureza, a adoção de relações de causa e efeito mecanicistas, baseadas em leis universais, para explicação dos fenômenos e a manutenção da finalidade como explicação no terreno da metafísica e da ética. Segundo CHAUI (2002), estas características são efeitos de modificações ocorridas a partir do Renascimento com o abandono de algumas idéias e o surgimento de outras. Constata-se, em primeiro lugar, o surgimento da idéia de universo infinito sem limites de tempo e espaço, que dá origem a um descentramento, uma perda de referencial para o conhecimento e uma nova constituição do conceito de ordem como base para o método. Em segundo lugar, a geometrização do espaço, que se torna hom*ogêneo, neutro, passível de ser medido e calculado. Em terceiro lugar, o estabelecimento da mecânica como uma nova ciência da natureza, passando todas as ciências a operar sobre suas leis de causa e efeito. Os objetos do conhecimento são três essências: a alma, a matéria e o infinito. Um conhecimento que parte da investigação das causas que constituem a essência e determinam a existência de um fenômeno ou de um ser. Esta ciência segue basicamente dois rumos (BENSAÏD, 1999): o da ciência inglesa – positiva e empírica – e o da ciência alemã – especulativa e filosófica. [...] convém primeiro distinguir as ciências empíricas, que “se propõem e oferecem leis, proposições gerais, as idéias do que existe”. A ciência especulativa não deixa de lado seu conteúdo empírico. Ela reconhece e utiliza seu elemento geral. Conserva as mesmas categorias, as mesmas formas de pensamento, os mesmos objetos, mas os transforma para resolver os paradoxos engendrados pela abstração do entendimento (BENSAÏD, 1999, p. 310. destaques do autor).

O pensamento de Marx, explicitado em O Capital (1996), se fundamenta entre a admiração pela ciência empírica inglesa e a fidelidade à ciência filosófica alemã. Constitui uma ciência que desconcerta quem tenta compreendê-la baseado no

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modelo da física clássica. Este é um dos motivos, segundo Bensaïd (1999), para que O Capital tenha ecoado como uma trovoada inaudível, abafada pela ciência dos objetos isolados, conformados às relações lineares de causa e efeito. Hoje, a ciência ainda mostra efeitos de ter raízes assentadas no século XIX, no positivismo, embora as transformações ocorridas e os muitos questionamentos que se colocaram posteriormente. Sob um discurso de neutralidade, investiga e estabelece as leis que regem os fenômenos, constrói teorias e modelos que do ponto de vista prático resultam em tecnologias que transformam a realidade. Esta aplicabilidade acaba por se subordinar à lógica do funcionamento econômico, onde imperam os critérios de eficácia produtiva. A ciência torna-se modo de produção de tecnologias que produzem mercadorias. Por outro lado, o desenvolvimento científico apresenta graus internos de liberdade e, na construção de seu conhecimento, desequilibra o paradigma estabelecido

criando

bifurcações,

que

desestruturam

o

pensamento

das

comunidades científicas e que podem inaugurar novas visões de mundo e novas direções para o desenvolvimento humano.

Para Santos (2000b), rompe-se não

somente o paradigma científico, rompe-se, também, o paradigma social. Hoje se critica o modo de fazer ciência, pela evidente constatação que seus rumos não correspondem a um maior bem estar e dignidade para todo ser humano. Critica-se, principalmente, a opção por uma ciência que não pensa além do seu objeto de estudo, que não contextualiza, que não historiciza e, portanto, falha ao prever. Põe-se em questão a escolha de um modelo de ciência que atende o interesse econômico antes e ao invés do interesse social. As contradições desta escolha podem ser desveladas e confrontadas por meio das próprias descobertas da ciência.

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Em meados do século XIX, o paradigma científico dominante era o da física, o da mecânica de Isaac Newton, que permeava até mesmo as ciências do homem. Conforme Capra (2001), o mecanicismo newtoniano, que combinava o método indutivo de Bacon e o método dedutivo de Descartes, tinha como palco a geometria euclidiana clássica. Este era considerado um espaço absoluto, invariável, independente do espaço externo. As leis universais dos movimentos das partículas permitiam explicar todos os fenômenos físicos. Algumas descobertas foram minando este estatuto da ciência. Entre elas, pode-se citar as investigações de Faraday e Maxwell sobre os fenômenos eletromagnéticos, que não podiam ser explicados pelas leis da mecânica de Newton, e os estudos de Clausius e Carnot sobre os fenômenos térmicos. Os primeiros estudos citados foram, posteriormente, definidos claramente por Einstein, na sua abordagem da radiação eletromagnética que, juntamente com a teoria especial da relatividade, foi o xeque mate no modelo de ciência moderna. Os segundos (Capra, 2001), fenômenos também não explicados pela teoria de Newton, trouxeram a idéia da irreversibilidade23 dos processos, do avanço progressivo da ordem para a desordem, da emergência do conceito de entropia24 como medida de desordem. Um sistema tende a se aproximar de um estado que o atrai e esta aproximação coincide com o aumento de entropia. Assim, um fenômeno reversível mostra que o sistema é atraído da mesma forma pelo seu estado inicial e pelo estado final, podendo mover-se entre estas duas direções. Um fenômeno irreversível demonstra que o sistema se move na direção do estado mais atrator, sem retornar 23

O calor produzido pelo petróleo que queima jamais pode ser revertido novamente em petróleo. O conceito de entropia quase sempre é tangenciado nas obras que falam dele. Pode-se dizer que entropia é uma propriedade de estado; uma medida do número de combinações (complexões) dos estados possíveis de um sistema; uma medida que traduz o grau de desordem de um sistema. A entropia está ligada aos processos naturais que atraem os sistemas ao equilíbrio (PRIGOGINE, 1997). 24

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ao seu estado inicial. Prigogine (1997, p. 96) explica que “o crescimento da entropia designa uma evolução espontânea do sistema. A entropia torna-se assim um ‘indicador de evolução’ e traduz a existência na física de uma ‘flecha do tempo’. Para todo o sistema isolado, o futuro é a direção na qual a entropia aumenta” (destaques do autor). Bensaïd (1999, p. 379) cita, juntamente com as leis da termodinâmica, a biologia de Darwin e a crítica marxista da economia política como “ciências da evolução e da transformação” que “não falam mais de certezas, mas de incerteza e escolha determinadas”. O conceito de probabilidade, originalmente formulado por Ludwig Boltzmann, (CAPRA, 2001), se complexifica na física atômica, onde a matéria revela a sua face dual, ora partícula ora onda. Nesse contexto, estudar um fenômeno não é isolar e estudar uma coisa e, sim, estudar suas relações com outras coisas. O universo deve ser entendido como um todo, que pode, até certo ponto, ser dividido em partes, mas que, além delas, contém as suas relações. Este é o contexto que abre caminho para a emergência de uma outra ciência, uma ciência da totalidade. Uma ciência que hoje se manifesta nos estudos e teorias de muitos pesquisadores, como a teoria das estruturas dissipativas de Ilya Prigogine, a teoria da matriz-S de Chew e a teoria de David Bohm, que, segundo Capra (2001, p.91), “se baseiam numa visão do mundo como uma teia dinâmica de relações”, teorias ainda em grande parte conjeturais, mas que transcendem a própria base física da ciência. Uma ciência, no meu entender, que considera a totalidade como “um todo estruturado, dialético” (KOSÍK, 1976, p. 35) que abre um espaço de escuta para a trovoada de Marx.

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A atualidade do pensamento de Marx permanecerá enquanto o capital permanecer dominando as relações econômicas, sociais, políticas e culturais. (BENSAÏD, 1999; MÉSZÁROS, 2002; BENSAÏD ; LÖWY, 2000 ; WOOD, 2003). Sua ciência, livre das leituras reducionistas efetuadas quer sob o stalinismo, quer sob o chamado pós-modernismo celebratório,25 possibilita alcançar o patamar de um conhecimento das essências, transcendendo o estatuto da ciência normal positiva. Penso que Daniel Bensaïd recria com perfeição a construção do pensamento de Marx com relação à ciência que fundamenta a sua obra. Para Bensaïd (1999) a ciência alemã manteve suas características específicas devido a um descompasso entre o desenvolvimento social, político e econômico alemão em relação ao desenvolvimento de outros países europeus, como França e Inglaterra. Na época em que Marx escrevia O Capital, estes países apresentavam um capitalismo desenvolvido enquanto a Alemanha ainda se organizava. Este atraso, uma tendência cultural, viria a se tornar um avanço nos termos do pensamento alemão, pois “o atraso político converte-se em avanço social, o atraso da burguesia em ‘avanço’ do proletariado. [...] A dialética do anacronismo alemão transforma um atraso prático em avanço teórico, um atraso político em avanço social” (BENSAÏD, 1999, p.291). É a partir desta ciência que Marx constrói a sua própria ciência.

O

pensamento de Marx recebe três principais aportes: de Leibniz, de Espinosa e de Hegel. De Leibniz, a harmonização entre a necessidade e a possibilidade. De Espinosa, a subversão da ordem, uma racionalidade que une ciência e ética, um 25

Aquele que Santos (2000a, p. 29) chama de “pós-modernidade reconfortante”, onde se não há soluções pensáveis, então não existem os problemas e o que está posto está dado, logo devemos aceitar e celebrar o que existe. Para Eagleton (1999) o pós-modernismo optou por aderir ao ceticismo, à paralisação política, ao conformismo. Já que todo sistema é opressor, podemos perfeitamente ficar com o que aí está. Pela negação de todas as verdades, aniquila as razões para resistência.

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conhecimento que vai a essência do fenômeno. De Hegel, a história e a dialética, a lógica do movimento, totalidade em devir que supera a linearidade dos encadeamentos mecânicos. Marx coloca a historicidade na filosofia da imanência de Espinosa, usando Hegel e colocando o ser humano como criador de si e do mundo por meio do trabalho. Afasta da teologia o pensamento de Hegel, usando Espinosa, e descarta a filosofia da história de Hegel, conservando a sua lógica dialética. Em Leibniz, encontra a ciência das coisas finitas e contingentes, “a aliança recuperada da moral e da ciência, da determinação e da liberdade” (BENSAÏD, 1999, p.300). Com relação a Hegel, Marx defende seu método dialético e concepção histórica, mas vai além. Centrando sua atenção na dialética objetiva do processo histórico, potencializa a filosofia radical de Hegel. Já Hegel, aderindo ao capitalismo e considerando-o permanente e universal, impõe limites à sua teoria e a mutila sob uma capa ideológica. Apesar disso, é imensa a dívida com Hegel pelo que ecoa da ciência alemã e que Marx transformou na obra subversiva que é O Capital. Nele, a ciência aparece transformada, revolução permanente, teoria e prática, filosofia da práxis. Segundo Bensaïd (1999, p. 312), “uma idéia de ciência irredutível à simples soma das ciências positivas”. A “crítica da economia política” é o eixo que interliga economia, ciência, filosofia, a crítica da ordem capitalista. Como ciência: Ela é menos uma doutrina do que uma “postura teórica”, uma relação polêmica com a história, que se recusa a congelar a intelegibilidade do real na hipóstase da ciência. Tornada crítica da economia política, ela será uma espécie de ciência negativa, irredutível aos enunciados dogmáticos e doutrinários. Recusando-se o menor repouso, ela sabe que nunca terá a última palavra e que se trata no máximo de conduzir o pensamento ao limiar da luta, ali onde ela toma seu impulso estratégico (BENSAÏD, 1999, p. 315).

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Esta crítica faz o elo de mediação entre as ciências positivas e a ciência alemã, onde compreender o presente reorganiza o conhecimento do passado e a antevisão do futuro. O presente, no limiar do futuro, resgata as possibilidades em aberto do passado sob um outro olhar. A ciência de Marx analisa e revela aquilo que não pode ser percebido pelos sentidos. O conhecimento científico vai bem além do empirismo superficial, chega à essência, desvela o movimento real, as tendências, as leis e as estruturas internas dos fenômenos. Teoria mediada pela prática, transcende os conceitos e chega ao real. Desconstruindo as aparências, apreende-se a conexão interna dos fenômenos e infere-se o poder ao qual eles estão submetidos.

3.3 A DIGITALIZAÇÃO DO MUNDO

Quando o mundo real se transforma em simples imagens, as simples imagens tornam-se seres reais e motivações eficientes de um comportamento hipnótico. [..] Mas o espetáculo não pode ser identificado pelo simples olhar, mesmo que este esteja acoplado à escuta. Ele escapa à atividade do homem, à reconsideração e à correção de sua obra. É o contrário do diálogo. Sempre que haja representação, o espetáculo se reconstitui (DEBORD, 1997, p. 18 - Tese 18).

Enquanto tecia as linhas e entrelinhas do projeto de dissertação, tentando manter uma linha teórica consciente e coerente, a espiral histórica mostrava em cada acontecimento, condições que já estavam inscritas nos possíveis de um passado próximo.26 26

O projeto desta dissertação foi construído, em grande parte, entre janeiro e maio de 2003, num contexto onde as atenções se voltavam para o conflito no Iraque.

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Na tela das televisões materializava-se em imagens impactantes a primeira guerra em tempo real que assistimos em nível global27.

O aparato midiático

seguindo o aparato militar e a cena da guerra se assemelhando a um set de filmagem onde a destruição se misturava ao ensaio e à preparação dos atores. Em cada canto do mundo foi possível ver o presidente da mais poderosa nação, testando expressões e poses, ter o seu cabelo arrumado diante das câmeras, antes de anunciar os últimos detalhes da guerra que iniciava. Num mundo globalizado, a telemática engendra o cotidiano como reality show28. Desfila ante nossos olhos uma miscelânea de imagens rápidas, de textos desconexos, de simulações e apelos ao sensacionalismo. A tela divide-se em janelas, mesclando o desenho televisivo ao desenho da internet. A tecnologia do videofone traz, em tempo real, o presente imediato para nossas casas. Porém, o que nos chega são imagens e textos filtrados, iguais, seja qual for o canal de informações. Emerge um sentimento de irrealidade e de perda de sentido que nos assalta a cada evento. Comer pipocas assistindo bombardeios é aceitar como banal o sofrimento humano, aceitar a insensibilidade, nos desumanizar um pouco a cada dia. Hoje, quando escrevo o texto final de dissertação e releio algumas linhas do projeto, como as que mantive acima, o espetáculo continua transmutando a realidade em simulacro. Ao mesmo tempo em que se chama de terroristas aos que resistem à invasão e ocupação – uma invasão que teve como justificativa a prevenção de possíveis ações agressivas que não foram comprovadas e, hoje, caem no esquecimento - , mostra imagens de um jantar de Ações de Graça, onde o

27

Invasão do Iraque pelos Estados Unidos da América em 2003. Tendência televisiva atual de colocar pessoas em situações reais de convivência e disputa de prêmios sob filmagem contínua, que vai sendo editada e oferecida aos telespectadores. 28

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mesmo presidente-ator serve seus soldados, reafirmando suas tradições numa terra ocupada, que tem outras tradições. Simulacro. A viagem, a base militar, o jantar, tudo simulacro, menos a intenção, a humilhação cuidadosamente planejada. Da globalização econômica, chegamos a globalização da cultura e dos sentimentos humanos. Na sociedade do espetáculo (DEBORD, 1997), o sofrimento, a miséria e até a guerra podem ser estetizados e consumidos após o jantar. E, nisso, o desenvolvimento científico e tecnológico tem participação em forma e conteúdo, uma participação que urge ser discutida, desmistificada e posta às claras a todo cidadão deste planeta.

Segundo Lévy (2000), a humanidade vem construindo sua identidade e cultura por meio de quatro tipos de relações com o saber. O primeiro tipo concerne ao período anterior a escrita, onde a transmissão do saber era oral e contextual, pela comunidade viva. Um saber guardado na memória dos velhos, em danças, cantos e rituais. O segundo tipo abrange o período a partir da invenção da escrita. O saber, limitado ainda, mas não mais contextual, está contido no livro único, imutável, a Bíblia, o Corão. Com o advento da imprensa, temos o terceiro tipo de relação: a biblioteca. A possibilidade de agregar diversos saberes e multiplicá-los, torna o conhecimento acessível para além da comunidade, ainda que o mantenha limitado, fixo e não contextual. O quarto tipo de relação se estabelece com a atual transmutação da biblioteca em hipertexto. Saber não confinado a um certo lugar. Saber distribuído, em constante mudança, que permeia um espaço virtual, onde tempo e espaço se interpenetram.

Saber universal ilimitado, possível de ser

retornado às mãos da comunidade viva, contextual porque on-line. Vivemos, pois, o espaço-tempo digital, que questiona conceitos como material, real, virtual.

53

A virtualização, considerada por Pierre Lévy como a essência da mutação em curso, apocalipticamente anunciada por autores como Baudrillard e Virilio, consiste num movimento que atinge todas as esferas humanas. Da comunicação/informação à economia, do corpo à inteligência, configurando-se, na opinião de Lévy (1996, p.12), numa “heterogênese do humano” ou “devir do outro”. Em outro trabalho usei os seguintes conceitos fundamentados em Lévy (1996): “real é aquilo que é existente, persistente, que subsiste. Possível é onde habita o real antes de sua realização, são as possibilidades determinadas do real. Virtual é o que se assemelha ao possível, porém sem a sua determinação. O virtual consiste nas tendências, nas forças, nos problemas potenciais. O atual é o modo de ser oposto ao virtual, onde se manifestaria sua solução.” (GUTIERREZ, 2001, online) Virtualizar, então, seria fazer novas perguntas sobre o real. Virtualizar seria descobrir indagações essenciais a partir das quais poderia ser redefinido o sujeito deste processo numa nova atualidade. Um movimento dialético, oposto à determinação pessimista e ideológica. Podemos virtualizar uma ação, uma instituição, uma pessoa tornando-as não presentes, rompendo suas estruturas determinadas, trazendo à luz as suas contradições. Em 1990, Pierre Lévy já sinalizava sobre as mudanças no modo de viver, conviver e pensar das pessoas advindas do contato com o mundo da informática e das telecomunicações.

Novas relações com o conhecimento e com o trabalho.

Novos conceitos. Novas maneiras de pensar e de conviver estão sendo elaboradas nos mundos das telecomunicações e da informática. As relações entre os homens, o trabalho, a própria inteligência dependem, na verdade, da metamorfose incessante de dispositivos informacionais de todos os tipos. [...] Não se pode mais conceber a pesquisa científica sem uma aparelhagem complexa que redistribui as antigas divisões entre experiência e teoria. Emerge, neste final do século XX, um conhecimento por simulação que os epistemologistas ainda não inventariaram (LÉVY, 1993 p.7).

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Hoje, é possível transmitir ou comunicar-se ao vivo de quase qualquer lugar, por meio de uma aparelhagem móvel que pode ser portada por uma pessoa apenas. Caem de vez os limites tecnológicos entre o rádio, a tv, o computador e o telefone, indicando

que

continua

(BIANCHETTI, 2001).

o

movimento

de

convergência

entre

tecnologias

A tecnologia do videofone, já conhecida por meio da

videoconferência, vem possibilitando uma mobilidade e agilidade nas comunicações nunca vista. Basta comparar o equipamento de videofone, com as equipes de televisão, com seus veículos, antenas, microfones e câmeras, para transmissão ao vivo. Esta tecnologia, que vem possibilitando a “guerra on-line” e que já integra a telefonia celular, unindo áudio e imagem na comunicação, só é possível graças à digitalização. Lévy (1993) coloca como essencial para falar de uma cultura informática, esta possibilidade de digitalização que atinge todas as técnicas de comunicação e de processamento de informações. A codificação digital coloca sob o mesmo formato as linguagens do cinema, televisão, rádio, jornalismo, edição, música, informática etc. e as interconecta. Uma imagem digitalizada, isto é, transformada numa série de números digitais, pode ser transmitida, armazenada, editada, recortada, ampliada ou reduzida, acrescida de comentários, anexada a um texto, animada. A digitalização permite armazenar em pequenos espaços imensos volumes de informações. No caso das transmissões por videofone, via satélite, a imagem e o som captados, são convertidos em sinais digitais que são transmitidos e podem ser retransmitidos e recuperados conforme necessário para a apresentação em tempo real. Este é um exemplo vivo da convergência entre os mais variados tipos de

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tecnologia, que unem o rádio, a televisão, a informática, enfim, todas as mídias em equipamentos cada vez menores, potentes e interativos. O termo 'multi-mídia interativa' expressa bem o espírito tecnológico da época, caracterizando-se por uma hibridação de diversos dispositivos, infiltrados de 'chips' e memórias eletrônicas. As novas tecnologias são assim, resultado de convergências tecnológicas que transformam as antigas através de revisões, invenções ou junções (LEMOS, s/d, on-line).

Para Nicholas Negroponte (1996), o viver digital consiste em abandonar os átomos pelos bits29. Esta mudança, no seu entender, é irreversível. O mundo que emerge na e da internet é, em síntese, o mundo dos bits, o espaço-tempo da vida digital. A internet, com sua formação em rede, mesmo tendo origem na organização militar, desenvolveu-se sem hierarquia, sem regras pré-estabelecidas, seu único imperativo categórico é estar conectado. Moraes (2000, on-line) nos diz que “ao plugar-se, o internauta recebe o passaporte carimbado para o ciberespaço”. Um ciberespaço onde a hierarquia e a burocratização não conseguiram se estabelecer, uma desordem mais ou menos saudável onde todos podem ser emissores e receptores. A interação incentivando “processos tecnocomunicacionais de inserção político-social de forças contra-hegemônicas, sobrepujando os filtros ideológicos e os políticos editoriais dos complexos de mídia”. (MORAES, 2000, on-line) Otimista, Lévy aposta que doravante: Acontecimentos, decisões, ações e pessoas estariam situados nos mapas dinâmicos de um contexto comum e transformariam continuamente o universo virtual em que adquirem sentido. Nesta perspectiva o ciberespaço tornar-se-ia o espaço móvel das interações entre conhecimentos e conhecedores de coletivos inteligentes desterritorializados (1999b, p. 29, destaques do autor).

29

bit é uma posição digital, um estado: “ligado ou desligado, verdadeiro ou falso, para cima ou para baixo, dentro ou fora, preto ou branco. [...] Nos primórdios da computação, uma fileira de bits em geral representava uma informação numérica” (NEGROPONTE, 1996, p.19).

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Nesse sentido, podemos dizer que a internet é uma alternativa para transcender os discursos institucionalizados que escondem a dominação sob uma aparente

cientificidade.

Para

situar-se

como

sujeitos

políticos

e

sociais

independentes das determinações da burocracia e da organização. Livres para aproximar-se do “saber instituinte, negador e histórico” (CHAUÍ, 1981, p.13). Harmonizando as tendências, Andréa Ramal (2002, p. 75) considera as correntes de pensamento mais moderadas em relação às tecnologias intelectuais como um caminho mais seguro, “não um entusiasmo cego nem acrítico, mas um distanciamento criterioso e a defesa de uma utilização produtiva da máquina e das mídias como instrumentos a serviço do homem [...]”. Deste modo, podemos constatar que a internet suscita diferentes discursos. Em um extremo temos pensadores pró-internet, como Pierre Lévy, que contrapõe à idéia do sujeito inteligente a idéia do coletivo inteligente, constituído pelo sujeito e pelo grupo humano do qual ele faz parte. Conceitua o sujeito como “um dos microatores de uma ecologia cognitiva que o engloba e restringe” (LÉVY, 1993 p.135). O autor considera que a inteligência coletiva une seres humanos, instrumentos e instituições num enorme conglomerado cognitivo. Aqui entra a noção de ecologia cognitiva como ”estudo das dimensões técnicas e coletivas da cognição” (LÉVY, 1993, p. 137) Joël de Rosnay (1999), coloca a internet como um novo paradigma para a humanidade. Afirma que:

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A sociedade nascente organiza-se antes em redes do que em pirâmides de poder; em células independentes mais do que em engrenagens hierárquicas; mais num "ecossistema informacional" do que em fileiras industriais lineares. Daí a confusão dos políticos e dos altos funcionários de Estado alimentados com evoluções quantificáveis, proporcionais e extrapoláveis diante da irradiação multidimensional ou das acelerações brutais das novas evoluções. A emergência de um fenômeno internacional de comunicação, como a Internet, o efeito de surpresa que provocou e a vontade de controle suscitada, ilustram perfeitamente essa perda de referencial (ROSNAY, 1999, p.52-53, destaques do autor).

No outro extremo, encontramos aqueles que vêem no desenvolvimento tecnológico mais problemas do que possibilidades de uma vida melhor para o indivíduo. A repulsa à tecnologia se baseia, principalmente, na crença de que ela é um fim e não um meio.

Postman (1994), ao analisar o impacto das novas

tecnologias na cultura, salienta que elas alteram a ordem natural das coisas, mudam os hábitos e o sentido do que é real. Para este e outros autores contrários às novas tecnologias, elas vêm gerar pessoas passivas e alienadas. A internet, com suas possibilidades de virtualização dos contatos e da navegação por todo um território que não é material, passa a ser, no entender deste e de outros autores, o reduto onde se reúnem desajustados sociais e psicológicos de toda ordem.

Incentiva a fuga da realidade e do convívio social. Promove a

destruição da subjetividade e a obsolescência do corpo. O ciberespaço e a cibercultura seriam o veículo de uma retirada da civilização. Viver neste espaço seria uma reação à ausência de significado da vida pública das pessoas no âmbito político real. Diz Baudrillard (1997, p.71): Hoje, não pensamos o virtual; somos pensados pelo virtual. Esta transparência inapreensível, que nos separa definitivamente do real, nos é tão ininteligível quanto pode ser para a mosca o vidro contra o qual se bate sem compreender o que a separa do mundo exterior. Ela não pode nem sequer imaginar o que põe fim ao seu espaço.

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A meu ver, este enunciado insere-se em toda uma concepção pessimista característica de um certo discurso pós-moderno onde o sujeito encontra-se frágil, fragmentado, inserido num eterno presente a-histórico. Outras críticas partem do urbanista e filósofo Paul Virilio (2001, p. 10). Para ele, a internet: [...] é uma ilusão tecnocientífica. É a ilusão da cibernética. Não se pode pensar a internet sem o advento da cibernética. A informática é uma coisa; a cibernética, outra. A colocação da informática em rede desemboca na cibernética, ou seja, em sistemas de condicionamento radicalmente terroristas num certo tempo. Não neste momento. Mas já existe a tentação de usá-los para controle social. 30

Além disso, ele vê a rede mundial de computadores como o motor da globalização e imposição de uma tirania das multinacionais, principalmente pelo fato da rede ter uma organização informal e caótica. Não descarta, também, a possibilidade de um crack geral econômico, um 1929 global31, causado pela interconexão via internet de bancos, bolsas de valores e outros organismos econômicos. A disseminação do uso da internet no ensino, pesquisa, lazer, informação, trabalho, negócios e serviços, realmente divide as opiniões e convida para uma séria reflexão. Embora existam muitos estudos sobre o seu uso nos mais variados âmbitos, eles ainda são insuficientes e relativamente recentes. Todavia, qualquer usuário mais ou menos constante pode constatar a presença dos seguintes aspectos que em si mesmos são contraditórios:

30

Entrevista a Revista da FAMECOS – PUC-RS, em dezembro de 2001. Quebra da Bolsa de Nova York em 29 de outubro de 1929, causando uma grave crise econômica nos Estados Unidos e no mundo.

31

59

A internet dá suporte à divulgação e ao acesso a uma enorme quantidade de informações distribuídas por quase todas as partes do mundo. O volume de informações cresce e se atualiza em velocidade crescente, estruturando-se de inúmeras formas, com tipos e qualidades diferentes. Na rede co-existem preciosidades e lixo, segundo critérios diversos e sendo, muitas vezes, difícil fazer uma triagem. Todavia, se por um lado, toda esta gama de informações contribui para a construção de conhecimento, por outro, o grande volume e mobilidade tende a fazer com que a circulação da informação seja prejudicada e que informação valiosa se perca na avalanche.

Enquanto a quantidade de informações aumenta, o número de canais de informação tende a diminuir, devido à tendência de formação de conglomerados e monopólios, alterando a qualidade das informações, principalmente em relação à credibilidade. Por outro lado, cresce o número de canais alternativos que trazem a possibilidade de se inserir como informante, abrindo as portas para a participação dos movimentos sociais e para as mídias independentes.32

Na maioria dos casos, a informação é disponibilizada de forma gratuita, embora venha aumentando consideravelmente a criação de canais onde o acesso é cobrado.

O próprio acesso à internet é oneroso e cada vez mais

dependente de serviços telefônicos e de conexão fornecidos por transnacionais privadas.

Existe uma tendência progressiva de redução do preço de equipamentos, computadores e periféricos, embora eles ainda tenham custo elevado nos países 32

Veja o Centro de Mídia Independente: http://brasil.indymedia.org/ , o movimento Mídia Ética: http://www.zerofora.hpg.ig.com.br/index.html e o Observatório da Imprensa: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/

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consumidores de tecnologia. A par disso, os equipamentos tornam-se obsoletos na mesma velocidade em que novos, mais rápidos, mais potentes, mais poderosos e mais dispendiosos equipamentos vão sendo criados.

A internet disponibiliza múltiplas possibilidades de lazer, desde o turismo online até jogos, programações de rádio e tv, literatura, passatempos e bate-papo. Nem sempre o que é oferecido é de boa qualidade ou adaptado à idade dos usuários, encontrando-se muito conteúdo violento, p*rnográfico, racista e sexista.

O desenvolvimento das ferramentas de www nos permite realizar inúmeras atividades, negócios e acessar serviços on-line, como, por exemplo: comprar, vender, gerenciar contas bancárias, participar de leilões, efetuar pagamentos etc. A segurança e a privacidade destas transações ainda enfrenta problemas, principalmente em relação a falhas nos programas, às dificuldades dos usuários devido ao pouco conhecimento e, também, à ação criminosa de crackers33.

A internet possibilita o teletrabalho, evitando os deslocamentos, os gastos com escritórios, adaptando o trabalho à vida das pessoas e ampliando as suas possibilidades de se integrar ao mercado de trabalho. Porém, ao mesmo tempo, favorece o isolamento físico, a exploração do trabalho, o individualismo e o sedentarismo. Influi de maneiras ainda não avaliadas na vida familiar e restringe o poder dos movimentos de classe e as possibilidades de organização dos trabalhadores.

33

Hacker é o nome que identifica o indivíduo que tem muito bons conhecimentos de sistemas operacionais, sistemas de rede e linguagens de programação. Geralmente, são autodidatas, colaboram uns com os outros e são capazes de identificar os principais problemas de segurança na rede e propor melhorias. Um Cracker tem tão bons conhecimentos quanto um Hacker, mas os utiliza para ações criminosas na www.

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A internet favorece o contato entre as pessoas e os povos, promovendo a integração, o debate de temas comuns, o estabelecimento de laços sociais e a interculturalidade. A par disso, aumenta o alcance de um certo tipo de globalização econômica e cultural, possibilitando o aumento da exploração, da dominação e da hom*ogeneização cultural. Cada uma destas afirmações acima pode ser criticada, desdobrada, agregar outras nuanças, enfim, ser debatida e aprofundada. Existem ainda muitos pontos obscuros, questões que devem ser formuladas e respondidas. Como uma técnica criada sob uma definida concepção de ciência, segundo determinadas intenções e com vistas a um determinado fim pode ser utilizada como meio para fins diversos? Como alterar no interior da tecnologia o seu potencial para condicionar o trabalho e viver humano a um determinado ritmo e a uma determinada forma? Que desdobramentos terão estas tecnologias nos espaços educacionais e na formação do educador? Muito já foi falado sobre a não neutralidade da tecnologia e sobre a importância em pensar o modo como ela seria utilizada. Marx (1984) acreditava que uma geração herda o aparelho produtivo da geração anterior e que este lhe serve como base, inclusive para uma nova forma de produção. Mészáros (2002) contrapõe que este aparato herdado pode acorrentar à forma do pensamento passado e, assim, a tecnologia adquire, por meio da inserção social, a inércia de um fator transhistórico. A tecnologia capitalista é estruturada para reproduzir e ampliar o capital, não importando o custo social disso. Mészáros (2002, p. 527-528) entende que devem ser pensadas formas de transição que possam “romper o circulo vicioso da catastrófica inserção social da tecnologia capitalista” ou, então, “a ‘produtividade’ do

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capital continuará a lançar sua sombra como uma ameaça constante e aguda à sobrevivência, em vez de ser aquela realização das ‘condições materiais de emancipação’ que Marx tantas vezes saudou com elogio”. Em relação à tecnologia como um todo, considerando suas implicações na sociedade atual, pode ser levantada uma série de questões para reflexão, além das já colocadas anteriormente. Lyon (1998) aponta duas questões que considera dignas de nota com relação à chamada sociedade da informação. Em primeiro lugar, a pressuposição de que os benefícios advindos da tecnologia seriam repartidos igualitariamente por toda a sociedade. Este é um discurso comum ao se falar sobre as possibilidades da tecnologia, que são muitas, mas que esbarram de imediato nas muitas reservas de conhecimento, na comercialização de pacotes tecnológicos fechados e na condição dos países dependentes serem constrangidos a se conformar com a posição de apenas consumidores tecnológicos.

Por outro lado, a distribuição do aparato

tecnológico é desigual, coexistindo sistemas arcaicos de produção com ilhas altamente desenvolvidas tecnologicamente. Sem contar as regiões imensamente pobres onde a escrita, como tecnologia, ainda nem chegou. Uma outra questão, ainda dentro desta proposta por Lyon, é a questão do uso da tecnologia. Dentro do sistema capitalista, com seus objetivos, ela é criada e usada para aumentar a produtividade e a extração de mais-valia. Nas empresas, seus benefícios revertem somente para os donos do capital, não influindo na quantidade de horas de trabalho para o trabalhador, quando não causando a sua retirada do mercado de trabalho. Um exemplo disso foi a troca do sistema analógico nas telecomunicações para o sistema

digital, onde, pelas características

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tecnológicas, o papel criativo e autônomo na solução de problemas exercido pelo trabalhador se transformou num papel de mero trocador de peças, além de terem sido eliminados nesta substituição vários postos de trabalho (BIANCHETTI, 2001). Neste sentido, Lyon (1998) aponta o exemplo do Canadá onde o crescimento da produtividade não tem significado criação de empregos. Como exemplo local, temos o Rio Grande do Sul que, de 2002 para 2003, teve, ao mesmo tempo, crescimento no PIB e aumento na taxa de desemprego (FEE, 2003)34. Em segundo lugar, Lyon (1998, p. 65) coloca o papel da tecnologia da informação no controle e na vigilância, que reúne centralizadamente informações as mais diversas sobre as pessoas, como cidadãos, consumidores, empregados. A rede de bancos de dados viabilizaria o traçado do perfil de cada indivíduo com qualquer finalidade de uso, inclusive as que não se restringem a questões comerciais. Este assunto abrange vários princípios éticos que envolvem os direitos humanos de privacidade, sigilo e controle sobre seus dados pessoais. Para ter uma idéia da dimensão do possível problema, basta imaginar o acesso livre a prontuários médicos e a bancos de dados de mapeamento genético. A ciência e a tecnologia reconfiguram os espaços de vida e as relações de poder. Dominar o mundo, no sentido de ter hegemonia política, econômica e cultural sobre ele, sempre foi uma questão de ocupar o espaço e controlar o tempo. No século XIX, dominar o mundo era dominar os mares. No século XX, dominar o mundo era dominar os ares, quer nos transportes, quer nas comunicações. No século XXI, o domínio da informação e de seus meios de produção e circulação se institui como requisito para a supremacia mundial. Da simples ocupação do espaço

34

Os dados e gráficos podem ser visualizados na Fundação de Economia e Estatística do RS (FEE) http://www.fee.rs.gov.br/sitefee/pt/content/estatisticas/pg_pib_estado_desempenho.php e http://www.fee.rs.gov.br/sitefee/download/informeped/tb_02.pdf

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passamos ao controle do tempo; do controle do espaço-tempo chegamos ao domínio da informação e do conhecimento. Todavia, o fator mais poderoso que impulsiona o desenvolvimento científico e tecnológico e que, portanto, está por trás de toda esta transformação, é o impulso para a geração e apropriação da riqueza. Na luta pelos mercados sempre valeu o navio mais rápido, o canhão mais potente, a informação privilegiada. E, nesse sentido, nada mudou. Não é de hoje que “saber é poder” (BACON, 1984), mas a visibilidade desta assertiva nunca foi tanta. O desenvolvimento científico e tecnológico, principalmente o desenvolvimento das TIC, subordinado à lógica do capital, acontece no sentido de buscar a simultaneidade espaço-temporal, de modo a acelerar o giro do capital e potencializar a acumulação. Para isso, é necessária a informação precisa, ágil e estratégica na reorganização do capital, por meio da divisão internacional do trabalho, possibilitando a sua expansão e a superação de suas crises. Todo este movimento tem sérias implicações nos espaços-tempos de vida, em especial na vida cotidiana, no trabalho, na educação e no conhecimento. A reorganização da economia por meio de modelos flexíveis, do deslocamento do foco da produção de bens de consumo para a produção de bens de serviço ou culturais e a predominância do capital financeiro sobre o industrial exige uma reconfiguração do trabalho e do trabalhador. Profissões e práticas tradicionais desaparecem ou mudam radicalmente, outras são criadas.

A

obsolescência é um fantasma muito próximo de tudo, principalmente de tudo que é ligado à informação e ao conhecimento. Se, por um lado, o avanço tecnológico facilita tarefas tradicionais e proporciona os meios para produção de coisas nunca antes sonhadas, por outro, simplifica e fragmenta as tarefas retirando do trabalhador a possibilidade da autoria, da autonomia e da identificação com seu trabalho.

65

A mudança no mundo do trabalho, na qual a tecnologia representa este papel de destaque, inclui, também, a precarização das relações e das condições de trabalho. A flexibilidade do capital, sua transnacionalidade e suas múltiplas mutações desestruturam a organização dos movimentos de trabalhadores e dos sindicatos, pois estes mantêm vínculos ainda muito específicos com os espaços locais. A facilidade de deslocamento do capital é usada como ameaça ao trabalho na negociação e na resolução de conflitos. A tecnologia, ao mesmo tempo em que coopera para este quadro, pois dá suporte a esta nova feição do capital, oferece aos movimentos de trabalhadores os meios para um novo tipo de articulação. Um espaço ainda não muito ocupado e aproveitado nas suas máximas potencialidades. A mudança significativa na forma e nos conteúdos do trabalho nas empresas faz com que novas habilidades e conhecimentos sejam exigidos dos trabalhadores. Isso determina, também novas formas de agregar estes conhecimentos e habilidades. Segundo Bianchetti (2001), a tendência é abandonar o conceito de qualificação em detrimento de um modelo de competências. Por qualificação para o trabalho se entende um processo histórico, fundamentado nas relações entre capital e trabalho. A qualificação para o trabalho vai além de promover uma série de atributos ou características e atender os interesses das empresas. Consiste em preparar o trabalhador para agir num contexto de interesses conflitantes de modo a se realizar como trabalhador e como pessoa. Esta idéia vem sendo substituída pelo discurso do capital – o modelo das competências -, que propõe a adaptabilidade do trabalhador aos novos requisitos das funções, a ênfase nos aspectos relacionais no ambiente de trabalho como forma

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de minimizar os conflitos, e a mobilização e captura dos conhecimentos dos trabalhadores. Este modelo invade os espaços educacionais numa clara tentativa de atrelar a educação às exigências das empresas, elas próprias assumindo a função de organizações educativas. As inovações tecnológicas apresentariam um “caráter policêntrico e difuso”, trazendo conseqüências para o surgimento de outros processos educativos e novos agentes pedagógicos, além daqueles representados pela escola, crescendo em importância as aprendizagens no próprio local de trabalho (BIANCHETTI, 2001, p.28).

Assim, a escola perde seu lugar de instância educacional única e tem exposto o seu atraso em relação à empresa no que concerne ao domínio do conhecimento de última geração. Isso acontece, principalmente, porque cada uma das instituições tem finalidades e objetivos diferentes e até opostos. A empresa tem objetivos pragmáticos, relacionados com a maximização dos seus lucros, inclusive por meio do treinamento de seus funcionários. Enquanto isso, a escola visa uma preparação mais geral e abrangente, além da preparação profissional, uma preparação para a vida. Bianchetti (2001), alerta com propriedade sobre os desafios que trazem estas relações empresa-escola no âmbito da educação. A questão instigante a investigar aqui é encontrar o tempo-espaço de cada instituição a fim de que, de um lado, a escola não se isole, encastelando-se numa suposta neutralidade e promovendo uma educação que não se preocupe em estabelecer nexos com a realidade mais ampla. De outro, é preciso assumir que a escola não pode ser simplesmente colocada a reboque da empresa. Ambas têm importantes pontos de interseção, mas também guardam especificidades (BIANCHETTI, 2001, p. 29).

A educação se depara ainda com outros desafios. O desenvolvimento das tecnologias em geral e das TEI, modifica a sua organização interna, suas finalidades e objetivos, seus conteúdos e metodologias, demandando uma reestruturação geral.

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Uma reestruturação que atinge fortemente a formação e o trabalho do educador. Esta

reestruturação,

contudo,

é

condicionada pelas políticas nacionais e

internacionais que visam formatar a educação na forma e conteúdo do mercado. Penso que o mais importante fenômeno derivado desta digitalização do mundo é a emergência de comunidades no ciberespaço. Longe de apenas proporcionar contatos efêmeros, frios, superficiais e até perigosos, a rede abre espaço para a aproximação efetiva das pessoas. Nesse nosso mundo de distâncias encurtadas move-se uma “elite transnacional” (LASCH, 1995) que cada vez mais abandona suas raízes e cultura territorial e passa a constituir um contingente sem pátria. A mobilidade do capital implementa este modo de vida turístico-nômade, favorecendo a dissolução dos laços comunitários e o crescimento do individualismo. É nessa perspectiva que a tecnologia potencializa a globalização e a perda de identidade e dos referenciais locais. Porém, se a comunidade territorial perde sua força, surge a possibilidade da criação de um novo tipo de comunidade a partir das tecnologias da informação e da comunicação. A mundialização encontra resistências, algumas delas nos corações humanos que anseiam pela proximidade com seus semelhantes, pelos laços familiares, fraternais e comunais. O retorno à comunidade e a emergência de uma nova sociabilidade

é uma resposta à

globalização e as comunidades on-line são um dos meios de concretizar esta reação. Neste contexto, a comunidade on-line surge como um complemento e um avivamento da comunidade local, bem como a sua ampliação que pode unir comunidades globais que se interpenetram. Estas comunidades unem pessoas que partilham os mesmos interesses e cultivam valores em conjunto sob características

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de espaço-tempo diferentes. Deste modo, podem vir a ser os coletivos inteligentes que estudem, investiguem e construam conhecimento cooperativamente. Numa rede, o que afeta um nó da rede causa efeitos em toda a rede, assim, tudo o que concerne à parte da rede, tem a ver com o todo da rede. As comunidades interligadas dão visibilidade a estas inter-relações. Assim, comunidades interligadas podem mobilizar conhecimentos e ações, independentemente de tempo e de espaço, em torno de problemas humanos que, sendo de uns, serão de todos.

3.4 OS ESPAÇOS-TEMPOS EDUCACIONAIS

A ponte sem rio. Altas fachadas de edifícios sem nada atrás. O jardineiro água a grama de plástico. A escada rolante não conduz a parte alguma. A autopista nos permite conhecer os lugares que a autopista devastou. A tela do televisor nos mostra um televisor que contém outro televisor, dentro do qual há um televisor (GALEANO, 2001 p. 229).

Condenados ao consumo? Treinados por meio dos reality shows? Com o avanço tecnológico e a possibilidade de bancos de dados poderosos, os quais mantém a informação atualizada quase que imediatamente, deixa de ter sentido a figura do professor enquanto mero transmissor de informações. Esta afirmação vem, progressivamente, se firmando, inclusive no meio educacional. Neste caso, o professor seria proveitosamente substituído por bancos de dados e pelas equipes multidisciplinares que os alimentam. A educação e o ensino como formação de homens e mulheres para a vida, para o lazer e o trabalho se reduziria a pura instrumentalização. Lyotard (1989) vê uma tendência de separação entre ‘produtores’ e ‘consumidores’ de conhecimento e uma dualidade no sistema de

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ensino para atender estas especificidades. O conhecimento produzido segue a lógica da mercadoria: não importa se é verdadeiro, deve ser vendável. De certa forma esta relação de conhecimento já acontece entre países produtores de tecnologia e países consumidores. Aqui, pode-se inserir uma crítica aos que vêem o deslocamento do foco do ‘produto’ para o ‘conhecimento’ no capitalismo atual. A meu ver não há modificação alguma entre a mercadoria-produto e a mercadoria-conhecimento no que se relaciona a visão de mundo que as definem e manipulam. Na seção anterior deste capítulo, tratei do desenvolvimento científico e tecnológico, da sua aceleração nas últimas décadas vinculada a hegemonia do capital global e de suas implicações na sociedade atual. Implicações estas no próprio estatuto do conhecimento e em todos os aspectos da vida, sobretudo no mundo do trabalho e na educação. Na presente seção quero deslocar o foco para os espaços educacionais, centrando na educação, na pesquisa e na formação do professor. As políticas educacionais vigentes no Brasil vêm correspondendo ao que postulam organismos internacionais, tais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Estes organismos sugerem políticas educacionais sensivelmente diferentes para os países ricos e para os países empobrecidos. Dentro do discurso ideológico de uma possibilidade de desenvolvimento, desde que obedecidas as leis do capital internacional, propõem aos países empobrecidos a posição de consumidores no que concerne a ciência e tecnologia. E, na concretização destas políticas, contam com a intervenção dos próprios educadores em parceria com tecnologias que possam atuar na educação. Fica claro, por isso o

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grifo, que as tecnologias não são tecnologias da educação ou criadas para a educação e, sim, tecnologias a serem usadas na educação (AXT, 2000), que assim se assume como uma formação simplificada e direcionada. Estas políticas têm como ponto comum a flexibilização que institui na educação a mesma precarização que já se instalou no mundo do trabalho. Reduzem a formação ao treinamento em serviço das habilidades e competências solicitadas pelo mercado. Condicionam a liberação de financiamentos à implementação destes programas que incluem a utilização, de forma sistemática, de tecnologias educacionais e de educação à distância. Para Barreto (2001, p.15), “há uma aposta cada vez mais clara nos novos materiais instrucionais como substitutos da melhoria das condições de trabalho e formação dos professores”. As tecnologias educacionais informatizadas (TEI) e a educação à distância (EAD) são tratadas como fenômenos externos e não como partes integrantes e indissociáveis do fenômeno educativo, abrindo a possibilidade da educação e seus rumos ficarem subordinados à tecnologia. Numa outra dimensão, o processo de flexibilização desestabiliza a universidade pública, restringindo a sua autonomia à gestão de verbas, permitindo a suspensão de concursos públicos e institucionalizando contratações emergenciais e temporárias, constrangendo-a a buscar financiamentos privados para a pesquisa, num processo progressivo de privatização do ensino público. Na

ótica

das

organizações

internacionais,

o

ensino

superior

e,

conseqüentemente, a formação de professores, não é prioridade para o Terceiro Mundo, pois estes países têm que priorizar a formação adequada aos espaços do mercado que lhes estão reservados. Em relação à universidade, Marilena Chauí (1999, on-line) aponta que:

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A "qualidade" é [...] orientada por três critérios: quanto uma universidade produz, em quanto tempo produz e qual o custo do que produz. Em outras palavras, os critérios da produtividade são quantidade, tempo e custo, que definirão os contratos de gestão. Observa-se que a pergunta pela produtividade não indaga: o que se produz, como se produz, para que ou para quem se produz, mas opera uma inversão tipicamente ideológica da qualidade em quantidade. Observa-se também que a docência não entra na medida da produtividade e, portanto, não faz parte da qualidade universitária, o que, aliás, justifica a prática dos "contratos flexíveis". (destaques da autora)

Em nível nacional, portanto, as políticas públicas seguem estas diretrizes que se materializam dentro das nossas diretrizes. A Lei de Diretrizes e Bases, Lei nº 9394/96 (BRASIL, 1997), promulgada em 1996, alterou as modalidades de formação e os requisitos para atuação na docência. Às modalidades de formação, que eram o magistério e a licenciatura,

foram acrescentados o Curso Normal Superior, o

treinamento em serviço e a complementação pedagógica para profissionais com nível superior que queiram ser professores. Surgem as contradições: o que foi legislado com intenção de melhorar a educação acaba por gerar profissionais formados em cursos ou complementações apressadas, inconsistentes e meramente de certificação; o aprimoramento profissional é exigido sem a contrapartida de prover tempo, espaço e arcar com custos dos referidos cursos; a melhoria da formação profissional não vem interligada a nenhuma melhoria nas condições de trabalho do professor. Ghiraldelli questiona algumas destas inovações:

Todavia, no que se refere ao professor de educação infantil e das quatro primeiras séries do Ensino Fundamental, a LDBN inovou de um modo inesperado: manteve-se a existência do curso de pedagogia, sem qualquer incentivo à sua melhoria, manteve-se a existência de um substituto da “habilitação magistério”, já então desaparecida e transformada na “modalidade Normal em nível médio” e, ao lado disso, criou-se os “institutos superiores de educação”. [...] Para um país como o Brasil, cujos recursos que o Estado investe na educação não são muitos, é de se estranhar que a LDBN viesse a sobrepor incumbências, o que certamente resultou em uma disparidade de formações [...] (GHIRALDELLI, 2001, livro on-line).

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A educação se compõe de atos políticos e é indissociável das decisões políticas que a definem. Como ação política, a educação, que inclui a formação do professor e a inserção das TEI, é uma das vias de emancipação humana. Faz-se, por isso, importante a constante atenção aos rumos que a educação e a formação do educador vêm tomando. Freire (2002b, p.23) se diz “convencido da importância, da urgência da democratização da escola pública, da formação permanente de seus educadores e educadoras”. Este autor diz, também, que somos seres de inserção e não de adaptação, portanto, tudo o que se refere à educação, à formação do professor e à inserção das TEI deve ser alvo do debate e da prática social. Concordo com o autor quando ele adverte que o caminho é a superação tanto das posições dogmáticas fundadas em verdades únicas e universais, quanto da simples adaptação à realidade concebida como dada e imutável. Para Triviños (2003), falar da formação do professor na América Latina é verificar historicamente a não formação do professor, pois, somente por volta de 1870 a possibilidade de formação do professor começou a ter espaço. Hoje, quando a formação do professor vem sofrendo as conseqüências da desvalorização da educação como formação geral do ser humano e quando a educação que nos é destinada é a que instrumentaliza para nichos que um mercado flexível abre aqui e fecha ali, podemos constatar que nossas dificuldades, embora a luta e os avanços conseguidos, ainda persistem com muitas semelhanças.

4 CONSTRUINDO A REDE

Uma das coisas mais importantes a fazer assim que iniciamos uma pista de Orientação é verificar o percurso marcado, que é obrigatório cumprir na totalidade, orientar o mapa35 e procurar definir as melhores rotas. No mapa, os pontos de controle são marcados por círculos e numerados em ordem crescente. Além disso, os pontos de controle são ligados entre si por linhas retas que dão uma idéia do percurso total. Isso não significa que o orientador deverá seguir exatamente pelo trajeto determinado por aquelas linhas, pois ele pode escolher o caminho pelo qual se deslocará de um ponto para outro. Esta decisão, embora livre, tem que considerar os condicionamentos relativos à topografia do terreno, o preparo físico do participante e sua experiência em pistas de Orientação. Não há pontos de controle obrigatórios na web, o cibernauta define suas rotas no ciberespaço a partir dos links que seleciona e visita, dos avanços e dos recuos, redesenhando percursos a cada navegação. O aplicativo de navegação, o

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Orientar o mapa é a primeira coisa que se faz ao iniciar uma pista de Orientação. Posiciona-se a bússola sobre a carta, girando-se esta até que as coordenadas norte-sul se alinhem com as coordenadas norte-sul da bússola. Um mapa corretamente orientado confere segurança e possibilita a localização visual de elementos que auxiliarão a demarcar os limites do percurso. Depois que o mapa já está na posição correta e que já foi feita a comparação de sua totalidade com os limites visíveis do terreno, ele pode ser dobrado de modo a ficar visível apenas o percurso imediato, facilitando assim seu manuseio e a atenção a detalhes durante o deslocamento em corrida. Neste deslocamento, é importante manter o mapa orientado; muitas vezes, é necessário recolocar a bússola sobre a carta e conferir a orientação. Durante a corrida, o orientador tem que se manter atento à carta, sem descuidar o horizonte, o ponto de controle ainda não visível para o qual está rumando e, também, cuidar o caminho que está sob seus pés. Este olhar que passeia atento entre a carta, o horizonte e o chão, lhe garante a precisão, o rumo e a segurança.

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navegador ou browser, memoriza, durante um certo tempo, os links acessados, permitindo que sejam recuperados mais tarde.

Muitos sites mostram na tela a

seqüência de páginas acessadas desde a inicial, possibilitando que o cibernauta se localize com maior facilidade. Existem, também, aplicativos que vão capturando estes caminhos trilhados e desenhando mapas, até tridimensionais, dos percursos. Contudo, é muito fácil se perder na rede, no emaranhado de links/caminhos que podem acabar levando para bem longe dos objetivos iniciais ou, até, provocar a mudança destes objetivos. Rede de redes, a internet inclui a web, os servidores de correio eletrônico e de transferência de arquivos, bancos de dados etc. Os links de uma página formam o mapa de suas diversas páginas secundárias, cujos links são rotas possíveis para o cibernauta. Neste mapa, é que podem ser construídos os percursos que, por sua vez, vêm delimitar territórios. Mapas provisórios, caminhos mutantes, territórios efêmeros. A conexão e a desconexão das redes cria e destrói caminhos. No percurso teórico-prático de uma investigação é decisivo que os mapas teóricos sejam bem orientados. É importante esta orientação geral em relação à totalidade do fenômeno investigado, bem como situá-lo dentro dos horizontes teóricos e verificar seus limites. Apenas depois disso podemos voltar nosso olhar sobre as partes que compõem este fenômeno, sua análise, suas relações entre si e com o todo. O investigador necessita constantemente fazer a relação entre a teoria e os achados empíricos durante o processo. É possível, assim, compreender a abrangência do fenômeno, o que nele é visível, o que se oculta, quais suas contradições e o modo como todos estes aspectos estão nele relacionados. Num percurso teórico-prático, as possíveis rotas são orientadas pelas perguntas que fazemos baseados no nosso conhecimento do assunto, na nossa

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experiência e, também, no nosso fôlego para lidar com os aspectos da investigação. Nossas perguntas projetam, também, o grau de profundidade e o alcance do estudo que almejamos fazer.

Foi nessa perspectiva que fui trabalhando as minhas

indagações.

4.1 OS NÓS COMO PONTOS DE ACESSO À REDE

Numa pista de Orientação, com o mapa orientado, podemos calcular a distância aproximada até o primeiro ponto de controle, definirmos a rota e partirmos. Em princípio pode parecer uma aplicação da física clássica, onde os dados iniciais permitem calcular nossa trajetória a cada momento. Porém, o mapa não é o território e, assim, nossas certezas são sempre provisórias e o percurso aberto à possibilidade. Existe, porém, uma técnica que pode nos auxiliar muito neste caminho rumo a um lugar futuro que ainda não temos bem claro: consiste em determinar e rumar na direção de um ponto de ataque. Ponto de ataque é um local próximo ao que deveremos chegar e, além disso, é um elemento natural característico do terreno que vai nos dar certeza de estarmos no rumo certo. Na rede não existe um nó que possa ser definido como o início. Todos os nós são inícios em potencial, não há seqüências definidas, nem hierarquias. Cabe ao cibernauta determinar por onde iniciar a construção da sua rede. Diferentemente da maioria dos percursos de Orientação, nem sempre é possível voltar. Na rede, quando acionamos a opção “voltar” do navegador, nem sempre encontramos o lugar de onde partimos, pois em segundos a página pode não estar mais on-line ou ter

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sido modificada radicalmente. Os caminhos materiais têm uma vida e um ritmo muito mais lento que os caminhos no ciberespaço. No percurso de uma investigação, o nó por onde iniciaremos pode ser a principal questão em relação ao nosso fenômeno que temos clara, possível de no futuro suscitar uma resposta consistente e coerente.

A interação em ambientes virtuais entre educadores pesquisadores na elaboração e desenvolvimento de seus projetos contribui para a constituição de comunidades de pesquisadores e para a construção de alternativas para a formação de educadores autores e autônomos no trabalho com as tecnologias educacionais informatizadas?

OUTROS NÓS QUE COMPÕEM A REDE:

O suporte oferecido pelas TEI e seu processo de integração ao trabalho do educador facilitam a formação de comunidades de pesquisadores, modificam a relação do educador com o conhecimento e possibilitam o refletir continuado sobre seus saberes e fazeres profissionais?

A inserção das TEI no trabalho do educador, a partir de seus projetos, contribui para o trabalho individual e coletivo, construindo progressivamente a autoria, a coautoria, a interação dialógica, a autonomia, a colaboração e a cooperação?

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Quais as implicações da utilização de ambientes abertos, públicos e interativos, como os weblogs, no processo de inserção das TEI no trabalho de educadores e na constituição de comunidades de pesquisadores?

Os resultados deste estudo podem contribuir para a criação de uma proposta de inserção das TEI que ressignifique o trabalho do educador e dar suporte a projetos de constituição de comunidades de pesquisadores em ambientes virtuais abertos que possibilitem o processo de formação do educador?

4.2 OS LINKS ACESSADOS

OBJETIVO GERAL

Investigar a constituição e o desenvolvimento de comunidades de pesquisadores, analisando e interpretando as contradições em movimento neste processo, a fim de contribuir para a construção de alternativas para a formação de educadores autores e autônomos no trabalho com tecnologias educacionais informatizadas.

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OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Proporcionar os meios para a formação e desenvolvimento de comunidades de pesquisadores por meio de comunidades presenciais-virtuais e do uso das TEI, organizando situações e ambientes de aprendizagem cooperativa.

Analisar o processo de formação das comunidades de pesquisadores, registrando suas contradições, em especial as relacionadas à inserção das TEI e verificar as modificações que este processo possa provocar no espaço educacional em geral e na formação do educador.

Compreender como acontece a apropriação das TEI por parte dos educadores, verificar quais os fatores que intervém e de que modo este processo pode ser fator de ressignificação do trabalho do educador.

Intervir em comunidades de pesquisadores propondo uma metodologia de apropriação das TEI, que possibilite o conhecimento como autoria e solidariedade. proporcionando apoio no que se refere à sua utilização autônoma em projetos na área da educação.

5 ROTAS OU LINKS SÃO ESCOLHAS

Como aconteceu, Alice nunca soube, mas, assim que atingiu a última estaca, a Rainha desapareceu. Teria se volatizado no ar ou disparara rapidamente floresta adentro (“e ela ‘pode’ correr muito rápido”, pensou Alice)? Não havia como adivinhar. Mas o certo é que se fora, e Alice começou a lembrar-se de que era um peão, e que já devia estar chegando a hora de deslocar-se. 36

A inserção das TEI no trabalho do educador é um fenômeno amplo e complexo. Nele interligam-se vários elementos, cada um deles passível de tornar-se objeto de pesquisa. Decidi centrar minha investigação no processo de incorporação das TEI aos saberes e ao trabalho de educadores que desenvolvem pesquisa em educação. Esta delimitação, por um lado focaliza a investigação num determinado grupo, mas, por outro, tende a aumentar o número de categorias e relações envolvidas. Para

conhecer

este

fenômeno,

é

necessário

investigar

o

seu

desenvolvimento, no movimento de suas contradições. É preciso estudar: o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, o suporte informático, a constituição desta tecnologia em tecnologia educacional, a formação do educador, a formação de comunidades de pesquisadores, a mediação das TEI e o trabalho do educador. É necessário considerar todas as relações entre os diversos elementos e as contradições que emergem e se desenvolvem no interior do fenômeno. É importante, também, contextualizar o pano de fundo histórico, social, econômico, político e 36

(CARROLL, s/d, p.38)

80

cultural, que dá visibilidade ao fenômeno nas suas manifestações e que provoca que elas sejam como são e que, no seu movimento, se criem os espaços por onde se possa pensar a transformação. Apropriar-se de algo e incorporar este saber, esta prática ao próprio trabalho tem como essência o conhecimento, que é o cerne deste movimento. O que desencadeia e dá fundamento a este movimento é o trabalho, pois concordo com Kosík (1976) que só conhecemos mediante a prática social. Segundo o autor (KOSÍK, 1976) a realidade não se mostra imediatamente ao homem. A realidade, no cotidiano, apresenta-se às pessoas como parte sensível e prática de suas atividades. Na teia de relações sociais, as coisas não são normalmente e a priori tomadas como “objetos de investigação” aos quais cabe analisar e compreender teoricamente. Por isso, muitas vezes, as pessoas conhecem ou manejam a realidade, mas não a compreendem. A divisão do trabalho coopera para a fragmentação do conhecimento e a visão parcial da realidade imediata e, também, para a aceitação de afirmações que até invertem o sentido das coisas. Para Kosík (1976), as coisas só podem ser conhecidas por meio de uma atividade. Faz parte deste movimento de compreensão, analisar a atividade por meio da qual a coisa37 pode ser compreendida. Analisar criando esta atividade, que, por sua vez, é um modo de conhecer a realidade, ou maneira como conferimos sentido à coisa.

Captar o fenômeno de determinada coisa significa indagar e descrever como a coisa em si se manifesta naquele fenômeno, e como ao mesmo tempo nele se esconde. Compreender o fenômeno é atingir a essência. Sem o fenômeno, sem a sua manifestação e revelação, a essência seria inatingível (KOSÍK, 1976, p. 12).

37

fato, objeto, algo real, que pode se manifestar como fenômeno.

81

Vygotsky (1989, 1984), compreende a importância da categoria da atividade na construção da consciência. Baseando-se em Marx, vê a consciência originada na atividade prática, construída na interação dos seres humanos com o ambiente. Uma consciência que se transforma na medida em que se transforma a atividade humana sensível. Uma relação de homens e mulheres com o mundo que transcende a relação sujeito-objeto, pois os seres humanos fora das condições sócio-econômicasculturais objetivas da sociedade não têm existência histórica (BAKHTIN, 2000; VYGOTSKY, 1984). Nesse sentido, busco conhecer o processo de incorporação das TEI ao trabalho do educador em comunidades de pesquisadores através de uma atividade que possa desvelar as tendências contrárias que habitam o interior deste fenômeno. Nesta atividade, procuro atingir os objetivos propostos e encontrar resposta para as questões desta investigação. No processo, procuro caminhos que possibilitem que os educadores participantes desta pesquisa possam transformar as TEI de um conhecimento em si em um conhecimento para si. Assim, a investigação é de natureza qualitativa incluindo alguns aspectos quantitativos, dentro do referencial teórico construído, considerando que existe uma realidade

que

precisa

ser

desvelada,

conhecida,

descrita,

compreendida, criticada e considerada em seus significados.

interpretada, Considerando,

também, que esta realidade encontra-se em movimento, um processo sempre em transformação, através da interação dialética de suas contradições. A investigação qualitativa tem como características (BOGDAN; BLIKEN, 1994):

ser um tipo de investigação descritiva onde podem ser incluídas fontes diversas.

82

ter o ambiente social dos sujeitos da pesquisa como campo onde os dados da investigação serão coletados.

a possibilidade de se constituírem caminhos interpretativos no decorrer da investigação.

a preocupação com o processo e com os significados, além dos resultados.

a consideração durante a investigação dos aspectos subjetivos tanto do pesquisador quanto dos sujeitos pesquisados.

Considerando todas as suas implicações da participação do pesquisador, incluída como realidade no fenômeno investigado, caracterizo esta investigação como pesquisa-ação crítica. Segundo Triviños (2001) a pesquisa-ação tem como característica a intervenção do pesquisador na comunidade pesquisada com vistas a solucionar ou atenuar problemas que ela apresente. Na América Latina, este tipo de pesquisa assumiu progressivamente características críticas dada a necessidade de transformação das realidades estudadas. Como exemplo, aponto a pesquisa participante de Paulo Freire, no Brasil e a pesquisa-ação de Fals Borda, na Colômbia, ambas de cunho crítico e transformador, baseadas em fundamentos teóricos metodológicos semelhantes (TRIVIÑOS, 2003).

83

Em Thiollent (2002), encontro algumas características da pesquisa-ação que vem ao encontro do tipo de estudo realizado. São elas: a interação entre pesquisador e pesquisados, tendo como resultado o planejamento da própria pesquisa; o foco principal não é nas pessoas e, sim, no processo pesquisado; existe uma proposta de identificar soluções possíveis aos problemas encontrados; a pretensão de aprofundar o conhecimento e a consciência de todos os envolvidos. [...] pela pesquisa-ação é possível estudar dinamicamente os problemas, decisões, ações, negociações, conflitos e tomadas de consciência que ocorrem entre os agentes durante o processo de transformação da situação (THIOLLENT, 2002, p. 19).

Além destes aspectos, é meu objetivo realizar um estudo crítico de modo a apreender o movimento dialético das contradições internas e externas do fenômeno. O estudo foi realizado como subprojeto do Projeto ZAPT38, projeto integrado de pesquisa que venho desenvolvendo junto ao Núcleo de Estudos, Experiências e Pesquisas em Trabalho, Movimentos Sociais e Educação do Programa de PósGraduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (TRAMSE). A ZAPT (GUTIERREZ, 2003), que significa Zona de Apoio e Pesquisa em Tecnologia, tem como objetivo geral tornar-se um nicho de investigação sobre as TEI na pesquisa e sua inserção na formação do educador de modo a acolher, orientar, dar suporte e divulgação aos projetos desenvolvidos pelo TRAMSE no que se refere à compreensão crítica, criação e utilização das TEI nos seus diversos projetos em trabalho, educação e movimentos sociais. É uma proposta de trabalho que parte da adesão voluntária de educadores e alunos e, neste sentido, segue o ritmo deste processo, com seus avanços e recuos no movimento das contradições que tensionam educação e tecnologia, apontadas anteriormente. 38

Mais informações na proposta de dissertação e em http://www.ufrgs.br/tramse/pzapt/

84

A coleta de dados foi permanente, desde o início do projeto. Foi feita durante as observações participantes, na interação em reuniões e oficinas presenciais ou virtuais, nos registros dos ambientes individuais ou de projetos. Os instrumentos para coleta de informações foram o diário de campo de observação dos ambientes virtuais do grupo, entrevistas e relatórios de oficinas. Além desses instrumentos, no curso da investigação optei por desenvolver um diário de campo virtual, o [bloglab], um ambiente que tem como objetivo incentivar a pesquisa aberta, a colaboração e a agregação de material relativo ao tema de pesquisa. Muitas das elaborações feitas nesta investigação provém de construções e teorizações realizadas e publicadas no [bloglab] e, para enfatizar esta historicidade, optei por trazê-las na forma como lá estão, inserindo-as e problematizando-as no texto. O material foi analisado de modo a,

num primeiro momento, localizar as

categorias empíricas relevantes ao estudo e, num segundo momento, sistematizar as categorias de modo a concentrá-las em aspectos que reflitam a fundamentação teórica do projeto. A interpretação propriamente dita procurou extrair os aspectos relevantes da análise anterior, comparando-os, dentro da fundamentação teórica, aos objetivos desta investigação e verificando as possibilidades de resposta as questões de pesquisa. Durante todas as fases da investigação prosseguiu a construção teórica e a revisão de literatura que dão fundamento a esta investigação. Os aportes surgidos durante o processo, retroagindo sobre todo o curso investigativo, possibilitaram que ações, práticas, estratégias, tecnologias se auto-organizassem de modo a aprimorar o trabalho como um todo.

6 UMA ROTA POSSÍVEL

A partir da qualificação da proposta de dissertação, comecei a linkar os aportes teóricos iniciais com as contribuições da banca de qualificação e com os aportes provenientes da própria prática de investigação. Colocar em prática o que foi planejado suscita um movimento que retroage sobre o plano inicial e tende a tensionar os aspectos teóricos mais específicos, como a formação do professor e sua intersecção com as TEI e, também, as TEI como conhecimentos e práticas em desenvolvimento. Ao mesmo tempo em que realizava estes movimentos, construía uma proposta de trabalho39 concreta juntamente com os educadores participantes da pesquisa, criando um nicho onde se interligavam pessoas, tecnologias, máquinas, teorias, num todo que não fosse estático, fechado e, sim, dialético, aberto. Assim, é necessário deixar claro qual a formação de professores que tenho como referência, de quais tecnologias estou falando e quais as suas relações. Um processo que não desconsidera as visões de mundo e de educação trazidas pelos educadores participantes desta investigação, mas que interage com elas. É neste nó da rede que pretendo iniciar este capítulo, trazendo para dentro dele o que emerge das falas das educadoras e educadores e que reorganiza e dá vida a esta construção teórico-prática.

39

ver apêndice B

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Não foi possível dissociar a pesquisadora que olha o processo da educadora implicada no processo, porque o olhar que pergunta é o mesmo olhar que se assombra no caminho da investigação. Foi por isso que optei por trazer a minha voz, não apenas a voz que compreende e elabora, mas, também, a voz que pergunta, que reflete, que se surpreende e que intervém.

6.1 EDUCAÇÃO, PESQUISA E TECNOLOGIA

Formar-se como professor é aprender a ser professor e, como diz Paulo Freire (2002b, p.81), é “aprender ao aprender a razão de ser do objeto ou do conteúdo”. Aprender a ensinar é reconhecer a razão de ser do ato de ensinar. É compreender a sua dimensão criativa. O ensinar nunca se separa do aprender e é assim que um professor vive: aprendendo, transformando, transformando-se e ensinando.

Tanto para Freire (1983, 2002a,b) como para Triviños (2003) este

ensinar imbricado com o aprender subentende a busca, a pesquisa, a disciplina intelectual e o rigor na construção do conhecimento, aliado a curiosidade e a criatividade. Paulo Freire diz que “só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente” (1983, p.66) e que “o que não podemos, como seres imaginativos e curiosos, é parar de aprender e de buscar, de pesquisar a razão de ser das coisas” (2002b, p.98). Não podemos permitir que detenham “a ânsia de busca, a inquietação, o poder de criar que caracterizam a vida” (FREIRE, 1983, p.50).

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Augusto Triviños (2003) afirma que a curiosidade e a busca do conhecimento são anuladas em todos quando se calam as perguntas das crianças, quando se reprime a sua pesquisa no mundo que as cerca. Assim, pensar a educação e a formação do educador como indissociáveis da pesquisa é trazer para a escola a alegria, a ação, a construção em vez da repetição. Por isso, concordo com o autor quando ele postula que a formação do professor é uma questão fundamental para que este alcance sua independência cultural e propõe uma formação científica, artística e técnica consistente, interdisciplinar e realizada numa unidade teoriaprática. Uma formação que possa se materializar no desenvolvimento de um ensino como pesquisa. (TRIVIÑOS, 2003) Um ensino que parte de perguntas, da busca e de tentativas de resposta, portanto, abre-se para a possibilidade do diálogo e da construção do sentido. Esta dimensão dialógica não neutraliza as diferenças, os conflitos, antes os problematiza. O ensino-pesquisa flui na polifonia das muitas vozes, na comunidade aprendente, na interação com o outro. Uma das grandes críticas feitas à escola e aos métodos de ensino é a sua ênfase nas informações e na memória. Uma crítica antiga, mas que, apesar do muito que se andou, ainda permanece. Uma informação é um fato dado, uma interpretação de alguém sobre um fenômeno ou acontecimento. Nesse aspecto, memorizar simplesmente uma informação é guardar por um certo tempo um dado que não veio da elaboração do sujeito e que não mobilizou sua cognição na interação dos contextos e relações pertinentes a este assunto. Portanto, não é aprendizagem. Aprender importa em desconstruir uma informação verificando as suas relações, contexto e significados, comparando, testando e produzindo sentido. Um movimento dialógico que se dá entre investigadores críticos no ato cognoscente.

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(FREIRE, 1983, p.80) Um sentido que, para Bakhtin (2000, p.386, destaque do autor), “é potencialmente infinito, mas só se atualiza no contato com outro sentido (o sentido do outro), mesmo que seja apenas no contato com uma pergunta no discurso interior do compreendente. [...]”. Um sentido que não existe como sentido solitário e, portanto, sentido inicial ou final, pois é um sentido que se insere entre sentidos, na rede de sentidos. O conhecimento que faz sentido é concreto, contextual e histórico, é movimento que se refaz sempre. É conhecimento construído socialmente, na ação do indivíduo ao construir sua própria existência. Esta construção social se encontra, também, na teoria de Vygotsky (1989, p.18) onde ele afirma que “o verdadeiro curso do desenvolvimento do pensamento não vai do individual para o socializado, mas do social para o individual”. No diálogo com o outro e posteriormente consigo mesmo originam-se as primeiras manifestações da reflexão lógica. Um processo de reconstruir internamente uma atividade externa, que Vygotsky (1984) chama de internalização. Aprender significa compreender, então compreender situa-se no âmbito da construção do conhecimento (AXT, 2000). Uma construção que não é solitária, pois inclui os conhecimentos anteriores acumulados pela humanidade e o diálogo. “Compreender a composição heterogênea da informação é compreender a multiplicidade de vozes que a compõe, seu caráter particular e de incompletude, a sua natureza histórica espacial e social, estilística” (AXT, 2000, p.16). Uma construção mediada pela linguagem, pois em Bakhtin (2000, p.352-353) encontramos que compreender é “tornar-se parte do enunciado, do texto [...]”; um texto que é indissociável da realidade e que se relaciona com o sujeito real e com outros textos, mesmo quando existe uma separação temporal entre estes textos,

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como acontece quando lemos um livro há muito tempo escrito. Estabelece-se, desta maneira, uma interação, como relação dialógica mediante uma confrontação de sentidos, uma compreensão que Bakhtin (2000) chama de responsiva ativa e que exige duas consciências. Esta compreensão traz implícita uma construção conjunta, “a dialogicidade verdadeira, em que os sujeitos dialógicos aprendem e crescem na diferença, [...]” (FREIRE, 2002a, p.67). Ao refletir duas consciências, um texto estabelece relações dialógicas intra e

intertextuais. Intratextualmente dialogam a palavra e a entonação, o pensamento do autor e o contexto. Além disso, o texto dialoga com outros textos respondendo aos que vieram antes, posicionando ante os que estão por vir, numa intertextualidade que dialeticamente busca o sentido em patamares cada vez mais coerentes. A compreensão, nesta perspectiva, traduz-se em autonomia, que preenche com liberdade o espaço ocupado pela dependência (FREIRE, 2002a). Maturana e Varela (1997), em sua teoria da autopoiese (autocriação), consideram o efeito de circularidade da cibernética, onde a ação retroage sobre si mesma modificando e sendo modificada por suas condições de partida, como componente que explica o modo como os organismos em sua interação incluem no seu domínio cognitivo o seu próprio domínio cognitivo. Chamam este processo de consciência. Vygotsky também estabelece uma forma de retroação na sua teoria que explica a aquisição da consciência reflexiva por meio dos conceitos científicos. Este processo acontece pela generalização de um conceito dado e construção de “um conceito supra-ordenado que inclui o conceito dado como um caso específico” (VYGOTSKY, 1989, p. 80). Assim, constitui-se a consciência e o controle deliberado

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sobre o conceito, retroagindo estas relações sobre os conceitos espontâneos já estabelecidos no cotidiano. Bakhtin (2000) coloca os fundamentos da consciência no plano sociológico, onde esta assume contornos interindividuais indissociáveis do meio social. Juntamente com Vygotsky valoriza a linguagem e a interação com o outro como organizadores desses processos. Freire (1983, 2002b) identifica a tomada de consciência como a possibilidade de homens e mulheres se inserirem no processo histórico, numa perspectiva dialética que não subestima e nem superestima o papel da consciência. Uma inserção como ação efetiva, considerando que “se o momento já é o da ação, esta se fará autêntica práxis se o saber dela resultante se faz objeto da reflexão crítica” (FREIRE, 1983, p. 57). Deste modo, construir conhecimento é organizar compreensivamente as relações entre os conceitos. E isso acontece de forma não linear, segue os caminhos criados pelas associações feitas. Caminhos que podem ser retomados ou desviados a cada interação. Construir conhecimento é, também, contextualizar e conferir sentido; um sentido que se forma no diálogo com os outros sentidos, num contexto que é sóciohistórico. A relação dialógica que constrói conhecimento, conforme entende Bakhtin (2000), estabelece-se entre sujeitos de linguagem, entre sujeito e texto e entre textos. Expressa-se nos signos, na linguagem oral e escrita. Construir conhecimento é organizar

e reorganizar compreensivamente as

relações entre os conceitos formados a partir das experiências vivenciadas. Implica, também, num movimento de auto-organização da própria cognição. Autoorganização que consiste na inclusão da organização própria como uma variável

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que é mantida constante por um sistema. Esta capacidade de auto-organização é mobilizada em situações de desequilíbrio, no sentido de construir uma nova situação de equilíbrio. Neste processo, é necessário que haja a interação, pois sem ela não há espaço para a auto-organização e para a vida (PRIGOGINE, 1996) Prigogine (1996) adverte que na medida em que um sistema se afasta da situação de equilíbrio, se complexifica, se instabiliza, surgindo o ponto de bifurcação, onde se altera a trajetória que vinha sendo seguida, a matéria adquire novas propriedades e configura-se uma nova trajetória-estabilidade. Sem entrar na explicação física deste processo, o que deve ser salientado é a quebra da simetria, da linearidade nos processos, a imprevisibilidade das trajetórias a partir dos dados iniciais, que a mecânica clássica instituía. Nesta perspectiva, Santos (2000a, p. 70) afirma que “[...] em vez da eternidade, temos a história; em vez do determinismo, a imprevisibilidade; em vez do mecanicismo, a interpretação, a espontaneidade e a auto-organização; em vez da reversibilidade, a irreversibilidade e a evolução; em vez da ordem, a desordem; em vez da necessidade, a criatividade e o acidente”. Num processo de aprendizagem, mediante as múltiplas interações e reorganizações efetuadas, tanto considerando a trajetória individual como a trajetória dos interagentes, ocorre um distanciamento da situação de equilíbrio e inicia-se um funcionamento dissipativo onde surgem atratores que tensionam o desenvolvimento do processo, fazendo com que as trajetórias se bifurquem, auto-organizando-se em outro estado estacionário40. Focalizando a reflexão de uma educadora participante na pesquisa:

40

Atratores são estados para os quais o sistema se sente atraído na sua instabilidade. Estacionário não significa um estado/estrutura estático ou em equilíbrio, mas, sim, um estado/estrutura que se ordena longe da situação de equilíbrio por meio das trocas com o meio. Um estado de ordem a partir da desordem (PRIGOGINE, 1996)

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Nesse processo, da resistência imediata, da aprendizagem instrumental e aplicativa, da automatização de procedimentos, da irritação , ocorre uma metamorfose que tem como marco o comentário de um desconhecido em meu blog41 pessoal. Esse fato gerou uma torrente de pensamentos e sensações, que foram da invasão à real dimensão do público no tocante aos blogs. Isso redimensionou a amplitude dessa tecnologia, dando novos contornos às minhas reflexões [...] [Mara, 06/04/2004, [zaptlogs], destaques meus]

Embora seja possível identificar nesta fala de uma das educadoras participantes na investigação o desequilíbrio e a bifurcação e até o ponto onde a trajetória da educadora se alterou, transpor idéias das ciências físicas e biológicas para as ciências humanas é um processo que pode gerar problemas. É tentador, mas perigoso, se o uso dos conceitos é feito na forma de uma transposição literal. No caso dos conceitos de autopoiese, auto-organização, entropia, circularidade, ordem e desordem, se sua utilização for feita considerando como sistemas agrupamentos humanos, ou instituições é grande a possibilidade de erros. Disso nos adverte, por exemplo, Varela (MATURANA ; VARELA, 1997) em relação ao conceito de autopoiese. Existe, porém, toda uma semelhança interpretativa que já é visível na obra de muitos cientistas sociais ou, ainda, a possibilidade da metáfora. Hoje, a metáfora continua presente no discurso da ciência justamente para explicar o que não dispõe de palavras para ser explicado. Mais que um recurso de estilo, a metáfora preenche as lacunas deixadas pela não coincidência de nosso desenvolvimento social e científico, uma assincronicidade entre o que necessita ser dito e a criação de signos que possam representá-lo. A metáfora, como processo de pensamento, remete a uma imagem conhecida que aproxima a compreensão. Neste aspecto, considerando a necessidade de cautela e de aprofundar o estudo destas categorias, limito-me a considerar as pistas deixadas em aberto na 41

Weblog ou blog é um tipo de publicação dinâmica na web. Ver capítulo 6.

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busca de um melhor entendimento sobre a cognição humana, tanto nos aspectos do indivíduo quanto no dos agrupamentos humanos. Toda a situação de aprendizagem é uma situação de desequilíbrio. Um período onde novas informações desestruturam a rede de conhecimentos estabelecida. Neste período, ocorre um processo de interação entre os conceitos no domínio cognitivo, um processo dinâmico de reestruturação da rede de conhecimentos e relações. Esta auto-organização pode ou não significar aprendizagem, na medida em que as informações processadas se tornarem ou não conhecimento. Concordo com Paulo Freire (2002b) quando ele diz que o educando se torna realmente educando apenas quando vai conhecendo os objetos cognoscíveis e não quando o educador vai depositando nele a descrição destes objetos. Este conhecer implica tornar o objeto de conhecimento algo para si, o que supõe superar de alguma forma. a contradição sujeito-objeto. Uma contradição que não se resolve apenas mudando os pólos e, sim, no movimento dialético entre os opostos. No entanto, a educação em muito ainda mantém o padrão bancário de depósitos e retiradas, se a considerarmos como um todo, isto é, considerarmos a sala de aula, o currículo, a estrutura educacional, os regimentos escolares, a avaliação etc. A própria inserção das TEI não modifica este quadro e, dependendo do modo como acontecer este processo, pode torná-lo pior. Por muito tempo estudei por “obrigação”. Como assim? Com sete ou oito cadeiras obrigatórias no meu curso [...] me via sem muito tempo para estudar o que desejava e me dava prazer. Assim, como um "robozinho", via-me obrigada a ler os polígrafos escolhidos pelas professoras e professores. [Vivi, 05/04/2004, [zaptlogs]]

Apesar da predominância do padrão bancário, como expressa esta professora recém formada, vêm sendo criadas alternativas diferenciadas para o ato educativo,

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como as abordagens construtivistas, o ensino-pesquisa, a inclusão das TEI, que se configuram em ações que pressionam as estruturas educacionais no sentido de sua transformação. O ensino como pesquisa é aquele onde o educador, ao mesmo tempo em que ensina, aprende, questiona a realidade de sua prática, da escola e da comunidade escolar e, onde o educando, ao mesmo tempo em que aprende, busca respostas às suas indagações e, portanto, ensina. Deste modo, o ensino-pesquisa é da ordem da formação do educador e abre espaço para a reflexão, conforme solicita uma das educadoras participantes nesta investigação.

Concordo com você, conseguir entender/compreender algo é muito importante e para que isso ocorra é necessário que se estabeleça um espaço de reflexão onde os sujeitos que ali estão e interagem consigam por si só construir a sua própria compreensão dos fatos, para isso ocorrer é indispensável que o professor de espaço para o aluno se expressar e buscar compreender as diversas situações que se apresentam. Não sendo assim ele apenas repetirá o que o docente ensinou sem refletir e sem se questionar e consequentemente não irá além daquilo. [Sônia, 26/03/2004, Prática Educativa]

Entretanto, cabe salientar que, embora apontando o problema e propondo formas de solução, a educadora ainda reproduz o que critica, pois se coloca de forma externa, como não implicada no processo e contexto. Esta contradição, de não nos implicarmos nos processos, é recorrente e difícil de superar. E é nestes termos que podemos entender quando Marx diz que “o próprio educador deve ser educado” (MARX, 2002) Em relação ao ensino-pesquisa concordo com a proposta de Triviños (2003) de um ensino baseado na pesquisa-ação crítica. Uma pesquisa-ação construída na semelhança com o trabalho de Paulo Freire. Uma pesquisa, segundo Triviños (2003), dialética e materialista, geradora de novas perspectivas de relacionamento entre professores e alunos; pesquisa que fomenta processos de igualdade

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intelectual e de liberdade democrática entre os educadores de vários níveis, onde os educandos se inserem como possuidores de conhecimento, com direito à voz e ação; uma modalidade de ensino que desenvolva a cooperação, que promova o trabalho coletivo e que possibilite a constituição de comunidades de pesquisadores. Em sua proposta, Triviños (2003) utiliza-se de idéias de Kincheloe (1997), às quais faz alguns acréscimos e contextualizações, para formular as características da pesquisa-ação crítica como forma de implementar o ensino-pesquisa. Entre estas características destaca-se o compromisso político na escolha dos temas de pesquisa e métodos, a coerência entre a prática e os valores do pesquisador e a consideração da totalidade do fenômeno pesquisado e não apenas de partes isoladas. Ser um educador é fazer parte de uma profissão que congrega um conjunto específico de conhecimentos e práticas, que são históricos e, portanto, não são imutáveis e nem fixos, são movimento de contínua reconstrução. Segundo o proposto por Triviños (2003), o educador-pesquisador ensina pesquisando e a sua formação lhe permite investigar a realidade de sua sala de aula, de sua escola, bem como, dos espaços educacionais em geral. O autor conclui que esta é uma formação rigorosa e sistemática que deve ocorrer desde o início do curso de graduação, o que irá se refletir na progressiva expansão do ensino-pesquisa a todos os níveis de ensino. Penso que a educação, a formação do educador e o ensino como pesquisa podem beneficiar-se em muito da tecnologia existente e criar tecnologia própria. Comunidades de educadores pesquisadores podem se constituir como coletivos inteligentes (LÉVY, 1999a), transformadoras e construtoras de uma tecnologia da educação, fruto da reflexão sobre o projeto de ser humano e de mundo que se quer. Estas comunidades emergem e colaboram utilizando-se dos mais variados meios,

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inclusive os recursos da rede mundial de computadores, conseguindo ultrapassar fronteiras, contornar espaço, tempo e diferenças. Mesmo numa arena de luta, onde as leis do capital tendem a instituir práticas e determinar tendências, estas comunidades, não raro encontram e alargam espaços com grandes possibilidades contra-hegemônicas. Como acoplar tecnologia e educação é uma decisão política dependente das escolhas da sociedade, pois, se acreditarmos no potencial emancipatório da educação, nossa posição deve ser a de propor e defender uma inserção crítica e criativa das TEI, que não se subordine aos ditames do mercado (BELLONI, 2001). Porém, no meio educacional, tudo o que concerne às tecnologias, em princípio, é olhado com desconfiança.

Desde as possíveis correlações entre a

disseminação do uso da caneta esferográfica e a degradação geral do ensino, chegamos até o vigor com que as tecnologias da informação e da comunicação, em especial a internet, foram inicialmente atacadas. Atualmente, são poucos os que se posicionam como se a tecnologia na educação fosse uma das bestas do apocalipse, mas são muitos os que ou calam embaraçados, ou criam mecanismos nem sempre legítimos de transferir o assunto para territórios mais instrumentais. O velho medo do desconhecido, a resistência de tentar caminhos novos e a preferência pela dor conhecida. Por outro lado, existem aqueles que tecem sobre a internet e a telemática um discurso ufanista, messiânico até. A crença na criação de espaços de interação onde a humanidade encontrará o convívio pacífico e multicultural e poderá construir um mundo democrático e solidário. Entre estes extremos, firma-se a possibilidade dos meios telemáticos serem mais que ampliadores das capacidades humanas: serem determinantes de um novo

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estatuto do conhecimento e de alterações importantes na cognição humana. Contudo, a tecnologia em si, à semelhança da ciência, não é neutra. Ela é criada em resposta aos problemas que o poder detecta em sua reprodução e, assim sendo, vem conformada a um dado contexto, embora não se esgotando nestes condicionantes. Concordo com Pretto (2001) que já é quase consenso que a inserção das TEI no ato educativo não deve se configurar numa transposição da sala de aula tradicional para os meios digitais, ainda mais que a sala de aula tradicional ainda concebe a tecnologia educacional como sinônimo de instrução programada. Também acompanho o autor na sua advertência de que é consensual “a percepção de que o uso das TIC será um fracasso se insistirmos na sua introdução como ferramentas, apenas como meros auxiliares do processo educacional” (PRETTO, 201, p. 42), mais ainda quando este processo educativo consiste em práticas monológicas onde o professor é o emissor e o aluno o receptor da informaçãoconhecimento. Considerando o fenômeno na totalidade na qual está inserido, a inserção das TEI no trabalho do educador apresenta inúmeras tendências contraditórias.

Em

relação ao conhecimento, elas representam, por um lado, uma possibilidade de emancipação para os seres humanos, por meio do acesso a informação e ao conhecimento e, por outro, uma possibilidade de regulação, pela manipulação do acesso a informação e ao conhecimento. Em relação aos espaços de vida, a interação virtual potencializa a comunidade, os aspectos locais e, ao mesmo tempo, favorece a globalização. Existe toda uma possibilidade de autonomia ligada as TEI, na medida em que for construído e compartilhado o conhecimento. Todavia, existe, também, uma

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grande possibilidade de dependência no conhecimento, na ciência e na tecnologia, caso nossa posição seja a de apenas consumidores. De muitas formas, as TEI ampliam as capacidades humanas por meio das máquinas e seus meios, porém também favorecem o processo de objetivação do saber humano na máquina com todas as conseqüências que isso gera num sistema capitalista. Sistema este, onde as horas poupadas pela máquina não geram tempo livre para o trabalhador, ao contrário, geram sobrecarga e aumento da exploração para uns; miséria e desemprego para outros. O desenvolvimento tecnológico implica na necessidade de especialização de muitos trabalhadores. Em contrapartida, a simplificação das tarefas que minimiza a experiência e o treinamento, fragiliza a formação de muitos outros trabalhadores. Há uma tendência, em especial nos países empobrecidos, da existência apenas do usuário da tecnologia. Contrapondo-se a isso, surge toda uma motivação para o desenvolvimento do autor, de conhecimentos, metodologias e tecnologias. Muitos vêem no desenvolvimento das TEI a substituição do trabalho do educador, outros relacionam o desenvolvimento das TEI à valorização do trabalho do educador. No primeiro caso, se a educação tomar o rumo de uma instrumentalização para as exigências de mercado e, no segundo caso, se lograrmos ter e manter uma educação que seja uma formação para a vida e para a cidadania. Os educadores, cada vez mais, conscientizam-se da necessidade das TEI no seu trabalho, porém ainda permanece forte entre eles a rejeição das TEI, pelos desafios que elas trazem e pela alteração nos processos de trabalho que elas provocam. É claro o aumento dos monopólios em relação à tecnologia, pelas fusões de empresas e privatização de telecomunicações. Contudo, em resistência, surge um

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grande incentivo à criação e utilização de software livre, conforme explicitaremos mais adiante. A interação em rede por meio de tecnologias informatizadas incrementa o desenvolvimento e expressão dos movimentos sociais, pois lhe dá voz e visibilidade. Por outro lado, esta mesma interação enfraquece os movimentos sociais na separação dos trabalhadores pela fragmentação da empresa ou pelo teletrabalho. Estas tendências combinadas produzem uma outra tendência que: ou segue a lógica do capital num progressivo movimento de elitização do acesso, de privatização dos meios, de mercantilização do conhecimento, de crescimento da competição e expansão de uma globalização neoliberal; ou reforça os mecanismos de resistência que encontram formas de expressão dentro da própria tecnologia, nas suas possibilidades de opção por plataformas e aplicativos de código aberto, por formas de trabalho colaborativas e/ou cooperativas, pela pesquisa aberta e pela socialização do conhecimento. Estas tendências contrárias no interior do fenômeno de inserção das TIC/TEI na prática social contêm os aspectos que tensionam seu desenvolvimento. Este movimento que é histórico e dialético terá muita importância no rumo de nossas vidas e da vida em nosso planeta neste milênio. Estas contradições estão presentes nos contextos em que se realizam as pesquisas sobre as TIC em educação e comunicação, porém dificilmente são trabalhadas nos estudos sobre os fenômenos e relações que acontecem nestes meios. O foco destes estudos dirige-se, quase sempre, para os aspectos micro, enfatizando subjetividades, deslocando o fenômeno da totalidade na qual está inserido. Considerando, também, estas contradições, concluímos que a formação do educador se dá onde o aprender se acopla ao ensinar e toma uma forma que vai

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além da dicotomia imposta a estas ações. Uma proposta à qual uma concepção de ensino como pesquisa traria vida e movimento. Que caminhos podem ser mapeados no rumo de uma proposta como esta? Deixando no ar esta, quero trazer outra questão, neste momento. Até aqui, já falamos inúmeras vezes em TEI ou tecnologias educacionais informatizadas, porém o que são e quais são as tecnologias pensadas para esta proposta? As TEI fazem parte das tecnologias intelectuais que são os meios, como propõe Ramal (2002, p. 14), “que a humanidade passará a utilizar para aprender, gerar informação, ler, interpretar a realidade e transformá-la”. As tecnologias intelectuais acoplam as ferramentas culturais, como a escrita ou a informática à cognição humana. As TEI podem ser as tecnologias intelectuais da educação no sentido em que são frutos de um projeto de sociedade e de educação dirigido pela e para a participação coerente e crítica de todos. Ou podem ser tecnologias intelectuais na educação, na medida que forem a objetivação das idéias e do projeto de mundo de uma classe dominante. A escolha é política e quem, como eu, opta pelas tecnologias da educação tem que se manter atento na esperança e na luta pelos espaços de ação, no movimento de sua construção. Uma questão importante em relação as TIC/TEI, que tem muita interferência na sua relação com a educação, é a concentração de sua propriedade nas mãos de grandes conglomerados, quase monopólios. O Windows, interface que é usada em quase cem por cento dos computadores vendidos42, é um software fabricado pela

42

É praticamente impossível optar por outro sistema operacional ou por nenhum sistema operacional na compra de um computador. A venda já vem fechada e, a substituição ou retirada do Windows, não reduzirá o preço final, podendo, inclusive, aumentá-lo.

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Microsoft e tem o código fonte43 fechado. Isso quer dizer que é um software proprietário e seu código fonte é acessível apenas ao proprietário, não podendo ser adaptado ou modificado. O Windows foi construído de tal modo que, aos poucos, concentrou outros aplicativos, impossibilitando que o usuário faça escolhas. Por exemplo, incorporou à sua instalação, de forma obrigatória, a instalação do navegador Internet Explorer, também da Microsoft. Isso acarretou que navegadores concorrentes deixassem de ser usados, pois a inclusão de um segundo navegador ocuparia espaço e memória e, também, poderia causar conflitos no funcionamento do computador. Além desta associação fechada entre aplicativos, todas as maiores inovações e aperfeiçoamentos do Windows vêm em novas versões, que implicam na aquisição de novas licenças. Neste contexto, as versões mais antigas, depois de algum tempo, são descontinuadas, se tornando impossível fazer correções e receber suporte. A questão da propriedade e de sua exploração faz com que os softwares sejam criados de modo à só funcionarem juntamente com outros softwares e/ou em determinados sistemas operacionais44. A maioria não pode ser copiada ou instalada em diversos computadores sem pagamento de licença adicional. Os aplicativos e as máquinas mantêm entre si uma relação de dependência e limitação, isto é, para o funcionamento de um é necessária a existência do outro numa determinada versão. Isso aumenta os custos de qualquer melhoramento que necessitar ser feito. A alternativa para a não dependência deste tipo de softwares é a opção pelo software livre. Softwares livres são programas construídos de forma colaborativa e/ou cooperativa e que são distribuídos com o código fonte aberto, ou seja, podem 43

Código fonte é o texto escrito em linguagem de programação feito para criar um programa. Sistema operacional é a ligação entre o computador e o usuário, de forma bem simplificada, é o que faz com que os programas apareçam na tela do computador e com que as ordens que você dá, por via do teclado ou do mouse, cheguem aos programas e sejam cumpridas. 44

102

receber adaptações, correções e aperfeiçoamentos. Livre não significa gratuito, porém este tipo de software se torna mais acessível porque pode ser copiado e distribuído tanto na versão original quanto nas versões modificadas. Desta forma, a adoção deste tipo de aplicativo é uma alternativa para uma maior e mais autônoma participação digital, em especial para o desenvolvimento e uso em educação45. Até o momento e na maioria dos casos, as TEI têm chegado à escola, não como fruto da demanda dos projetos de professores e alunos e, sim, como uma inovação trazida pelos treinamentos que acompanham uma opção tecnológica feita fora da escola. Os resultados disso, apontados em diversos estudos (BOLL, 2000; MAÇADA, 2001; MARTINS, 2001; ORTH, 2002), são laboratórios fechados, tornados obsoletos antes de serem utilizados, equipamentos mal utilizados, desviados da função educacional, privatização do acesso, prevalência de atividades e usos puramente instrumentais, computadores transformados em máquinas de escrever ou de entretenimento. Conforme também comenta uma educadora:

Um dos colegas comentava que para pressionar a Coordenadoria de Educação a mandar um computador para a escola, sugeriu para a secretária que enviasse um ofício a mão, explicando que a partir daquela data os ofícos seriam todos mandados dessa forma, pois a única máquina de escrever que a escola possuía, uma manual, estragou. Achei interessante a forma de pressão mas lhe perguntei para que computador se nas escolas onde existiam eles não podiam ser usados e dei como exemplo a escola da outra colega, onde eu também trabalhei. A colega, saltou para justificar que os computadores existentes e a bela sala, só podia ser usada pelo curso técnico, pois eles tinham informática e precisavam deles. Sem os computadores o curso não era reconhecido. E se os outros alunos usassem iam estragar. Não tinha dinheiro para arrumar. Eram muitos alunos... Os animos esquentaram e resolvi, como anfitriã, desviar o assunto. Como mudar a escola pública, quando ela se transforma em reino de interesses privados? [Mara, 26/10/2003, [zaptlogs]]

45

As escolas da prefeitura de Porto Alegre – RS estão utilizando o Linux (um software livre) em seus computadores.

103

Este comentário descreve uma situação muito encontrada nas escolas: a privatização do acesso aos meios que deveriam ser de todos. Exemplifica as conseqüências geradas a partir do modo como as TEI chegam à escola. Para que a participação na escolha possa ser reivindicada ou para que possa haver resistência à imposição de opções tecnológicas, à adoção de modelos de capacitação e à implantação de determinados projetos de utilização da tecnologia, é necessário que os educadores se apropriem do conhecimento que lhes permita compreender estas diversas opções e suas implicações. Isso lhes permitirá a ação no âmbito das TEI, a possibilidade da resistência crítica e a alternativa da contraposição de outras propostas. A seguinte fala mostra este movimento realizado por uma educadora:

Por que aceitar ser campo de pesquisa em uma área onde apresento resistência? Resistência verbalizada. Aprendizagem instrumental. Rotinizando os procedimentos. Aplicar a técnica. Resistência reflexiva. [Mara, 24/01/2004, Nina]

Contudo, as TEI, mesmo que cheguem da forma descrita anteriormente, são passíveis de serem aproveitadas, transformadas e ressignificadas por meio dos projetos dos educadores e da escola, frutos do conhecimento que deve ser buscado fora dos pacotes de capacitação, dentro das próprias comunidades de educadores pesquisadores.

104

6.2 AS NOVAS TRIBOS46

Esses nômades orientam seu percurso por estrelas estranhas, que podem ser núcleos luminosos de dados no ciberespaço ou, talvez, alucinações. Abra um mapa do território; sobre ele, coloque um mapa das mudanças políticas; sobre ele, ponha um mapa da internet, especialmente da contra-net, com sua ênfase no fluxo clandestino de informações e logística; e, por último, sobre tudo isso, o mapa 1:1 da imaginação criativa, estética, valores. A malha resultante ganha vida, animada por inesperados redemoinhos e explosões de energia, coagulações de luz, túneis secretos, surpresas.47

Para Hannah Arendt (1999), a polis (esfera pública) progressivamente sucedeu a família (esfera privada) como organização política da comunidade. A esfera da polis era a esfera da liberdade, onde agiam os "dotados de fala". Ser dotado de fala não significava ter a capacidade de falar e sim, participar de um modo de vida onde o discurso tinha sentido (ARENDT, 1999, p.35).

Crianças,

mulheres e escravos, confinados a esfera privada, não tinham existência como seres dotados de fala. Relativamente às relações sociais que acontecem em comunidade, a autora diz que "a ação e o discurso criam entre as partes um espaço capaz de situar-se adequadamente em qualquer tempo e lugar" (ARENDT, 1999, p.211).

Uma

antevisão do tipo de sociedade onde o território e a língua deixaram de ser o fator mais importante para união de alguns agrupamentos humanos e a “polis não é a cidade-estado em sua localização física; é a organização da comunidade que resulta do agir e falar em conjunto, e o seu verdadeiro espaço situa-se entra as pessoas que vivem juntas com tal propósito, não importa onde estejam” (ARENDT, 1999, p.211).

46 47

Sobre o tema comunidade, ver, também, o projeto desta dissertação, indicado nas referências. [BEY, 2001]

105

Hoje, já se considera a existência de comunidades nestes termos propostos por Arendt. As comunidades on-line que estabelecem relações como as descritas na fala desta educadora:

Este apontamento surgiu a partir de uma conversa com a Daisy. Ela ficou de colocar os apontamentos das disciplinas que está gostando no blog dela e eu os apontamentos no meu. Vale dizer que acho que esta é uma ótima iniciativa, pois assim trocaremos informações, lembraremos do que já foi visto, aprenderemos outras coisas e estaremos compartilhando com d+ pessoas os conhecimentos adquiridos nesta universidade pública, gratuita e de qualidade!!! [Vivi, 21/03/2004, Práticas de Vida]

Depois dos anos 70, no contexto do capitalismo global e da sociedade de consumo, o princípio de comunidade enfraquece em relação ao período anterior, pela diferenciação da classe trabalhadora e o crescimento do setor de serviços.

Concretamente, em relação ao elemento comunitário, a lógica do capitalismo é a lógica de atomização, destruição dos vínculos comunitários, isolamento do indivíduo, glorificação da separação, do egoísmo, do interesse utilitário. Não é só a ideologia mas o próprio funcionamento do sistema que opõe os indivíduos uns aos outros (LÖWY, 2000, p. 245).

Por outro lado, surgem os movimentos sociais com orientação ecológica, antiracismo, feminista, e a tecnologia abre as portas para as chamadas comunidades virtuais. Não se trata de um retorno a comunidade ancestral, e sim de uma comunidade que é a negação da negação; que nega a comunidade da sociedade moderna, retroagindo e recuperando sobre novas bases os ideais das comunidades primitivas. Este devir da comunidade representa a historicidade e a totalidade de muitas relações. Na apresentação da versão on-line de Comunidade Virtual, Howard Rheingold explica que, ao pensarmos um título para um livro, sempre procuramos um que expresse uma idéia e, ao mesmo tempo, que seja sugestivo e instigante sem ser

106

longo. Continua, dizendo que Comunidade Virtual poderia ser identificado por um título mais preciso como Pessoas que usam computadores para se comunicar, formam amizades que, algumas vezes, vêm a ser bases de comunidades, mas você tem que ser cauteloso para não confundir a ferramenta com o assunto e pensar que o fato de escrever palavras numa tela é a mesma coisa que uma comunidade real (RHEINGOLD, 1998, tradução minha).

Neste livro, Rheingold propõe que

comunidades virtuais são redes construídas por pessoas em torno de interesses comuns. Vai além, defendendo que, diferentemente do que muitos acreditam, estas comunidades não impedem a aproximação física entre as pessoas, podendo, ao contrário, promover esta aproximação. Aprovo a cautela do autor antes de identificar como comunidade qualquer aglomerado de pessoas interagindo na rede, sem que esteja presente este agir e pensar junto, como sentimento de pertencimento a uma totalidade que não é igual à soma de indivíduos. Em relação à não confundir a ferramenta com o assunto, Jones (1997) propõe uma distinção entre a comunidade virtual e o suporte, ambiente ou mensagens relacionados a ela. Cria, então, o conceito de estabelecimento virtual, que é o lugar no ciberespaço onde a comunidade pode surgir. Este lugar pode ser qualquer suporte para a comunicação entre pessoas de modo individual e coletivo, como uma rede de IRC, uma lista de discussão etc. O suporte, por si só, não garante a criação de uma comunidade virtual, porém, uma comunidade virtual necessita um suporte para existir. Estes suportes são geralmente chamados de ambientes virtuais. Manuel Castells (1999) entende que os interesses comuns que reúnem as pessoas em comunidades on-line situam-se principalmente em torno de interesses pessoais e/ou profissionais/especializados, mas que, conforme a interação via rede

107

se intensifica e amplia, surge a dimensão de solidariedade nestas relações. Castells (1999) fala dos estudos de Barry Wellman, realizados entre 1996 e 1999 nos Estados Unidos da América, onde foi constatado que tanto as comunidades físicas quanto às comunidades on-line, consistem no entrelaçamento de redes pessoais formadas por raros laços íntimos, poucos laços fortes e uma grande maioria de laços fracos. Porém, mesmo os laços fracos cooperam para uma sensação de pertencimento e aconchego e são fatores de solidariedade na comunidade.

A

internet tem especial ação no fortalecimento destes laços fracos, no caso das comunidades virtuais. As comunidades assim formadas são “redes sociais interpessoais, em sua maioria baseadas em laços fracos, diversificadíssimas e especializadíssimas, também capazes de gerar reciprocidade e apoio por intermédio da dinâmica da interação sustentada” (CASTELLS, 1999, p. 445).48 Uma crítica que pode se fazer em relação às comunidades virtuais é quanto à possibilidade de acesso49 economicamente restrita, que é a mesma que ocorre com a internet como um todo. Este acesso é ainda privilégio de uma minoria, mesmo que se considere a forma aberta como a internet se constituiu inicialmente. Assim, pode servir para reforçar os laços e a coesão social apenas de uma elite que tem possibilidade de acesso. Neste sentido, o uso da tecnologia na educação deve levar em conta estes limites, como reclama uma das educadoras participantes desta investigação:

48

Vem crescendo o uso da expressão rede social para designar comunidades e ambientes com características que merecem estudos mais aprofundados. 49 No Brasil, embora o acesso à internet venha crescendo, ainda não atingimos a casa dos 10% da população. Em 2002, segundo dados da Divisão de Estatísticas da ONU, apenas 8,22 % da população brasileira estava conectada. Em maio de 2004, Jorge Werthein, representante da Unesco no Brasil, em matéria de Lydia Medeiros para o Jornal O Globo de 23/5/2004, sobre o lançamento do livro que relata a Pesquisa da Unesco sobre o perfil do professor no Brasil, fala em 10% de brasileiros conectados. Nos dados sobre os professores, nesta pesquisa, publicados no site da Unesco, verificase que mais da metade dos professores não possui computador e 59,5 % não usam o correio eletrônico.

108

[...] o uso das tecnologias deve ocorrer num processo prazeroso, mas muitas vezes não é o que acontece, pois as tecnologias de hoje e principalmente o computador e a Internet são muito dinâmicos, mas se esquece que as pessoas não andam com a mesma velocidade que as novas tecnologias exigem e necessitam - somos apenas humanos. Só que esquecem-se que muitas das pessoas que conseguem estar nesse espaço privilegiado não tem acesso a essa tecnologia - ela ainda é acessível a poucas pessoas. [Sônia, 06/04/2004, [zaptlogs]]

A evolução e a convergência entre as diversas mídias vêm tomando a forma de conglomerados e monopólios que já estão influindo, e muito, nas características do desenvolvimento da cultura eletrônica. Por exemplo, ao contrário da televisão normal, a televisão sob demanda, com ou sem integração com a internet, é paga e volta-se mais para o entretenimento do que para a difusão de informações e para as possibilidades interativas das comunidades. Nesta perspectiva, os sistemas multimídias não vêm a se constituir, em sua forma de comunicação, do mesmo modo que a internet. Enquanto a internet se estabeleceu por meio de uma comunicação aberta, horizontal e distribuída, existe uma tendência para a constituição de sistemas multimídia centralizados, fechados e exclusivos.

Aparece

aqui

a

contradição

entre

tipos

diferentes

de

comunicação/interação que, no caso da internet conforme sua origem, são horizontais e mútuas entre interagentes e, no caso das tendências atuais dos sistemas multimídia, são centralizadas e reativas entre emissor e receptor (PRIMO, 1998). Como estes sistemas multimídia fazem parte da internet, tendem a levar esta contradição para o interior da rede como um todo. Por outro lado, a possibilidade de comunidade deixa muitas pistas a serem seguidas. Steven Johnson (2003), em “Emergência: a dinâmica de redes em formigas, cérebros, cidades e softwares”, fala sobre as leis da emergência, onde comunidades, comportamentos, ações surgem a partir da agregação e da repetição

109

de padrões simples, num movimento de auto-organização que ocorre da base para o alto, isto é, que não parte da ação inicial de nenhuma liderança ou inteligência supra-ordenadora . Diz ele: “formigas criam colônias; cidadãos criam comunidades; um software simples de reconhecimento de padrões aprende como recomendar novos livros. O movimento das regras de nível baixo, para a sofisticação do nível mais alto é o que chamamos de emergência” (JOHNSON, 2003, p. 14). Alguns dos conceitos e exemplos considerados neste livro me ajudaram a pensar certos processos que ocorrem nas interações presenciais e virtuais de indivíduos, outros, me trouxeram dúvidas e indagações. Será a construção do conhecimento

um

fenômeno

emergente

que

acontece

a

partir

de

informações/conceitos/atividades mais simples que cooperam na formação de outro sentido mais amplo ou diferente? Comunidades em interação podem ser consideradas sob a perspectiva de campo de ocorrência de padrões simples que levem a emergência de determinados comportamentos? Algumas

expressões

encontradas

nesta

investigação

podem

sugerir

respostas:

Fui até a Faculdade de medicina para apresentar o Blog Prática Educativa [...] Foi algo impressionante. Ao mesmo tempo em que eu ia falando, mostrando, uma série de questões iam tomando forma dentro de mim. [Mara, 16/11/2003, [zaptlogs]]

A educadora ensinava os passos a serem seguidos para a utilização do blog, quando aquelas atividades simples lhe trouxeram outra dimensão de compreensão.

110

O que eu quis dizer é que necessito, visualizar o que estão me explicando, ver todos os passos para conseguir significar tudo aquilo que estão me expondo. Necessito também ter esses passos registrados num primeiro momento... [Sônia, 15/04/2004, [zaptlogs]]

Nesta fala, a educadora explica como aprende a partir da análise de informações recebidas. Estes mesmos exemplos podem ser colocados para outras teorias e, no meu entender, existem muitas questões controversas na obra de Johnson, questões a serem analisadas, criticadas e aprofundadas, como, por exemplo, uma certa linearidade de causa-efeito, um certo espontaneísmo relacionados a autoorganização que, em muitos pontos do texto, levam a crer num movimento sem controle e não passível de interferência e, portanto, natural. Além disso, MARX (1996) mostrou bem a diferença entre o pior dos arquitetos e a melhor das abelhas.50 Outra pista pode ser encontrada no conceito de communitas de Victor Turner (1974). O autor, ao estudar os processos rituais de comunidades primitivas, identificou um momento do processo, a fase de liminaridade, na qual ocorre uma perfeita e horizontal interação entre os participantes, onde todas as hierarquias se anulam e se instala uma nova relação entre as pessoas. Neste estágio, surge um sentimento de fraternidade e integração entre os membros da comunidade onde suas identidades são direta e imediatamente confrontadas, livres de divisões sócioculturais. Turner chama este estado de communitas.

50

“Pressupomos o trabalho sob forma exclusivamente humana. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha supera mais de um arquiteto ao construir sua colméia. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em realidade.” (1996, p. 202)

111

A “communitas” é um relacionamento não-estruturado que muitas vezes se desenvolve entre indivíduos concretos, históricos, idiossincrásicos. estes indivíduos não estão segmentados em funções e “status” mas encaram-se como seres humanos totais (TURNER, 1974, p. 5).

A comunidade emerge deste processo de suspensão da ordem reconstruída sob novas perspectivas. Posteriormente, Turner estende às sociedades modernas a existência de períodos onde agrupamentos humanos podem experimentar o estado de communitas. Podemos citar como exemplos os processos interativos ocorridos em alguns eventos nos anos 60 que resultaram no movimento hippie como comunidade.

Pode-se associar estes conceitos de Turner à possibilidade de

transformação social pelo movimento dialético entre as fases liminares e uma reestruturação da organização social. Bakhtin (1999) identificou processo, que penso ser semelhante, nos seus estudos da cultura popular

da Idade Média, sobretudo no carnaval. Durante o

carnaval, homens e mulheres medievais experimentavam um deslocamento do curso habitual da vida: ficavam suspensas todas as proibições e restrições ao comportamento, toda a forma de medo ou de respeito às autoridades instituídas. Um processo que podemos identificar na cultura brasileira: no Carnaval e em movimentos como o Tropicalismo. Carnavalização, neste sentido, importa numa quebra das hierarquias e no espaço instituído por meio de normas sociais, políticas e religiosas. Nas comunicações on-line, o uso de avatares, de nicknames51 e outras formas alternativas de identidade, de certa forma, cumprem algumas das funções das fantasias e máscaras carnavalescas. Hakim Bey (2001), estudando comunidades alternativas e descentralizadas que funcionam em rede, postula que as tecnologias da informação e da 51

Avatar, nas comunicações on-line, é uma representação gráfica de um personagem real ou de uma personalidade real. Nickname é um apelido que se usa no lugar do nome real em comunicações online.

112

comunicação evoluem no sentido de possibilitar a existência de comunidades que podem operar como zonas autônomas, livres de controle político, embora também exista a tendência de possibilitarem o inverso, isto é, o total controle sobre todos os relacionamentos e processos.

Para antecipar a época futura, talvez improvável,

onde estas zonas autônomas poderão ser realidade para todos, ele propõe a existência de zonas autônomas temporárias (TAZ52), onde comunidades ou grupos possam experimentar a liberdade e a ausência de controle. O autor associa o conceito de TAZ

à insurreição ou levante quando os compara e distingue da

revolução. Para ele, uma revolução tem um ciclo composto por revolução, reação, traição, fundação de um Estado mais forte e coercitivo, enquanto uma insurreição ou levante é um movimento inacabado, pois não vitorioso, e que permite um movimento para fora e para além de uma espiral de progresso, que na realidade é um ciclo vicioso. Assim, propõe a TAZ como estratégia de ação, uma ação pontual que não confronta diretamente o Estado, que surge e se dispersa antes de ser esmagada por ele, podendo, assim, deixar algum legado. Hoje, as possibilidades de comunicação por telefones móveis, por mensagens de texto dão suporte a este tipo de estratégia53 e, se contribuem para a organização dos movimentos sociais, alguns destes levantes instantâneos sofrem a crítica de serem apenas vibrações que não afetam o sistema, válvulas de escape para as pressões e, portanto, adjuvantes da manutenção do status quo. Principalmente pela estetização e aproximação de um ideal de moda e de consumo privilegiado que sofrem.

52 53

Optei por usar a sigla em inglês por sua popularidade. falaremos deste assunto mais adiante.

113

Santos

(2000a),

diz

que

a

comunidade

pressupõe

participação

e

solidariedade e, como princípio sustentador da modernidade, ainda resiste inacabada e apta a interagir em novas alternativas de emancipação.

[...] o princípio da comunidade resistiu a ser totalmente cooptado pelo utopismo automático da ciência e, por isso, pagou duramente com sua marginalização e esquecimento. Mas pelo fato de ter ficado afastado, o princípio da comunidade manteve-se diferente, aberto a novos contextos em que a sua diferença pode ter importância (SANTOS, 2000a p.75).

Em sua proposta sobre possíveis caminhos de emancipação, Santos (2000a), entre outras coisas, traz os conceitos de fronteira, barroco e sul, que incluo nestas pistas deixadas pelo movimento da comunidade. A fronteira como um paradigma de subjetividade construtora de comunidades autônomas, onde os limites são constantemente negociados e, ao invés de restringirem como cercas, atuam como pontos de referência da ação. O barroco como uma metáfora cultural de uma nova forma de sociabilidade, relação social inacabada e subversiva que transcende as normas instituídas, próxima do conceito de carnavalização de Bakhtin. O sul como metáfora cultural de um tipo de sociabilidade que caracteriza o sul geográfico, mas que emerge em qualquer lugar exprimindo “todas as formas de subordinação a que o sistema capitalista mundial deu origem: expropriação, supressão, silenciamento, diferenciação desigual, [...]” (SANTOS, 2000a, p.368). O sul

como forma de

pensamento oprimido que, ao libertar-se, liberta o opressor (FREIRE, 1983). Estas pistas, que envolvem a organização das comunidades e que apresentam muitas tendências contraditórias, são questões importantes a serem estudadas e aprofundadas, também em relação ao devir das comunidades chamadas virtuais. Porque, a rede de redes entrelaça pessoas e comunidades numa trama que não coincide com o desenho das comunidades materiais. De fato, esta

114

rede costura numa outra dimensão o que, materialmente, pode estar solto ou muito afastado. As novas comunidades são este emaranhado de fios que se sobrepõem às relações entre as comunidades materiais e constroem comunidades multiculturais que mesclam o local e o global e, sendo outras, são, ao mesmo tempo, as mesmas comunidades materiais. A comunidade virtual não se constitui no lugar da comunidade local-territorial, antes é seu complemento. Pode se constituir como resistência à fragmentação e ao individualismo, como uma possibilidade de autoconstrução que ocupa os espaços deixados. Nesse sentido, o discurso da internet, que se diferencia de todos os discursos sobre a internet, é o discurso das comunidades virtuais. Contraditório, mas rico em possibilidades emancipatórias. A tecnologia é o meio deste discurso, cujo fim é a relação. Relação dialética entre culturas, relação que constrói e protege os seus símbolos e identidades.

6.3 OS NÃO-LUGARES, SEUS TEXTOS E SUAS PRÁTICAS

Em relação ao ensino-pesquisa e às comunidades de educadorespesquisadores as principais funções das TEI são: interligar pesquisadores e comunidades, implementar e facilitar o trabalho cooperativo, prover meios para a troca de material e mensagens, servir de repositório e memória e dar visibilidade aos projetos. As TEI garantem a seqüência do trabalho mesmo quando os participantes vivem em lugares distantes com fuso horário bastante diferente, pois funcionam tanto de modo síncrono quanto assíncrono. Isso é feito por meio dos ambientes

115

virtuais54 que vêm a se tornar veículos de uma nova forma de cognição supraindividual. Ambientes virtuais são dispositivos que permitem e dão apoio ao desenrolar de certos processos em seu interior. Geralmente, são espaços interativos onde o usuário se comunica e coopera com outros usuários ou com programas e bancos de dados especificamente criados. Podem ser ambientes criados e comercializados ou produzidos especificamente para um curso/projeto ou, ainda, podem ser construídos agregando recursos já disponíveis on-line, inclusive de forma gratuita. Como exemplo de ambientes virtuais podemos citar: uma página na internet que possibilite participar em jogos individuais e coletivos, um banco eletrônico, uma sala de aula virtual, uma sala de bate-papo (chat), listas de discussão etc. Estes ambientes podem ser síncronos ou assíncronos, quer permitam ou não a interação em tempo real. Podem ser públicos ou restritos a um grupo, permanentes ou efêmeros, quer guardem em memória acessível ou não os processos realizados em seu interior. Podem ser de uso individual ou coletivo, simples ou compostos, conforme aglutinarem em seu interior outros ambientes. Os ambientes virtuais abrem a possibilidade para a formação de comunidades ou dão suporte à forma virtual das comunidades já existentes. A interação em ambientes virtuais pode ser por meio da comunicação oral ou escrita, acompanhadas ou não de imagens. A forma mais simples e comum que se encontra é a da comunicação escrita, pois a captação e a transmissão de áudio e vídeo necessita um aparato tecnológico mais sofisticado e de conhecimentos específicos, também. A comunicação pode ser feita por meio da troca de mensagens

54

Para conhecer mais sobre os ambientes virtuais e seus tipos, consulte o projeto desta dissertação, indicado nas referências.

116

individuais ou coletivas, via e-mail ou chat, da publicação de textos ou outros materiais, da troca de arquivos. A interação pode ser mútua se todos são emissores e receptores da comunicação ou reativa caso a iniciativa parta apenas do professor, por exemplo. A maioria dos ambientes virtuais se baseia em hipertextos ou hipermídias. Os hipertextos organizam e estruturam as informações na forma de redes não lineares unindo-se a outros hipertextos compondo uma estrutura rizomática em constante construção, sem ponto definido como inicial e sem ponto final. A internet, como um todo, assume a estrutura rizomática do hipertexto num eterno refazer-se e refletir sobre si mesma. Hipertexto, [...] significa texto composto por blocos de textos [...] e as ligações (links) que os acompanham. A hipermídia simplesmente estende a noção do texto em hipertexto, incluindo informações visuais, sons, animações e outras formas de dados (LANDOW, 1992 p.4 , tradução minha)

Para Bakhtin (2000, p. 329) “onde não há texto, também não há objeto de estudo e de pensamento”. Conhecemos as coisas, entendemos os seus sentidos através dos textos com que elas se manifestam. O texto, num sentido amplo, seria todo o conjunto de símbolos que nos dão a conhecer um determinado fenômeno. Aqui incluiríamos a língua, os sons, a linguagem das artes.

Bakhtin (2000)

aprofunda a reflexão sobre o texto verbal (oral e escrito), que tem um sujeito que fala ou escreve – o autor. O texto é ao mesmo tempo reproduzível e irreproduzível. É reproduzível no que toca a língua, aos signos que podem ser copiados, reimpressos. É irreproduzível no seu sentido de enunciado, pois é único e individual, criado num determinado momento e com um determinado fim. Desta forma, o texto reflete duas consciências, a do autor e a do leitor que, ao ler, já re-elabora outro texto.

117

A partir da visão bakhtiniana do diálogo como uma interação entre consciências, o diálogo com este texto se transforma no diálogo com vários sujeitos de linguagem. Várias vozes nos falam a partir de cada texto. Esta reflexão mobiliza, entre outras, as noções de dialogia, polifonia, intertextualidade, autoria e co-autoria. O hipertexto é um enunciado? Sim, na medida em que é composto como um todo, representando uma idéia completa. Porém, um determinado destinatário pode interrompê-lo nos links adicionando uma quantidade de idéias ao enunciado original ou mesmo, abandonando o enunciado e não mais retornando. Uma interpretação possível sobre a composição deste enunciado é a de que, para o autor, o enunciado é a totalidade do hipertexto, incluindo os links. Um enunciado variável segundo o destinatário que atingir. Neste caso, o destinatário participa da construção do enunciado, dentro dos limites previstos pelo autor, como co-autor, acessando ou não os links. Um enunciado completo, de todo modo. Não retornar ao hipertexto original, seria como interromper a leitura de um livro. Uma outra interpretação pode ser dada se considerarmos os infinitos encadeamentos que um hipertexto pode ter. Ligado a outros hipertextos que, por sua vez, são ligados a outros, proporcionando uma multiplicidade de trajetórias que não podem ser previstas pelo autor. O próprio autor se desdobra nas vozes de todos os autores que compõem a rede hipertextual. Nesta perspectiva, a web seria um gigantesco enunciado construído por uma multiplicidade de sujeitos que se alternam como emissores e receptores. Os editores de texto colaborativos55, por seu turno, além de todas as considerações anteriores feitas ao hipertexto, têm ainda algumas questões a serem

55

editores colaborativos são sistemas que permitem a edição de textos e gráficos por vários usuários conjuntamente. Exemplos: Equitext (http://equitext.pgie.ufrgs.br/) , weblogs, wikis. Para mais informações, consultar projeto de dissertação indicado na nota anterior e nas referências.

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evidenciadas. Uma delas, a possibilidade de alteração do texto, retirando trechos, acrescentando outros em qualquer ponto. Outra questão é a autoria que, pelas características e possibilidades do meio, se transforma numa autoria coletiva. Tanto o hipertexto como as produções via editores colaborativos são enunciados permanentemente inacabados, mas completos em cada instante, na medida em que continuam abertos para interação e alteração. O hipertexto, a hipermídia ou a multimídia interativa tem sua origem nos "fichários dinâmicos de biblioteca", o Memex de Vannevar Bush56, em 1945. Um "navegador de informações" idealizado com base na maneira não linear de funcionamento do cérebro humano, onde uma palavra levaria a destinos múltiplos por caminhos sempre interligados. Em 1960, Theodor Nelson usa pela primeira vez a palavra hipertexto referindo-se a um texto em escrita não seqüencial que oferece escolhas ao leitor (LANDOW,1992). Pierre Lévy explica:

Essas conexões, que ainda não se chamavam hipertextuais, materializam no Memex, espécie de memória auxiliar do cientista, uma parte fundamental do próprio processo de pesquisa e de elaboração de novos conhecimentos. Bush chegou mesmo a imaginar uma nova profissão, uma espécie de engenharia civil no país das publicações, cuja missão seria a de ordenar redes de comunicação no centro do corpus imenso e sempre crescente dos sons, imagens e textos gravados (LÉVY, 1993, p. 29).

O hipertexto torna indefinidas as fronteiras que separam autor e leitor, pois ao acessar ou não os links e traçar trajetórias próprias sobre o hipertexto, o leitor como que o reescreve a sua maneira. Desta forma, transforma a atividade do leitor/receptor que se torna co-autor. O texto multiplica-se nos vários textos reescritos pelas diversas trajetórias. Por meio dos links, junta-se a outros textos, de outras autorias que com ele dialogam.

56

mais informações em http://www.ps.uni-sb.de/~duchier/pub/vbush/vbush.shtml

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Esta estrutura em rede permite a criação de vários centros ou vários pontos de partida e a participação de um bloco hipertextual (lexia) em vários hipertextos. Isso possibilita ao leitor a escolha de seu próprio centro de investigação. Assim o centro torna-se uma função e não um lugar determinado (LANDOW, 1992). A transmutação das fronteiras entre centro e periferia é um fenômeno recente e, no meu entender, fértil de possibilidades para os movimentos sociais, para o trabalho e a educação, sobretudo nos aspectos onde a comunicação e a informação se tornam estratégicas. Publicações dinâmicas vêm tomando o espaço e a audiência da imprensa oficial e cresce a credibilidade e o poder de alcance desta mídia alternativa. Nestas publicações, se cumpre o que foi alardeado desde o início da web: a possibilidade de todos serem emissores e receptores. Ainda assim, é necessário resistir à privatização destes meios e lutar pela ampliação do acesso à internet. Ainda neste tema centro/periferia, ou o centro que está na periferia e a periferia que está no centro, pode-se incluir a academia e a comunidade, o centro da cidade e a favela, como contrários que, indissociáveis, se tensionam no interior deste fenômeno que engloba o conhecimento e as práticas humanas. O suporte digital – publicação na web - permite que sejam criadas instâncias de participação do leitor dentro do próprio hipertexto original. Esta adição de outros hipertextos, por fim, torna difícil de discernir os limites entre os textos anexados e o hipertexto original. Além disso, abre espaço para o desaparecimento do autor, pois em ambientes de escrita hipertextual colaborativa podem ser configuradas formas de participação onde qualquer pessoa tenha a liberdade para escrever, reescrever, modificar o que foi escrito, adicionar ou subtrair partes do hipertexto em construção.

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Se, por um lado, desaparece o autor, como sujeito determinado, por outro, não desaparece a autoria que pode situar-se entre uma autoria múltipla, mas determinada, até uma autoria quase que completamente indeterminada. Isso implica na redefinição da autoria e da propriedade intelectual, que têm como fundamento o texto impresso. O hipertexto agiliza a interconexão bakhtiniana dos vários textos, multiplica as possibilidades de relações, aproxima o texto principal das anotações. Várias vozes nos falam a partir de cada texto – de cada rede, de cada nó. Nenhuma voz, nó, rede tem prioridade sobre a outra, a não ser a que lhe é provisoriamente atribuída. Retornando aos ambientes virtuais e às relações que neles se engendram, é importante destacar a referência à cooperação e à colaboração, sempre presentes. Nos textos em língua inglesa, a palavra colaboração é mais usada em educação, enquanto que cooperação é mais usada referindo-se ao trabalho. (NITZKE et alii, 2002) Em português, as duas palavras tendem a serem utilizadas como sinônimos. Somente alguns autores fazem distinção entre cooperar e colaborar, conferindo maior abrangência a um dos termos. Autores de base piagetiana preferem usar a palavra cooperar no sentido de (co)operar, que “pressupõe que o sujeito encontrese em um estágio de desenvolvimento no qual ele seja capaz de realizar operações de reciprocidade [...]” (NITZKE et alii, 2002, p. 14). Por outro lado, Ted Panitz (1996), reforça a idéia de que colaborar refere-se ao trabalhar em conjunto, enquanto cooperar volta-se para o produto deste trabalho. Acrescenta que a aprendizagem cooperativa tem origem nos escritos de John Dewey sobre a natureza social da aprendizagem e do trabalho aplicados no trabalho de Kurt Lewin, numa abordagem mais quantitativa, enquanto a aprendizagem colaborativa tem suas raízes no trabalho de professores ingleses que investigavam

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maneiras de auxiliar seus alunos a terem um papel mais ativo em sua aprendizagem, usando uma abordagem mais qualitativa. Nesta investigação, não sem dificuldades, procuro usar os dois termos com a seguinte distinção: cooperação, como realização de atividades em conjunto focadas no mesmo projeto; colaboração, como realização de atividades em conjunto, não necessariamente no mesmo projeto. Não importando qual o termo usado para nomeá-las, num ambiente virtual, é possível estabelecer qualquer tipo de relação entre os participantes, inclusive repetir as relações verticais professor-aluno de uma sala de aula tradicional. Aí fica claro que o meio por si só não define ou altera o projeto de educação que está por trás. Porém, de modo geral, os ambientes virtuais vêm se caracterizando por estabelecer relações horizontais, democráticas e de constante negociação, mesmo considerando os papéis diferentes para professores e alunos neles. Relações horizontais supõem cooperação, colaboração e reciprocidade entre os interlocutores. Assim, os aspectos afetivos se fazem presentes em ambientes virtuais e transparecem através da comunicação. Nota-se, principalmente a diferença na linguagem utilizada para as comunicações informais e formais, sendo que as primeiras abrem maior espaço para a presença de sentimentos e emoções. É necessário salientar, que os ambientes virtuais e as TEI, em geral, têm funções que vão além do apoio instrumental que possam dar ao ensino-pesquisa: a criação da ecologia cognitiva, do sistema cognitivo supra-individual que potencializa a aprendizagem, que viabiliza a emergência da autoria e da produção de sentido. Foi pensando nestas possibilidades e sendo coerente com o que venho teorizando que fiz determinadas escolhas, optei por determinados links, os quais, de um modo ou de outro, sempre me conduziam à blogosfera.

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6.4 VIAJANDO PELA BLOGOSFERA57

É madrugada e o único som que se ouve é o téc téc téc do teclado. Ao meu lado, uma caneca com café esfriando, testemunhando as últimas horas de um envolvimento que vem sendo constante nos últimos meses. Pensar, redigir, revisar, dar vida, na forma do texto de um projeto de dissertação, à teoria-prática construída. Criação solitária a não ser pelas vozes que perpassam o texto, uma síntese que se apóia em tantas outras sínteses. Sínteses sempre provisórias, abertas, polifônicas, dialéticas. Uma pausa. Espreguiço-me e clico num dos ícones da barra de tarefas. Abrese o mundo numa página, dinâmico; o mapa mostrando as andanças do dia e da noite. De repente, lá estou eu, uma pequena luz na latitude 29,99 oeste, longitude 51,17 sul, uma estrelinha que brilha solitária ao sul, porque as grandes constelações estão ao norte e à oeste. Minoria, eu presto atenção nas demais estrelas solitárias. Uma na ilha de Bornéu, no sudeste asiático, outra ao sul da Rússia e alguém perdido no mar a leste da África. Clico na estrelinha do mar, curiosa para saber de onde se conecta. A página se abre, escrita num idioma que se assemelha aos idiomas escandinavos. Parece uma página de adolescente, mas não tenho como identificar quase nada. Algum morador das Ilhas Seychelles? Ou alguém distraído que trocou as coordenadas e foi parar dentro do mar? Sei lá. Assim mesmo, clico no seu último texto e, em nome das únicas coisas que sei termos em comum: ambos

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Este texto foi escrito durante a elaboração do projeto de dissertação e parte dele foi publicada na revista Informática na Educação: Teoria & Prática. (jan/2004)

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humanos e ambos blogueiros, deixo um recado: “alguém do Brasil esteve aqui e te deixa um abraço”.

Uma página na internet é como uma mão estendida. Penso que é por esse, mais do que por qualquer outro motivo, que os weblogs explodiram criando um novo espaço, a blogosfera.

Logar é um verbo bastante usado na internet. Significa entrar, conectar ou, ainda, gravar. Logamos quando preenchemos nosso nome de usuário e senha para conectarmos na internet ou, estando já conectados, entrar numa página de uso restrito. Logamos quando gravamos o texto de um chat ou os procedimentos da instalação de um aplicativo.

Os weblogs têm sua origem no hábito de alguns

pioneiros de logar a web, anotando, transcrevendo, comentando as suas andanças pelos territórios virtuais. Weblog ou, simplesmente, blog, como é popularmente conhecido, é um tipo de publicação on-line relativamente recente. Como idéia, sua origem remonta ao nascimento da world wide web, todavia, como fenômeno específico, é recente. O que distingue os weblogs das páginas e sites que se costuma encontrar na web é a facilidade com que podem ser criados, editados e publicados, sem a necessidade de conhecimentos técnicos especializados. Um weblog é construído e colocado on-line por meio de uma ferramenta que realiza a codificação da página, sua hospedagem e publicação. Esta ferramenta é disponibilizada na rede, em diversos tipos, em versões gratuitas ou não, por diversos servidores.

124

David Winer mantém um dos weblogs mais antigos da web, o Scripting News58, criado em 1996, parte do site chamado 24 Hour Democracy, onde publica notícias, comentários e discussões sobre a www, sobre aplicativos e sobre programação. Na sua opinião (WINER, 2001), o primeiro weblog foi o primeiro site de internet e se confunde com a criação da própria www por Tim Berners-Lee, um físico do CERN, em 1990. A www foi criada como forma de gerenciar documentos e veio a revolucionar a forma como hoje as pessoas acessam e trocam informações. Berners-Lee criou juntamente com o primeiro site, o primeiro navegador, inicialmente, também chamado WorldWideWeb. Entre os anos de 1993 e 1996, a página What’s New, do NCSA, liderou a explosão da www e a idéia dos weblogs cresceu com ela. Os primeiros weblogs eram um agregado de links e comentários postados segundo os interesses de seus editores. Rob Malda (citado por PAQUET, 2003), do popular weblog Slashdot, caracteriza bem o espírito destes pioneiros: “O Slashdot teve grande sucesso porque eu era a minha própria audiência. Eu não estava tentando fazer uma página para os outros, eu estava criando a página que eu queria ler.” (tradução minha). Em 1999, foram criados os primeiros serviços de weblog, como o Blogger, do Pyra Lab (hoje do Google), e o EdithThisPage (hoje Manila), da Userland. Estes sistemas gratuitos ou de baixo custo, facilitaram a disseminação da prática do weblog, por dispensarem conhecimentos técnicos especializados e agregarem, num mesmo ambiente, diversas ferramentas para uso nos weblogs. Segundo Steven Levy, (citado por PAQUET, 2003), em meados do ano 2002 a quantidade de weblogs foi estimada em meio milhão. Em junho de 2003, a Blogcount, um weblog

58

todos os sites citados encontram-se nas referências.

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que monitora a blogosfera, calculou em mais um milhão e meio o número de weblogs no mundo, isto é, o triplo. Em maio de 2004, a mesma Blogcount divulgou uma estimativa que prevê 10 milhões de weblogs publicados até o final de 2004. Este intenso crescimento ampliou e diversificou o campo de atuação dos weblogs, que passaram a ser usados com vários propósitos diversos dos originais.

6.5 CARTOGRAFIA DE UMA PUBLICAÇÃO NA WEB

Os weblogs, na sua forma original, se caracterizam por:

serem páginas editadas por uma só pessoa, eventualmente, por convidados;

Há muito tempo que não coloco nenhum comentário aqui no "Um Novo Tempo", depois do recesso tiveram muitos trabalhos para ser feitos na faculdade, e agora, dando uma olhada no meu blog vejo que deixei ele muito de lado, pois ainda nem tirei o Papai Noel que cai da chaminé e tenho que colocar os links. [Camila, 04/02/2004, Um Novo Tempo]

possuírem estrutura hipertextual, permeada de links;

Josevânia, do NTE de Rondonópolis, planejando um curso sobre o uso educacional de weblogs, encontrou o [bloglab], leu o post sobre a inauguração do argumento, comentou e foi conferir. Eu, lendo os comentários dos blogs pelo SharpReader (é... agora dá, com os comentários pela haloscan), li os comentários da Josevânia, tanto no [bloglab] quanto no argumento, respondi por email ao primeiro e, no comentário mesmo, ao segundo. Tudo isso acabou gerando o post anterior. [Suzana, 22/03/2004, [bloglab]]

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utilizarem textos geralmente sucintos, em blocos padronizados;

Figura 1 - post do blog Um Novo Tempo

possuírem acesso público e gratuito ao conteúdo da página;

serem relatos pessoais, partindo de um ponto de vista próprio;

Continuo irada... O conhecimento e a ciência não são neutros. E isso não só do ponto de vista onde aquele que produz conhecimento tem uma teoria, com a qual lê o mundo, mas também e principalmente, desde o seu lugar de classe. É por isso que quando falamos por exemplo, na transparência da universidade, de suas ações, ou quando enquanto professores nos posicionamos dessa ou daquela maneira, o fazemos desde uma posição de classe. E por mais que discursemos, é na verdade a forma como articulamos esse nosso discurso com nossas ações que demarcam nossa coerência, engendrando uma práxis. [...] [Mara, 30/01/2004, Nina]

serem contextualizados e interpretados por comentários;

Acho que agora passarei a aproveitar mais os benefícios de ter um blog... podendo escrever o que me vier à cabeça... pois o que quero neste espaço é discutir a minha vida, me fazer entender, poder registrar meus vacilos, interesses, formas de pensar... Assim, quem sabe, este não se torne um bom exercício para me ver de fora para dentro, de fora para fora, e não apenas de dentro para dentro (se é que isto é possível!!!). [Vivi, 21/03/2004, Práticas de Vida]

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...comentários:

... exotopia :) Blogs tem tudo a ver com Bakhtin [...] [Su, 23/03/2004] Su Este autor eu queria ler, não sei nada sobre ele. Quem sabe não consigo logo? É que são tantas coisas que precisamos... é difícil dar conta. [...] [Vivi, 24/03/2004] É legal olharmos um pouco para nós mesmos e, principalmente, rirmos de nossas proprias mancadas...sei lá, mil coisas. [...] [26/03/2004, externo] MUITO TRI O SEU BLOG Entra lá no meu tem VARIAS COISAS LEGAIS, [...] [03/04/2004, externo] Vivi: Teu Blog está cada dia mais superrrr!!! [...] [Mara, 04/04/2004]

serem atualizados diariamente ou até várias vezes por dia;

Nair! Parabéns pela estréia no blog. Qusetionamentos nunca são demais! São sempre o que nos ocorre na leitura de um texto! É como se nos fosse possível conversar com o autor e percorrer os caminhos que ele abre para si e para nós enquanto leitores. Quando falamos em reler, como um ler de novo, podemos incursionar no pensar deixado por outros. [...] [Carmen, 10/11/2003, 11:51, [zaptlogs]]

...em seguida: Desculpem o engano! O meu último post estava destinado para outras pessoas!!! Olhem só os enfrentamentos das ignorâncias quanto às tecnologias! [Carmen, 10/11/2004, 11:56, [zaptlogs]]

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terem as postagens exibidas em ordem cronológica reversa;

Figura 2 - post do blog Prática Educativa.

terem as postagens mais antigas arquivadas permanecendo um link de acesso;

serem intertextuais e interdependentes, possuindo ligação com outros textos.

Lendo o Zaptlog, em especial o post da Mara, me dei conta de como é legal o hipertexto. Fiquei com uma vontade louca de fazer um também! No próximo post vou arriscar a construir um. Será que vai dar certo? Acho que sim...Ah!! ja sei! Vou fazer um hipertexto da visita que fiz no Iterra! [Daisy, 12/12/2003, Amor é fogo que arde]

O usuário cadastrado num serviço de weblog, utilizando seu ‘nome de usuário’ e sua ‘senha’ conecta-se ao servidor e ao aplicativo (software) que é o ambiente de criação, edição e publicação de seus weblogs. Cada weblog criado recebe um endereço do tipo http://www.servidordeweblog.com/nomedoblog, por exemplo.

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Figura 3 - interface de edição de um weblog .

Este ambiente possui comandos simples, semelhantes aos dos editores de texto, que permitem ao usuário escrever, formatar, corrigir e publicar textos, hipertextos e hipermídias que serão apresentados no endereço do weblog. Cada texto chama-se post e, geralmente, vem acompanhado da data e horário de postagem e de um link para acesso direto e permanente para aquele texto específico. Após a publicação, parece-se com, por exemplo:

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Figura 4 – projeto Relendo Clássicos PPGEDU / UFRGS

Diferentemente do ambiente de edição, esta página pode ser visualizada por todos que souberem seu endereço, como qualquer página da web. Todas as configurações de um weblog são abertas a alterações de seu autor e de todos a quem ele autorizar. Pode ser alterado o nome, o endereço, a descrição, a forma de publicação, a periodicidade dos arquivos e até a aparência visual da página, seu formato, cores, imagens etc. Desta forma, o ambiente em si provoca o interesse na construção de conhecimentos que possibilitem efetuar as modificações desejadas. Potencial de autoria e autonomia que mobiliza para a aprendizagem e cresce com a apropriação dos conhecimentos necessários, conforme os resultados desta investigação.

Oi pessoal estou voltando, e pedindo sugestão de cores para o "Tempos de Felicidade" não aguento mais aqueles rosas, quero agora um blog adulto igual o da Daisy. [Camila, 18/11/2003, quando o Um Novo Tempo se chamava Tempos de Felicidade]

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Bem, após erros, tentativa, a luz que apagou, finalmente consegui arrumar o blog. Continuarei a testar cores até achar algo que realmente me agrade. [Mara, 19/10/2003, Nina]

Atualmente, o formato weblog, vem sendo usado para inúmeros outros tipos de publicação, tais como: diários pessoais, páginas temáticas, diários de pesquisa, ambientes colaborativos, clipping jornalístico etc. De publicação praticamente individual passou a assumir, também, a forma de publicação em co-autoria. A leitura e a troca de comentários entre blogueiros fez com que se constituíssem verdadeiras comunidades de weblogs interligados. Hoje existem ferramentas que incluem links no weblog, conforme o usuário navega na www e escolhe. Assim, formam-se verdadeiros anéis, webrings, de blogs que se comunicam e se referem mutuamente. As ferramentas de edição se aperfeiçoaram, passando a disponibilizar novos e maiores recursos de edição e de comunicação. A possibilidade de debate e troca de idéias, por exemplo, vem sendo implementada pela criação de serviços de comentários59, que disponibilizam, por meio de um link junto ao texto postado, a leitura e postagem de comentários, por qualquer pessoa. Este incentivo ao contato gera intensos debates que se espalham envolvendo inúmeros blogs, durante um certo tempo. Existe toda uma criatividade circundando a idéia dos weblogs. Ferramentas novas vão sendo criadas, como, por exemplo, editores de html que ampliam as possibilidades de edição e personalização das páginas. O wbloggar60 (Figura 5),

59

Alguns weblogs já vêm com a possibilidade de comentários incorporada. Para os que não dispõem, existem serviços gratuitos ou não que podem ser adicionados. 60 Aplicativo de código aberto de Marcelo Cabral, disponibilizado gratuitamente.

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além de fazer a edição dos textos a serem postados, permite editar o próprio desenho da página e publicar, sem que seja preciso entrar no servidor de weblogs.

Figura 5 – wbloggar, imagem capturada da tela da autora

A troca de informações vem sendo facilitada e intensificada por meio da adoção pelos blogueiros de protocolos como o RSS (Rich Site Summary ou Really Simple Syndication) ou o Atom, baseados em linguagem XML61, que resumem o conteúdo mais recente de uma página numa forma que possa ser capturada e lida por um aplicativo ou site agregador de notícias. Os blogs rssficados62 apresentam um endereço que pode ser copiado e adicionado como novo canal de informações no agregador de notícias. A tendência a agregar conteúdo continua com os trackbacks, que buscam e publicam em um weblog as referências ao post que aparecerem em outros weblogs.

61

XML: Extensible Markup Language é uma metalinguagem, que é usada para definir outras linguagens de programação. 62 Expressão que informa que um site ou blog está estruturado de modo a ter seu conteúdo capturado pelos agregadores de conteúdo.

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A blogosfera, contudo, não perde suas raízes no mundo material e incrementa os contatos locais, além dos globais, por meio de ferramentas que mapeiam o ciberespaço dando visibilidade aos contatos mais próximos, como o GEOURL63 , ao mesmo tempo em que nos situam e dão voz no espaço global – GEOBLOG 64. O GEOURL mapeia as coordenadas de latitude e longitude integradas ao código do blog ou página e nos possibilita listar todos as páginas situadas num raio de 500 milhas desta localização. O GEOBLOG65 captura, localiza e publica num enorme mapa mundi a localização do blog e cada post que for adicionado.

Figura 6 - capturada de http://brainoff.com/geoblog/ em 17/04/2004 às 13h:05min.

A maioria das conexões a internet estão situadas na América do Norte, mais precisamente nos Estados Unidos, e a maioria dos blogs também se encontra lá. E é construído lá o pensamento que se torna hegemônico e que direciona a internet e seus usos. 63

mais informações em http://geourl.org/ mais informações em http://brainoff.com/geoblog/ . Hoje, além de quem está onde o GEOBLOG mapeia quem lê quem, através das subscrições de RSS de cada um. 65 Foi esta ferramenta que inspirou o texto de introdução desta seção: Viajando na Blogosfera. 64

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O quê os weblogs podem trazer para a educação e a pesquisa? Os weblogs vêm se consolidando como ambientes de construção cooperativa do conhecimento e, por conseguinte, muito usados em projetos educacionais. No Brasil, existem pouquíssimas iniciativas neste sentido. Ao iniciar este estudo encontrei apenas um ou dois projetos educacionais usando weblogs, porém, nenhum deles em atividade. Todavia, nos Estados Unidos, Inglaterra, Canadá e Espanha, principalmente, existem diversos projetos utilizando weblogs como ambientes de aprendizagem. Por exemplo, Weblogs at Harvard Law, é um weblog colaborativo da Harvard Law School da Universidade de Harvard, em Cambridge, Massachusetts. Em fevereiro de 2003 eles publicavam que estavam entusiasmados “em como esta tecnologia pode ser usada em todas as atividades da universidade” (2003, tradução minha). Penso

que

os

weblogs,

usados

em

projetos

educacionais, podem

desencadear entre os participantes o exercício da expressão criadora escrita, artística, hipertextual. Pela sua estrutura, permitem o exercício do diálogo, da autoria e co-autoria, inclusive na alteração da própria estrutura. Eles possibilitam, também, o retorno à própria produção, a reflexão crítica, a re-interpretação de conceitos e práticas. Professores e alunos, parceiros de aprendizagem, podem retroagir sobre seu trabalho, revendo etapas e processos, tomando consciência de sua prática. O weblog registra de forma dinâmica todo o processo de construção do conhecimento e abre espaço para a pesquisa. Deste modo, os weblogs contribuem para a consolidação de novos papéis para alunos e professores no processo educativos, com uma atuação menos diretiva

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destes e mais participante de todos. Uma parceria num processo em que todos ensinam e aprendem (FREIRE, 2002ab). Os weblogs registrando todas as fases de um projeto: sua criação, seu detalhamento e desenvolvimento até sua finalização,

possibilitam o ensino-

pesquisa, facilitam a implementação de projetos inter e transdisciplinares, dando visibilidade, alternativas interativas e suporte a projetos que envolvam a escola como um todo e, até, as famílias e a comunidade. Porém, numa sociedade capitalista, onde o conhecimento é tratado dentro da lógica do lucro e da apropriação privada do que é socialmente produzido, o uso da tecnologia pode vir a reforçar esta direção. Os weblogs, como tecnologia emergente que já sofre a ação da organização social e do pensamento dominante, sob estes, podem se transformar em excelentes meios de apropriação do conhecimento e, disso, já se deram conta as grandes corporações. Os k-logs são weblogs usados em KM – Knowledge Management, ou gestão de conhecimentos. São utilizados como suporte para gerenciar conhecimentos dentro das empresas. Blogando os trabalhadores deixam registrado suas descobertas, seus fazeres, sua experiência, compartilhando-os no interior da empresa e deixando-os como herança na sua saída. Segundo John Robb (2002), “organizados, os k-logs proporcionam um arquivo permanente de todo o conhecimento postado. Empregados podem ir e vir, mas seu conhecimento permanece” (tradução minha). Aqui, podemos discutir a possibilidade ou não de logar conhecimentos. Acredito que fiquem registradas informações, saberes, percursos, técnicas, que podem servir de guia para construir conhecimento ou podem, também, serem objetivados em aplicativos, em manuais ou em máquinas. Porém, não é possível gravar o conhecimento, se entendermos este como tornar o

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objeto cognoscível de uma coisa em si em uma coisa para si (KOSÍK, 1976). Todavia, permanece a apropriação de algo que era do trabalhador, o conhecimento tácito, que é excedente à relação trabalhista e, também, o espaço aberto à possibilidade do controle e da coerção. Estas e outras possibilidades e contradições foram emergindo e se tornando mais claras a medida em que eu me aproximava dos weblogs e considerava inserilos num projeto educacional.

6.6 O [ZAPTLOGS]

Meu interesse nos weblogs iniciou quando intuí que poderiam ser utilizados na educação. Em 2002, desenvolvendo minhas atividades como professora na faculdade, andava a procura de um ambiente que fosse fácil de utilizar e que não necessitasse de servidores e suportes específicos. Algo que pudesse ser usado sem a necessidade de muitos conhecimentos técnicos e que pudesse ser acessado ou reproduzido onde houvesse um computador com conexão à internet. Na época, desenvolvia um trabalho utilizando listas de discussão com professores e alunos, porém constatava pouco envolvimento e participação do grupo. A maioria dos participantes não tinha interesse mais do que informativo e as discussões na lista eram poucas. Na disciplina de Estágio Supervisionado, na qual eu integrava a equipe de quatro professores/supervisores, desenvolvi uma página da disciplina, contendo informações gerais, agenda, documentos, cronograma, links e

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um espaço para textos. Não era um site interativo, mesmo que operasse em conjunto com a lista de discussão. Foi neste contexto que planejei uma experimentação a ser feita com os estagiários, usando os weblogs. Como supervisora, eu trabalhava semestralmente com uma média de 10 a 20 estagiários, que desenvolviam suas atividades de estágio em educação física em escolas de ensino fundamental e médio. A idéia era que tivéssemos um weblog do grupo e weblogs individuais para desenvolvimento e acompanhamento de algumas das atividades do estágio. Em certos aspectos, uma inovação em relação aos relatórios de estágio tradicionais e à própria atividade de supervisão e orientação.

Figura 7 – post em http://esefipa.blogspot.com

Como é possível ver, por uma das minhas inserções iniciais, a interatividade potencial do ambiente e do trabalho ainda era subestimada pelo uso da palavra mural. Infelizmente, esta minha primeira experiência no uso educacional dos weblogs não passou dos planos e primeiros encontros, pois deixei de trabalhar na faculdade pouco tempo depois.

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Conforme continuei usando pessoalmente os weblogs, uma decisão que tomei no início do projeto na faculdade, fui aprendendo seu manejo e criação e fiquei cada vez mais certa de que este ambiente possibilitava desenvolver algumas das minhas idéias sobre a inserção da tecnologia no trabalho e na formação de professores, dentro das concepções teóricas que formulo nesta dissertação.

Daqui a duas semanas será a qualificação da minha proposta de mestrado. Talvez, então eu possa voltar um pouco ao mundo dos vivos. Pelo menos, de outros vivos :) Na corrida, andei reformulando a abertura da minha página, mas só na forma. O conteúdo fico devendo. [Su, 31/05/2003, Onde anda Su?]

No projeto de mestrado, deixei para incluir os weblogs apenas na apresentação do projeto, deixando-os fora do texto. Isso foi feito seguindo a orientação de preservar a novidade do tema. Uma posição, de

certo modo,

contraditória em relação à idéia de pesquisa aberta e compartilhada que, na ocasião, ainda não se apresentava de modo claro para mim. Naquela época, já se delineava o ambiente principal do projeto.

Faz mais de um ano que venho pesquisando sobre as possibilidades do uso de weblogs, principalmente o seu uso na educação. Não encontrei quase material nacional sobre o assunto, até porque o uso de tecnologias educacionais informatizadas na educação é relativamente recente e muito restrito a laboratórios e núcleos de pesquisa. Agora, com a minha linha de pesquisa já bem definida, resolvi compartilhar o material que venho acumulando e os projetos realizados ou idealizados :) A idéia é ir colocando aos poucos o material que já disponho, junto com material novo que vou garimpando. No último ano o uso de weblogs e a atenção sobre eles cresceu geométricamente e acredito que crescerá muito mais. [Su, 09/06/2003, [bloglab]]

139

Penso ser importante explicitar os motivos e a teoria que sustentam a minha opção por construir um ambiente virtual de aprendizagem utilizando weblogs, inclusive a escolha de serviços de weblogs simples e gratuitos e a proposta de construção artesanal do ambiente. Uma das principais dificuldades encontradas nos programas de formação de professores para o uso das TEI é a quebra de continuidade no uso dos conhecimentos, equipamentos, ambientes etc., que acontece após o encerramento do curso ou processo de formação. Existem muitos relatos, formais e informais, que dizem que os professores não aplicam os conhecimentos construídos nos cursos de capacitação. Que o seu envolvimento nas TEI decresce e deixa de existir após a formação. Sem desconsiderar os motivos que se relacionam com as condições de trabalho, tanto de ordem material quanto de ordem político-administrativa e situando nos aspectos de possibilidade relativos ao professor e seus conhecimentos, podemos dizer que um dos motivos pelos quais os projetos se encerram logo após os cursos de formação diz respeito à não apropriação por parte do professor do que foi vivenciado / experimentado durante o curso. Na realidade, não há construção de um conhecimento que possa ir além do uso vivenciado no curso de formação, que faça sentido e que possa ser transformado e replicado em outro espaço e contexto. Isso aponta para um caráter de treinamento e não de formação no processo. Treinamento para o uso e não para a criação. Treinamento que não faz sentido, que não “é uma resposta a uma pergunta” (BAKHTIN, 2000, p. 388) e que não é “criação, no homem, do correspondente sentido, graças ao qual ele pode compreender o sentido da coisa.” (KOSÍK, 1976, p. 29)

140

Por outro lado, dependendo das TEI utilizadas na formação do professor, do tipo de ambiente e das alternativas oferecidas, fica inviável construir qualquer projeto a partir delas.

Por exemplo: formações realizadas utilizando ambientes virtuais

proprietários66 e que necessitem tecnologia avançada, que não serão possíveis de encontrar nas escolas. Weblogs do tipo utilizado neste trabalho são ambientes simples, não necessitam de hospedagem em servidor próprio, são abertos à intervenção e componíveis com outros ambientes como chats, fóruns e listas de discussão. Podem ser usados em qualquer computador com conexão à internet. Não são ambientes estáticos, com formato definido. Podem ser construídos e modificados segundo as necessidades de professores e alunos, autores e organizadores do seu espaço.

[...] Alguns amigos, companheiros de internet, costumam dizer: "A revolução não será televisionada." Porque a revolução não vem do que se costuma chamar centro, do que se tem por oficial. A transformação da praxis humana vem dos "puxadinhos" (outra expressão que costumo ouvir naquele grupo) que construímos aqui e ali. Um blog, como espaço individual ou coletivo de expressão, pode dar voz a quem não tem. Gratuitos, construidos com rudimentos de tecnologia, acessíveis aos não técnicos, são os 'puxadinhos'. Uma favela expressiva que se ergue ao redor e além da midia oficial. Paraíso do ego? Mas, também, voz para os movimentos sociais, espaço de aprendizagem. Mas ainda um espaço restrito aqueles que tem acesso a www. E somos poucos. [Su, 09/01/2004, [bloglab]]

[zaptlogs] foi o nome escolhido para o projeto, que é

parte desta

investigação. Assim mesmo, com os colchetes, no melhor estilo internético. O [zaptlogs] acontece num ambiente virtual de mesmo nome construído utilizando a tecnologia dos weblogs a partir de recursos disponíveis gratuitamente na web.

66

A utilização destes ambientes implica pagamento de licenças, contratação assistência técnica e manutenção onerosas.

141

O serviço adotado foi o do Blogger67, pelas alternativas de possibilidade de hospedagem que oferece. Ele não necessita de servidores com suportes especiais para hospedar as páginas. Deste modo, pude hospedar os arquivos num espaço pessoal68, onde estariam acessíveis para cópias de segurança e a adição de outras páginas relacionadas ao projeto. O ambiente, cuja primeira versão construí em março e abril de 2003, foi se estruturando durante a fase final da proposta de dissertação e o início da organização do grupo participante.

Figura 8 – [zaptlogs] em março-abril/2003

Em junho, a proposta de dissertação foi aprovada e, posteriormente, foi apresentada em atividades do TRAMSE e da UFRGS. Assim, o [zaptlogs], weblog colaborativo do projeto, começou sua trajetória. 67

http://www.blogger.com, do Google. É possível hospedar as páginas no próprio servidor do Blogger, caso não se disponha de hospedagem pessoal. 68

142

O [zaptlogs] disponibiliza os meios e o apoio para a possível construção de uma comunidade de pesquisadores que, ao mesmo tempo em que desenvolvem seus

projetos

de

pesquisa,

interagem

colaborativamente/cooperativamente

aprendendo e inserindo as tecnologias educacionais informatizadas no seu trabalho. Os sujeitos de pesquisa visados comporiam um grupo de seis a dez educadores ligados à UFRGS que estivessem realizando investigações em educação. Os principais alvos foram os professores do próprio TRAMSE, núcleo da linha de pesquisa a qual pertenço. Feito o convite e apresentado o projeto, surgiram inúmeros interessados, muito mais do que o número pensado inicialmente. Reduzi a divulgação a este grupo e procurei privilegiar os professores e alunos da pósgraduação. Para minha surpresa, a grande maioria desistiu antes do início e na fase inicial do projeto. As razões foram variadas, mas dignas de reflexão. A principal foi a falta de tempo de dedicar-se ao projeto. No meu interesse por focalizar um determinado grupo, não levei em conta as circunstâncias que descrevi na minha própria proposta. Num contexto, onde o tempo-espaço se contrai em todas as esferas e a produtividade cada vez mais é requerida em termos puramente quantitativos, os prazos diminuem enquanto crescem as exigências e as demandas sobre estudantes e professores. A jornada de trabalho, há muito invadiu o tempo livre de todos e, deste modo, cada fração de espaço-tempo é avaliada e priorizada dentro das necessidades de cada um. As TEI, se por um lado facilitam a execução de inúmeras tarefas, por outro, exigem do educador o atendimento de outras, em respostas as próprias solicitações para as quais a tecnologia abre espaço. O projeto iniciou com dezoito participantes, dos quais dezesseis professores e professoras e duas alunas da graduação em Pedagogia, todos ligados à pesquisa e

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todos com pouca ou nenhuma experiência no uso das TEI. Começamos interagindo por meio de uma lista de discussão69 criada no Yahoo Grupos, que é um serviço gratuito que disponibiliza ambientes virtuais para a criação de grupos. Foi um começo hesitante, onde se evidenciavam algumas dificuldades que, segundo minha experiência e a de diversos autores70, são freqüentes em projetos que envolvam interação em ambientes virtuais. Principalmente a dificuldade de estabelecer uma comunicação efetiva. De um modo geral, a maioria das pessoas subutiliza a comunicação por correio eletrônico, e os professores não estão fora deste panorama. O acesso e a manutenção das caixas postais é feito com pouca e irregular freqüência: mensagens são recebidas com atraso ou não são recebidas por falta de espaço na caixa postal, mensagens são automaticamente deletadas por erros de configuração, além de outras dificuldades ligadas ao uso do computador em geral. Após algum tempo de interação, fiz na lista de discussão a seguinte pergunta: Por que não respondo e-mails dos grupos dos quais faço parte, mesmo quando eles solicitam claramente um retorno?

Não respondo e-mails por vários motivos: não possuo o hábito, prefiro só lendo, as vezes eu respondo... mas as vezes deixo para responder depois e acabo esquecendo. Participo de outros grupos de discussão e escrevo pouco, e no Zapt me sinto insegura, pois não conheço quase ninguém do grupo. [Fernanda] Na maioria das vezes é falta de tempo e/ou de um computador disponível, mas em outras é preguiça mesmo. Agora que comecei a entender como se faz e como se manda as mensagens começarei a participar mais. [Sônia]

69 70

Mais informações na página da lista: http://br.groups.yahoo.com/group/zapt/ ou no apêndice D. Ver alguns tópicos da revisão de literatura no apêndice C.

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Via de regra procuro manter uma disciplina de verificar a correspondência e na medida do possível respondê-la. [...] O que me faz deixar de responder é suspeita em relação ao que as vezes chega, me atrapalhar com alguma pergunta ou , o que agora é mais raro, esquecer. [Mara]

As dificuldades técnicas se somam a insegurança e a falta de hábito em lidar com esta forma de comunicação que, para alguns educadores é nova e pouco acessível. Uma justificativa que não apareceu, mas que já observei em diversas outras listas de discussão das quais faço parte, é a de não responder por não lhe ser diretamente dirigida a mensagem. 71 Alguns participantes de lista não compreendem que as comunicações são entre todos e só respondem mensagens onde são literalmente chamados a responder. Axt e Maraschin (1999), relatando uma experiência de formação de professores à distância, avaliam as principais dificuldades surgidas no processo de interação e identificam os restritores mais importantes. Mesmo se tratando de um curso onde a comunicação com os professores foi somente virtual, posso registrar algumas similaridades com o processo inicial de interação com os educadores participantes de minha investigação. O primeiro diz respeito à distância física entre professor-aluno que contraria a relação habitual de transmissão oral de conteúdos. Isto e a ausência do movimento e ruídos característicos das salas de aula, inibe a participação, criando uma barreira silenciosa que muitos custam a romper. Este silêncio é devido, também, a necessidade de usar a escrita como forma de comunicação.

71

Se, numa mensagem à lista, alguém pergunta: - Haverá aula amanhã?, muitos não respondem, mesmo sabendo a resposta e não tendo ninguém respondido. Respondem apenas se perguntarem: Fulano, haverá aula amanhã? Este tipo de postura é bastante encontrado em grupos de discussão e reflete o nosso despreparo em cooperar/colaborar/compartilhar.

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Porque me sinto muito mais a vontade em escrever num blogger do que em qualquer outra coisa. Por que? - Que magia este ambiente provoca que nos incita ( é assim que se escreve?) a escrever? [Daisy, 15/10/2003, [zaptlogs]]

Outra coisa importante e nem sei como começar a escrever é sobre os grandes intervalos de silêncio que acontece no meu blog. Para mim tem sido muito difícil a relação com a máquina e são vários os aspectos que pertubam, por exemplo, meu blog " amor é fogo que arde.." estão escritos várias coisas lá, mas parece que eles não tem identidade, não se parece comigo, não sei se é por que fico preocupada com o conteúdo da minha escrita [...] [Daisy, 18/05/2004, [zaptlogs]]

O silêncio é recorrente e, a cada desequilíbrio, pode surgir e permanecer até que comece a se engendrar uma nova dinâmica de ação. Os posts acima, mostram que o silêncio de Daisy aconteceu no décimo primeiro mês72 de participação no projeto, contrastando com sua disposição no quarto mês. Este silenciamento coincidiu com a necessidade de aplicar os conhecimentos desenvolvidos numa situação concreta de seu trabalho como monitora, levando-a a por em xeque suas certezas e conhecimentos.

Superando as primeiras dificuldades, prosseguimos nesta fase inicial quando, ainda no mês de julho, os participantes reduziram-se a dez, sendo oito professores e professoras e duas alunas da graduação. No decorrer do projeto, continuou havendo uma certa flutuação entre desistências e adesões, o que foi considerado nas análises feitas na investigação. Neste período, foram criadas, também, algumas páginas anexas com conteúdo menos dinâmico: a equipe e a biblioteca, a primeira

72

A primeira fase do projeto aconteceu de Julho/2003 à Dezembro/2003. Na segunda fase, de Janeiro/2004 à Julho/2004, cessaram as oficinas, sendo mantido o ambiente e o apoio nos projetos individuais e coletivos.

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contendo os participantes do projeto e formas de contato e a segunda contendo uma coletânea de links e recursos relativos ao projeto. Por meio de um questionário com perguntas abertas e fechadas73 obtive informações gerais dos participantes sobre o nível de conhecimento e envolvimento que têm com as TEI, suas expectativas em relação ao projeto e suas intenções de pesquisa. Em conjunto com o grupo e com apoio nos dados levantados na sondagem, foi construído um plano de trabalho incluindo os principais objetivos e conteúdos relativos as TEI, cujo roteiro geral se encontra no apêndice B. Este plano, foi sendo construído e levado a efeito nas atividades presenciais semanais e nas atividades virtuais. Os educadores que iniciaram o [zaptlogs] são, em sua maioria, mulheres com formação em nível de graduação, na faixa etária dos quarenta aos cinqüenta anos. Esta disposição modificou-se ao longo do projeto com a adesão de mais educadores na faixa etária até 35 anos e desistência de educadores na faixa dos 40 anos em diante.

Esta variação modificou, também, o nível de formação do grupo,

aumentando o número de participantes graduados e diminuindo o número dos especialistas.

Além disso, a partir de setembro, a composição do grupo ficou

unicamente feminina. A maioria dos participantes utiliza o computador em casa e no trabalho, porém somente a metade utiliza a internet no trabalho. Realizam bem as atividades básicas no computador: ligar, desligar, usar o mouse, executar aplicativos, gerenciar pastas. Em relação aos conhecimentos no uso de aplicativos, ambientes, meios e recursos do computador ou da internet, o nível alto de conhecimento aconteceu

73

No apêndice A apresento algumas características dos educadores participantes da investigação conforme foram tabulados os dados obtidos dos questionários de sondagem. Apresento, também, o questionário de perguntas abertas e fechadas aplicado ao grupo.

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apenas nos meios considerados os mais populares entre professores: o editor de textos, os sistemas de busca, o correio eletrônico e tecnologias de comunicação síncrona. Em relação ao correio eletrônico, embora os participantes registrem ter conhecimentos altos e acima da média sobre o seu uso, a metade dos educadores não o usa ou usa pouco, como pode ser visualizado no gráfico abaixo.

Uso do correio eletrônico Nunca 13%

Muito 25%

Pouco 37% Regular 25%

Figura 9 – gráfico sobre o uso do correio eletrônico.

Em relação ao uso das TEI na prática educativa, os dados coletados mostram que quase a metade dos educadores utiliza pouco ou nunca utiliza nenhuma das tecnologias listadas nas suas aulas ou no seu trabalho, em geral. Esta questão provê um espaço onde os professores podem listar outras tecnologias utilizadas, todavia nenhuma foi adicionada. Detalhes sobre estes dados podem ser observados no apêndice A.

Da reflexão durante o planejamento, surgiu a idéia de separar um espaço onde seriam colocadas as atividades previstas para cada encontro. Para isso, criei um outro weblog onde seriam postados o roteiro, os conteúdos e recursos para os

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encontros, de modo a facilitar o acesso a estas informações. O weblog foi chamado de [zaptlogs-ativ] e linkado ao [zaptlogs]. Este movimento sugeriu a mim e ao grupo a possibilidade da constituição de uma rede de weblogs interligados atendendo a um mesmo projeto. E, também, da utilização de posts específicos como links para páginas editáveis facilmente.

Figura 10 - [zaptlogs] – link Atividades. Notar o acréscimo de links em relação à Figura 8.

Figura 11 - vista do [zaptlogs-ativ]

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Esta foi uma das primeiras modificações que sofreu o ambiente inicial em função do desenvolvimento do projeto. Mais tarde, outras modificações foram sendo feitas, sempre atendendo ao movimento do projeto. Cada uma destas modificações e as novas ações que elas mobilizavam retroagiam sobre a totalidade do projeto reorganizando-o. Pode-se entender, aqui, que o movimento gerado pelas interações tornava instável o processo, desequilibrando-o e conduzindo-o a um ponto de bifurcação, onde uma nova ordem se estabelecia re-equilibrando o sistema (PRIGOGINE, 1996, 1997). A auto-organização foi uma característica presente durante todo o projeto, tanto na forma do ambiente virtual quanto na dinâmica das atividades e interações. Iniciamos os encontros, formalmente, em nove de julho de 2003, quando firmamos a reserva do laboratório de informática para uso quinzenal, nas quartasfeiras à tarde. Estabelecemos, então, uma agenda de encontros semanais com o planejamento adequado às situações com e sem laboratório. Para o nosso primeiro encontro, que pela agenda deveria ser sem uso do laboratório, conseguimos driblar esta restrição usando alguns computadores cedidos em outro laboratório. Iniciamos com uma visão geral sobre a internet e os ambientes virtuais, chegando aos weblogs. O plano e roteiro traçados, foram subvertidos pelo contexto do encontro, o que foi uma ocorrência constante em todo o projeto.

Voces não vão acreditar, mas eu consegui, embora não lembre bem como fiz, chegar aqui!!!! Estou muito contente. Um grande beijo a todos. [Mara, 11/07/2003, [zaptlogs]

Desde o início do projeto, além dos encontros semanais optei por fazer um plantão presencial semanal, onde poderia esclarecer dúvidas e auxiliar em tarefas específicas. Este plantão acontecia nas terças-feiras, das 12 às 14h. Alguns blogs

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individuais foram criados antes mesmo do início oficial dos encontros, por solicitação dos participantes, a partir dos plantões e do material disponível no [zaptlogs]. Por outro lado, não havia uma imposição para a criação e manutenção de um blog e, assim, os educadores foram criando os seus, conforme o seu interesse, sendo que alguns optaram por não criar blogs ou os abandonaram depois de algum tempo.

Penso que criei um blog. Espero que dê certo [Eunice, 09/07/2003, thebestlog]

Bem-vindo ao mundo dos sabidos da rede academica. [Alberto, 30/07/2003, todos sabem]

Estou começando e ainda não sei nada !!! [Lenice, 18/08/2003, 100chance]

Finalmente a criança est? documentada. Tem certid?o de nascimento! Agora, é s? jogar-se na vida. [Mara, 30/07/2003, Nina]

OI! Hoje é a fundação deste blogger. Sejam bem vindos! [Vivi, 11/12/2003, Práticas de Vida]

De início, quase todos utilizavam a postagem como forma de comunicação direta, semelhante ao correio eletrônico. Porém, as diferentes formas de mobilização da cognição e as diferentes relações com informações e conhecimentos, que os ambientes virtuais proporcionam, geram reações contraditórias. Ao mesmo tempo em que geram entusiasmo e até júbilo ao serem vencidas as dificuldades, podem gerar insegurança e a sensação de estar perdido. E, isso, aconteceu com a maioria dos educadores participantes.

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Suzana, ao ler o que foi escrito no primeiro e último blogger desta estudante inglesa, vejo que eu ainda tenho chance de aprender direitinho como mexer com ele e que no início, tudo que é novo parece difícil. Acho que esse depoimento serve como incentivo. [Camila, 22/08/2003, comentário no [zaptlogs]]

Já não lembro mais dos caminhos trilhados na semana passada. Assim descubro um novo caminho a cada vez. Volto ao LIES depois de 2 anos e redescubro que ainda tenho senha de acesso. Ainda, o quanto é difícil e dasafiador viver o papel do aluno. Viver o desconhecidop e dele se APROPRIAR! enquanto espero pela profe vou escrevendo as impressões que quero compartilhar com o grupo. [Carmen, 16/07/2003, [zaptlogs]]

Nas falas acima, como em algumas das falas anteriores, é possível notar a desorientação em relação aos ambientes e, principalmente, a confusão entre os diversos espaços: espaço de postagem de cada ambiente, espaço para comentários de cada ambiente, espaço de visualização de cada ambiente. Esta desorientação é bastante encontrada em iniciantes no uso de ambientes virtuais, bem como o receio de cometer erros ou inadvertidamente alterar alguma coisa. A tensão e a postura cautelosa, depois destas primeiras interações com os weblogs e com os desafios propostos, eram evidentes nas falas dos educadores e educadoras participantes.

Sabe Su, refazer os trajetos das tarefas é essencial e cada vez me dou conta disso. Consegui entrar aqui e em outro espaço, mas não sei exatamente como fiz. Preciso automatizar isso... [Mara, 11/07/2003, às 9:32, comentário no [bloglab]] ...em seguida: Su! Mandei um comentário em uma outra página dessas que fazem parte do projeto. Salvei e apareceu uma mensagem dizendo que o comentário seria registrado. Agora o problema é saber onde isso foi parar pois eu não localize a mensagem. espero que tanto esta quanto a outra chegue a seu destino. [Mara, 11/07/2003, às 9:38, comentário no [zaptlogs]] ... alguns dias depois: Estou meio chateada com minha demora em entrar na página certa. Faz mais de meia hora que estou na frente deste computador e só agora consegui chegar aqui. Entrei na página inicial da Faculdade e achei o B azul e entrei nele. Achei que entendi as instruções das atividades e fui indo. Acabei em um cadastro que pensei ser o que eu devia acessar e o

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preenchi. Aí, a máquina não aceitou e mandou eu ler as regras antes de continuar. Eta máquina inteligente! Eram muitas as regras,e como não sei inglês, demorei para entender alguma coisa. La pelas tantas apareceu uma tabela cheia de preços em dólares!!! Isso eu entendo. Sai rapidinho e desisti desta página. Com certeza não era a nossa. Voltei para as instruções da Pro Suzana e acabei aqui! [Mara, 17/07/2003, [zaptlogs]]

Curiosamente, procedimentos que no cotidiano dos educadores e educadoras participantes não seriam considerados dificuldade – como preencher um cadastro, por exemplo – nos ambientes virtuais assumem proporções de desafio. Contradições entre o analógico e o digital, no nível do pensamento, que gera desconfiança nos procedimentos nos quais parte do processo não pode ser concretamente acompanhada. Observei, também, a prevalência de uma postura de se reportar ao professor, como centralizador da aprendizagem e a inexistência de uma consciência do fato do blog ser uma publicação, como pode se constatar pelo uso da palavra mandar. Esta postura foi se modificando a medida em que todos começam a compreender o ambiente e as interações que nele ocorrem.

O blog deixa de ser apenas um

ambiente de comunicação semelhante ao correio eletrônico e começa a adquirir uma dimensão de publicação, que vai se manifestando na reflexividade dos posts e no alargamento da audiência. Outra constatação inicial, que foi confirmada posteriormente numa oficina com iniciantes em weblogs, foi a da predileção pela postagem de imagens74, tão logo esta possibilidade é descoberta. Isso abre espaço para a utilização de outros meios de expressão que não somente a escrita.

74

Isto pode ser observado no weblog usado na oficina - http://vamosblogarbr.blogspot.com, em 06/08/2003.

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Uma das minhas hipóteses é de que o blogueiro precisa estar seguro das técnicas do blogger, ou seja, saber usar todas as ferramentas disponiveis e, as imagens são o resultado de uma tecnica que ele "domina". Outra hipótese poderia ser a vontade de deixar seu blogger visualmente bonito, atraente. Diria ainda, que é muito mais fácil postar imagens que escrever! [Daisy, 11/08/2003, Amor é ...]

As imagens e os textos de autores consagrados, de certa forma, substituem o texto próprio que o participante não se autoriza a postar. A crítica necessária é a da possibilidade das imagens mediarem a relação social entre as pessoas. Isso seria o espetáculo, na visão de Guy Debord (1997), uma visão de mundo objetivada, uma realidade fragmentada, considerada “como objeto de mera contemplação” (DEBORD, 1997, p. 13). Esta última observação retrata um possível campo de estudo em relação aos weblogs e outras publicações dinâmicas. Hoje, já são populares os fotologs, que, além de álbuns de fotografias, aliados às câmeras digitais se constituem num espaço de uma expressividade fundada na imagem, onde as noções de público e privado são confrontadas. Para dar suporte a esta fase inicial, a ênfase recaiu sobre atividades que tinham como objetivo desenvolver a movimentação entre os diversos ambientes, a familiaridade e a regularidade no uso da tecnologia nas atividades de cada um e do grupo. Assim, por meio dos recursos tecnológicos, procurei incentivar uma rotina básica que incluía: verificar o correio eletrônico diariamente; postar no seu blog diariamente (ou pelo menos três vezes na semana) relatos, projetos, reflexões, leituras, links comentados etc; comentar o blog do grupo e blogs individuais75 duas

75

Esta interação não vinha de antemão garantida, pois os blogs individuais foram sendo criados no ritmo do interesse dos participantes. Além disso, poderiam ter ou não espaço para comentários. Esta possibilidade não vinha disponível no blog, mas poderia ser adicionada e demandava o interesse e a aprendizagem de como fazer esta adição. Os blogs do Blogger, versão gratuita, são básicos, mas passíveis de receber ferramentas adicionais como comentários, trackbacks, listas de links, RSS etc. Existe toda uma diversidade destes meios disponíveis gratuitamente ou a baixo custo na www.

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vezes na semana, no mínimo; na lista de discussão, responder, mandar mensagens, textos e assuntos gerais. Estas atividades, aparentemente mecânicas e lineares, geraram um movimento onde, a partir das ações individuais, da interação, do diálogo e das relações estabelecidas, emergiu um sentido sobre as próprias atividades e suas relações, um sentido construído socialmente. É neste aspecto que se pode pensar a auto-organização como emergência de comportamentos ou ações coletivas mais elaboradas a partir de ações mais simples e individuais, nos termos de Johnson (2003).

Ainda tô meio perdida no meio disso tudo... mas devagarinho vou me achando... desculpem a falta de criatividade.... [Paloma]

...comentários: Seja bem vinda Paloma!! Todas nós nos sentimos um pouco perdidas no inicio, mas aos poucos vamos nos encontrando... [Daisy, 15/10/2003] Se serve de consolação é normal ficar meio perdida no início. Mads seja bem vinda!!! Adorei o pensamento e o Garfild. [Camila, 15/10/2003] Também achei muito bonito, principalmente no dia de hoje, onde a maioria dos profissionais da educação é composta pelo sexo feminino. Beijos [Sônia, 15/10/2003] Seja bem vinda e parabéns pela entrada triunfal :))) [Suzana, 15/10/2003] Bem vinda e mãos a obra! [Mara, 16/10/2003]

Os comentários, como os exemplificados acima, conforme foram se incorporando nas práticas do grupo, se constituíram num espaço de possibilidade do diálogo e da cooperação. Além disso, trouxeram para o grupo a consciência da existência do outro, que se apresenta a nós em forma de texto (Bakhtin, 2000), e a

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consciência de serem parte de uma rede, onde novas vozes poderiam se somar ao diálogo, onde outros textos mesclariam os textos construídos. Os comentários seriam o espaço possível do diálogo que pressupõe a diferença e conserva as identidades dos que dialogam.

.....outras questões que me vem neste momento e que quero compartilhar com vocês: - Porque me sinto muito mais a vontade em escrever num blogger do que em qualquer outra coisa. Por que? - Que magia este ambiente provoca que nos incita ( é assim que se escreve?) a escrever? Alguem sabe a resposta? - Ahhh! Por que fico esperando com tanta ansiedade comentarios das coisas que escrevo? Porque? -Xiiiii quantos porquês... Que chata que eu estou hoje, né? [Daisy, 15/10/2003, [zaptlogs]]

...comentários: Concordo ABSOLUTAMENTE! Ah Ah Ah!!!! [Sonia 15/10/2003] Daisy: Sabe, eu também gosto de ver quando vocês me comentam coisas e tenhas certeza, que também fico esperando que isso ocorra. Afinal, como falei para Su, se escrevemos em um blog que sabemos outros podem olhar, não há como escrever sem levar em conta esta dimensão do outro. Isso, por sinal é saudável mas claro, que dentro de limites. Ou seja, sem fazer deste outro algo terrorifico. [Mara 15/10/2003] Olá Daisynha, já que tu estás tão ansiosa por comentários, aí vai o meu... Apesar de não ter a resposta para os teus questionamentos, acho que eles são muito pertinentes. [...] [Camila 15/10/2003] Uma tentativa: talvez porque o texto vá ou possa ir bem além dos textos que estamos acostumados a produzir. [Su, 15/10/2003]

Os comentários e a possibilidade de aportes externos ao grupo trouxeram a percepção de que a comunidade tem uma dimensão pública e que tende a se alargar na medida da interlocução com outros sujeitos. A rede de sociabilidades tende a fazer novas conexões e movimentar as existentes. De repente, aquele outro que não conhecemos adentra o nosso espaço e faz ouvir sua voz.

Muito obrigada pela indicação dos autores . Já fiz algumas leitura de Paulo Freire com Pedagogia do Oprimido, Pedagogia da Indignação e Pedagogia da Autonomia, mas o Bakthin ainda não li nada. [...] [Sonia, 07/12/2003, [zaptlogs]]

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... comentário externo: Bom dia! I hope my education blog "Prototype" will have some value for you. You're also welcome to visit my course blogs [...] [Crawford Kilian, 07/12/2003]76

Agora a pouco, olhando meu blog, fui surpreendida ao constatar que havia um comentário do Sérgio. O curioso, é que eu já havia lido este comentario e prá mim, havia sido a Suzana que o tinha escrito. Na verdade, eu vi o S inicial e concluí que era de Suzana. Como isso aconteceu? Bem, até agora, quando falavamos que o blog era público isso parecia claro, óbvio: ele podia ser lido, comentado, acessado por cada um de nós que participavamos do zapt. E isso era esperado, pelo menos por mim. Eu poderia partilhar com os "camaradas" do grupo reflexões, desabafos, preocupações... Eu poderia dizer coisas diziveis aos que me são próximos. Mas não é bem assim. Pela primeira deparei-me com a dimensão desse "público", e confesso que fiquei entre assustada e fascinada. Este público é aquele de que fala Hanna Arend, em Condição Humana! Esse fato, redimensiona pra mim algumas questões sobre os weblogs. Ao Sérgio77, agradeço a visita e a possibilidade de reflexão [Mara, 25/10/2003, Nina]

Para Mara e para os demais participantes a constatação da existência e da possibilidade da intervenção do outro, aquele que nos lê e que só percebemos pela sua intervenção, gerou uma nova instabilidade e desequilíbrio, implicando na necessidade de uma nova reorganização. Esta constatação, para alguns motivou um maior cuidado na linguagem e no conteúdo das reflexões publicadas e, para outros, levou a um período de silêncio e constrangimento. Um blog diferentemente de outros tipos de publicação, gera uma resposta quase que imediata do leitor que, ao comentar, se transforma em interlocutor, estabelecendo um diálogo onde estará presente, também, uma audiência que acompanha o diálogo estabelecido, podendo ou não vir a participar. Em relação à linguagem e ao sentido, tornam-se visíveis os conceitos bakhtinianos de dialogismo, polifonia, intertextualidade e da compreensão responsiva ativa/passiva a partir dos pólos de comunicação da emissão e da recepção. Em relação à leitura do mundo, 76

Muitas vezes, a colaboração vem de longe. Crawford Kilian é professor e escritor, em Vancouver, BC, Canadá. Edita, também o weblog Writing for the Web – http://crofsblogs.typepad.com/ . Mais informações em http://www.capcollege.bc.ca/dept/cmns/crofpers.html. 77 Sérgio Lima é professor de Física no Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro. Seu blog pode ser acessado em: http://sergioflima.pro.br/blog/

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encontramos o diálogo, a interação, a participação, a conscientização e a solidariedade do aprender/ensinando de Paulo Freire. À medida que cresce o diálogo entre posts e comentários, inter e entre blogs, e, ao mesmo tempo, desenvolve-se o conhecimento das TEI, emerge, como salto qualitativo, uma nova linguagem e uma nova prática. Para atender os objetivos desta investigação, foi proposto ao grupo que, a partir do ambiente comunitário, criassem cooperativamente ambientes virtuais ou conjuntos de instrumentos que pudessem dar suporte aos projetos individuais ou coletivos. Este trabalho vem sendo feito desde o início do projeto em relação a experiências individuais com os weblogs. Estes blogs individuais vêm assumindo progressivamente características de sites pessoais ou de projetos que se complexificam na medida em que ocorre a incorporação dos conhecimentos e reflexões relativos as TEI. Isso pode ser observado acessando os arquivos e verificando as modificações no desenho da página, na disposição e conteúdo do texto, na escrita que vai assumindo características hipertextuais, nas linkagens, na interação por meio dos comentários. Os posts começam a perder progressivamente a característica inicial de diálogo interior ou de reporte ao professor e passam a dirigir-se à audiência como um todo:

Socorro!!! Quem poderia me ajudar a trocar a cor do meu blogger? Acho que de tanto mexer nas tripas dele acabei por estragar tudo![Daisy, 02/11/2003, Amor é fogo que arde]

...comentários: Daisy, eu acho que tens que ir no template e olhar lá no background (acho que é assim que se escreve), por exemplo, vê o número da cor que está lá e anota (eu não sei fazer direto, preciso anotar) aí tu coloca ali o número da cor que tu escolhestes e vê como fica. Se

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gostares publica. Faz isto com todos os ítens que desejares alterar até ficar como gostas. É tentativa e erro. [Mara, 02/11/2003] A mexida de ontem foi legal. To olhando ele aqui de casa. Dentro daquela tua idéia de sóbrio e light, uma sugestão: trocar o azul da tabelinha da direita por um outro tom, parecido, por ex, com a cor que os links ficam qdo se toca neles [Su, 06/11/2003]

Um post questiona, desestabiliza a rede e gera um movimento onde aparecem a auto-organização e a responsividade. Os comentários dão suporte e realimentam a cadeia comunicativa. Posts geram comentários, que geram outros comentários e outros posts. Na conversa anterior, podemos notar que Mara se apropriou de conhecimentos suficientes para ter autonomia e autoria para alterar o ambiente no qual, dois meses antes, tinha dificuldade até em acessar. Autonomia e solidariedade que lhe permitiram auxiliar a colega compartilhando seus achados. A minha participação foi no sentido de reciprocidade e acolhimento, oferecendo sugestões e desafios, sem dar soluções prontas. Nesse sentido, as intervenções durante o projeto foram na perspectiva freireana de intervir “a partir do contexto e da linguagem do educando” (FREIRE, 2002, p.107), e respeitando o processo de construção do conhecimento de cada um. Uma intervenção

não só do docente, mas também do colega, como forma de

confrontar a contradição, desestabilizar, feita por meio dos desafios, do questionamento, da argumentação em torno da teoria-prática das situações vivenciadas/provocadas. A necessidade de auto/reorganizar-se foi de todos, como forma de trabalhar o próprio desequilíbrio frente às circunstâncias. O weblog, como ambiente de aprendizagem, por ser inacabado e aberto, por apresentar uma série de recursos e demandar outros, por não ser diretivo, de certa forma, intervém e problematiza os processos em seu interior.

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Outras instâncias de comunicação, como os encontros presenciais, oficinas, plantões,

lista de discussão, chat, deram suporte aos períodos de desequilíbrio

individuais e coletivos, provendo leituras adicionais, ajuda na realização de tarefas, cooperação na solução de dúvidas, acolhimento afetivo e reflexão sobre o processo vivenciado. Este suporte, por sua vez, retroagia sobre os diversos ambientes, dialeticamente reestruturando-os naquilo que fosse pertinente de modo a melhorar para todos as atividades e processos.

Figura 12 – auto-organização dos ambientes e processos

Todas as intervenções desejadas sobre os diversos ambientes eram colocadas como problemas a resolver e não como receitas a serem seguidas de modo linear. Mexer nas tripas de um blog, implica lidar com códigos, com uma linguagem diferente que precisa ser aprendida para que se possa agir. Provoca a incorporação de todo um vocabulário que, aos poucos, vai se tornando familiar,

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como as palavras que destaquei no comentário anterior da Mara. Uma aprendizagem social que inicia com atividades realizadas com o auxílio do professor ou do colega para, posteriormente, ser assumida de forma individual e autônoma (Vygotsky, 1984,1989). Esta possibilidade de alteração do próprio ambiente é uma característica que diferencia os weblogs de outros ambientes virtuais. Na maioria dos ambientes usados em educação, o aluno não tem a possibilidade de transformar o ambiente, sendo apenas usuário. Um weblog possibilita um espaço para a emergência da autoria, que se manifesta quando os alunos produzem textos próprios, mas, também, quando começam a transformar o ambiente, tanto no aspecto estético, como no estrutural. Quando um educador aprende a usar um ambiente, não se pode dizer que ele poderá levar este conhecimento consigo e reaplicar. Existe uma grande diversidade de ambientes virtuais e cada um deles demandará uma aprendizagem sobre seu uso. A maioria das escolas não possui servidores sofisticados ou acessíveis ao manuseio do professor e, este, pode não encontrar na escola o tipo de ambiente que aprendeu a usar. Ambientes construídos com weblogs, ou com outras tecnologias semelhantes78, são criados pelo professor e podem ser replicados em locais com poucas condições técnicas. Penso ser muito importante esta diferença entre ser um usuário e um criador de tecnologia. Mesmo que seja uma criação limitada, pois o professor não cria a totalidade dos códigos que fazem o weblog funcionar, já é uma forma mais abrangente de compreender os processos e ser capaz de escolhas tecnológicas e formulação de propostas na criação de ambientes educacionais.

78

Os wikis, por exemplo, que são páginas dinâmicas, facilmente criáveis e editáveis, numa linguagem própria, mas bastante simples. Informações adicionais na Wikipedia - http://pt.wikipedia.org/wiki/

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Para Bakhtin (2000, p. 344), “o autor não pode ser dissociado de suas imagens”, uma vez que é parte de suas composições. Por isso, no projeto, além dos textos e comentários, acompanhei as transformações de todos os ambientes, registrando-as periodicamente em imagens. Acredito que a educação e a pesquisa devem abrir espaço para outras expressões que não somente a escrita, para outras racionalidades que não somente a da ciência. As imagens79 das figuras 13 a 18, colocadas aos pares, são exemplos das modificações inseridas por algumas educadoras nos seus weblogs. Algumas destas modificações tiveram origem nas atividades do projeto, mas, outras, partiram da iniciativa da participante, principalmente as relativas a forma, cores e acessórios e a escolha dos links relacionados. Todavia, todas elas correspondem à construção de conhecimentos em processos realizados juntamente com a professora e com colegas, que foram internalizados e apropriados pelas educadoras.

A conhecida afirmação de McLuhan: "o meio é a mensagem" tem sido interpretada por alguns como uma subordinação do conteúdo à forma e, por outros, como uma mútua determinação entre forma e conteúdo. Estas interpretações têm em comum o tratamento dicotômico entre forma/conteúdo, meio/mensagem, significado/significante,... Um pensamento tipo causa->efeito que emerge mesmo nos discursos mais complexos. Marx mostra a atualidade de seu pensamento no tratamento de forma/conteúdo como opostos dialéticos. Em termos marxianos, forma e conteúdo coexistem nas suas relações. Um mascaramento da realidade pode tornar opacas estas relações, invertendo, sob esta ótica dual, o significado pelo significante, "o dinheiro se torna o objeto do próprio desejo". Meio e mensagem se implicam dialeticamente. O formato de um blog condiciona de certa forma a qualidade e quantidade num post, influindo, assim, no seu conteúdo. O tipo de conteúdo influi na escolha do template de um blog, também. Este movimento vai gerando novas sínteses, num processo que podemos acompanhar pelos arquivos. [Su, 04/11/2003, [bloglab]]

As imagens mostram dois momentos de cada um dos blogs e, também, na ação do aluno, as diferentes formas e ritmos de aprender. Modificar os blogs implicou em compreender os códigos, testar alternativas, pesquisar, comparar com 79

imagens capturadas dos blogs individuais, nas datas indicadas.

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outros blogs, personalizar e exercer a criatividade e a autoria. Autoria que, segundo Bakhtin (2000), se encontra onde forma e conteúdo se fundem.

Figura 13 - Camila, ago/2003

Figura 14 - Camila, fev/2004

Camila executou mudanças a intervalos regulares, mexendo mais nas cores a princípio. Somente na última mudança ousou mais, mudando o formato, as cores e até o nome do seu blog. O “CC” que pode ser observado na figura 14, no cabeçalho do blog, é um exemplo de uma intervenção problematizadora. Foi colocado ali,

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juntamente com Camila, para marcar o lugar de inserção de uma tabela. Um desafio que seria enfrentado no momento em que ela se sentisse capaz.

Figura 15 - Daisy, jul/2003

Figura 16 - Daisy, set/2003

Daisy mudou diversas vezes o seu blog, desde quando descobriu a possibilidade de modificar. Pesquisou fundos de tela e scripts que adicionavam movimento ao cursor, modificou inúmeras vezes o layout da página e as cores.

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Algumas vezes questionou-se e foi questionada se esta focalização na forma não evidenciava, além de uma maneira visual de aprender, uma espécie de fuga da necessidade de escrever/postar, da exposição e do desequilíbrio que estas atividades podem trazer.

Figura 17 - Mara, ago/2003

Figura 18 - Mara, mar/2004

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Mara reflete muito antes de mudar o seu blog. No princípio, por medo de estragar alguma coisa, depois, por pensar cada modificação e seu relacionamento com o todo detalhadamente. Em sua reflexão, considera sempre a possível opinião daqueles que lerão o seu blog. Amadurece a idéia até que faça sentido, isto é, que responda às inquietações que desencadearam o processo de mudança. Além disso, parece preocupar-se mais com as idéias e reflexões postadas do que com a forma como elas vão aparecer. Ao avaliar estas ações relacionadas às alterações nos blogs, em sua intersecção com o processo de aprendizagem dos meios que possibilitam estas alterações e com as reflexões e desdobramentos do projeto individual de constituição dos blogs, é preciso considerar o contexto e o momento de vida de seus autores. É possível observar diferenças quantitativas e qualitativas nas reflexões, conforme se diferencia a formação dos educadores e educadoras e aumenta a experiência profissional. Existe uma contradição, da qual fazem parte os seguintes elementos: professores pós-graduados que demonstram alto grau de reflexão e teorização frente aos desafios propostos; futuros professores, em processo de graduação, que se queixam de práticas educativas bancárias e da falta de atividades reflexivas em sua formação. A contradição situa-se no fato de que, não raro, são aqueles professores pós-graduados que ensinam estes professores em formação. Onde e quando estas práticas de ação/reflexão vieram a fazer parte da formação e do trabalho destes educadores pós-graduados? O quê separa a prática reflexiva da prática educativa de um educador? Triviños (2003) está correto quando conclui que a formação do educador é essencial para que este possa desenvolver um ensino como pesquisa desde as séries iniciais. Se o professor que sai da graduação, que é o que atua no ensino fundamental e médio, não tem sua formação

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realizada no ensinar-pesquisando, a reflexão e a pesquisa ficam adiadas para a pósgraduação e, nela, represadas.80 Esta avaliação sobre as mudanças no blog feita por meio da comparação de suas imagens em momentos diversos, assim como toda investigação feita nos blogs do projeto [zaptlogs], só foi possível pela existência dos arquivos81, que é onde as páginas mais antigas ficam estocadas. Estes arquivos demonstram a historicidade possível numa publicação como esta. Por meio dos arquivos, é possível tematizar, pesquisar e refletir sobre o processo do autor.

No blog que venho desenvolvendo (www.praticasdevida.blogspot.com) tenho como objetivo: mostrar e visualizar a minha vida, não para "descobrir" uma "verdade" sobre quem eu realmente sou, pois sou de múltiplas formas, plurifacetada, híbrida, nem para acalentar um certo saudosismo sobre a minha história pessoal, mas para me ressignificar. Sinto necessidade de fazer isto, não para expor a minha intimidade, ser um produto a ser consumido nesta gigantesca lógica da sociedade do espetáculo (e do consumo), onde consumimos tudo, inclusive a possibilidade narcísica de elevarmos a nós mesmos, mas para que eu possa ter um registro das coisas que fiz, dos momentos que passei... Assim, enquanto não desenvolvo o projeto que quero, estou dando forma a um "arquivo pessoal", para que daqui a algum tempo eu possa ver os (des)caminhos que percorri. O blog ajuda muito nisto, além de me animar a escrever e a me (re)pensar, contribui para que eu faça o movimento de refletir e repensar continuamente, contribuindo para um viver mais autônomo, cheio de trocas. [Vivi, 08/02/2004, Práticas de Vida]

Se um blog permite ao blogueiro narrar a si mesmo, acessar os próprios arquivos torna possível o distanciamento necessário para observar-se, rever-se, ressignificar-se. Um movimento de metacognição, onde entra o conhecimento de si e de seu processo de aprendizagem.

Este distanciamento remete ao conceito de

bakhtiniano de exotopia. Para Bakhtin (2000), a autoria pressupõe um excedente de visão sobre o todo e cada parte da obra. O autor chama de exotopia esta visão que 80

É rara a pesquisa no ensino fundamental e médio feita por professores do ensino fundamental e médio, enquanto tais. 81 Os posts podem ser arquivados de diversas formas: por semana, por dia, por mês. Quando um post é publicado, ao mesmo tempo já é arquivado e é colocado no seu rodapé um link permanente e na parte destinada aos links estáticos ou numa página anexa, um link para o arquivo do período.

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vai além do todo da obra, este se colocar fora do autor, que lhe permite dar o acabamento na obra. E, ao colocar-se fora, tornar possível o diálogo consigo mesmo, como demonstra Vivi nas suas palavras:

Assim, neste frenético mundo onde ouvimos de tudo, poder parar e ouvir a si mesmo é um privilégio e o resultado de um esforço. muitas vezes penso: Puxa, passa o dia e não sei o que postar, não capturo nenhum momento significativo de meus dias (sei que este não é um problema individual meu)? creio que muitas vezes isto ocorre porque vivemos, sim, mas não experienciamos a nossa vida, não paramos para retomá-la, discuti-la, senti-la... será que converso comigo o suficiente? Será que ando me deixando me perder dentro de mim mesma? Com certeza, depois de vivenciar o uso dos blogs, sim!!! Exijo de mim a escrita, a reflexão, a retomada e o contraste de posições! [Vivi, 05/05/2004, [zaptlogs]]

A meu ver, os blogs individuais, pela sua historicidade, dialogismo e dinamismo, são excelentes substitutos para os portfólios geralmente usados em projetos educacionais que envolvem comunicação à distância. A possibilidade de retomar o passado no sentido que Kosík (1976, p.150) afirma, quando diz que “a realidade humana não é apenas produção do novo, mas também reprodução (crítica e dialética) do passado”. Na experimentação que faz parte desta investigação, procurei formas de motivar e desencadear o processo de ação/reflexão nas atividades propostas. Inicialmente, as atividades partiam de uma proposta básica postada no [zaptlogs] e, posteriormente, no [zaptlogs-ativ], que continha um possível roteiro, alguns subsídios e links. Este roteiro servia de guia para as atividades no laboratório e para as atividades a serem realizadas durante a semana. Desde meados de agosto, me preocupava o que eu considerava uma pouca participação e envolvimento com as atividades fora dos encontros no laboratório. Algumas atividades que deveriam ser rotineiras não eram executadas e atividades que não eram terminadas nos encontros presenciais permaneciam inacabadas,

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principalmente as que exigiam mais reflexão. Paralelamente a isso, quase não havia questionamentos ou solicitações de ajuda na lista de discussão. Neste contexto, pensei uma forma de manter mais acessíveis e reutilizáveis alguns conteúdos trabalhados nas oficinas: com inspiração nas webquests82, criei o que chamei de blogquests. De modo simplificado, uma webquest é um conjunto de páginas na web, onde um assunto/questão é publicado com diversas informações e atividades que complementam as atividades presenciais sobre o tema. É possível construir facilmente uma webquest usando os posts de um blog e seus links permanentes.

Fim de semana de estudo :) Consegui por em dia algumas leituras e dar o empurrão inicial na próxima fase do [zaptlogs]. Considerando a abordagem das tarefas/conteúdos/reflexões que temos pela frente e, também, nas que queremos retomar; considerando as aprendizagens feitas individualmente, como grupo e como pesquisadores; considerando as questões de pesquisa e o rumo teórico de minha proposta: .......... andei refletindo, dando voltas e estruturei, provisoriamente, como sempre, um caminho um pouco diferente. Para atender a heterogeneidade do grupo atual, vou colocar as atividades sob a forma de blogquests, numa alusão às webquests, mas utilizando os blogs e procurando dar a cada quest um formato que privilegie a autoria/autonomia. São questões abertas que podem ser modificadas, re-postadas, configuradas considerando a quem se destinam e em que momento. A idéia é trabalhar nelas de modo a que não fiquem num padrão linear, estilo instrução programada. Isso é uma coisa que não sei bem como fazer e penso que o grupo poderá auxiliar. Já bloguei algumas [zaptquests] de forma ainda provisória. Pretendo testar alguma coisa no próximo encontro no LIES e discutir com o grupo depois. [Su, 19/10/2003, Onde anda Su?]

Assim, construí o [zaptquests], um blog de blogquests hipertextuais em si e entre si, sempre abertas e passíveis de fácil edição. Estas quests se linkavam ao roteiro de atividades possibilitando enriquecer o conteúdo e individualizar as atividades do grupo heterogêneo que se diferenciava em níveis de conhecimento.

82

Webquests são formas de trabalhar com atividades cooperativas e investigativas utilizando páginas na web. Foram propostas por Bernie Dodge, em 1995. Mais informações em Projeto WebQuest – Escola do Futuro – Universidade de São Paulo - http://www.webquest.futuro.usp.br

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Figura 19 – visão geral de uma blogquest no [zaptquests]

Na imagem anterior, é possível observar o [zaptquests], mostrando na coluna da direita os links para as blogquests construídas e, na coluna maior, a blogquest selecionada. O [zaptquests] se integrou ao [zaptlogs] como mais um link, complexificando a estrutura do ambiente.

Nosso último encontro antes do recesso. Trabalhamos sobre os Sistemas de Busca e a pesquisa na www. Consegui reunir o grupo no LIES de modo a poder colocar o assunto de forma geral. Depois cada um dedicou-se a blogquest. A questão do fazer com auxílio para depois fazer sozinho tem se mostrado a cada encontro. A autonomia em relação aos conteúdos se dá aos poucos, recursivamente. A compreensão sobre o modo como as coisas se estruturam, se organizam e funcionam, também. [Su, 17/12/2003, [bloglab]]

Cada blogquest contém basicamente os subsídios sobre o tema e um desafio. Neste desafio, além de ser estimulada a leitura/estudo do conteúdo, são propostas

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algumas atividades práticas ou exercícios em relação ao tema e solicitadas atividades de reflexão sobre o todo. Esta proposta de abordagem do conteúdo deu um suporte mais efetivo às atividades planejadas e é uma forma de trabalho que pode ser ampliada e aperfeiçoada. Tanto no sentido de sua dinâmica, que penso ser ainda muito linear, quanto no sentido de aperfeiçoar sua distribuição pelo acoplamento a ferramentas de agregação de conteúdo (leitores de RSS ou Atom). Outra alternativa possível é abrir totalmente o blog das blogquests permitindo que os alunos participem ativamente da construção e edição de cada uma.

Figura 20 – a mesma blogquest da figura anterior vista por um leitor de RSS.83 (imagem capturada da tela da autora)

83

Na imagem, é possível ver, na coluna da esquerda todos os sites sindicados, que podem ser lidos na coluna da direita. Na parte superior da coluna da direita, são listados os tópicos postados, na parte inferior, lê-se, em formato texto puro, parte ou todo o texto do post. Clicar duas vezes num tópico fará com que na janela inferior apareça o site, conforme ele é exposto na web. É possível, também, abrir em outra janela os assuntos que interessarem, entrando na página propriamente dita. Os tópicos podem ser guardados ou deletados e existe a possibilidade de filtra-los por assunto e/ou por data.

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Se, por um lado, usar as blogquests, dinamiza as atividades das oficinas, por outro, não resolve os ciclos de silêncio e redução na participação. Para os educadores e educadoras participantes, a convivência em ambientes virtuais e as oficinas sobre as TEI, sendo atividades voluntárias, que não fazem parte obrigatoriamente do seu trabalho ou da sua formação, ficam atrás de outras atividades se houver necessidade de priorização.84 É neste sentido que se evidencia a contradição entre considerar a importância e a necessidade das TEI no trabalho e, ao mesmo tempo, dentro de um contexto de contração espaço-temporal e intensificação dos processos de trabalho, negar a sua importância e necessidade, priorizando atividades obrigatórias para a sua subsistência. Nesta perspectiva, toda e qualquer formação continuada fica prejudicada em vista do alargamento e intensificação da jornada de trabalho de educadores e educadoras. Além disso,

o uso das TEI na sala de aula e em

atividades complementares, aumenta a carga de trabalho do professor e, até, invade seu tempo livre, pois as condições de trabalho não são alteradas. Além desta, outras contradições tensionam o conhecimento, desestabilizando educadoras e educadores na sua aproximação com as TEI. Conhecimento compreendido como atividade e não faculdade, como relação social em movimento. Ao mesmo tempo em que constroem com autonomia e autoria seus textos e projetos, perguntam-se se é sua função compreender e ter autonomia na sua relação com a tecnologia e tendem a abusar da citação de autores consagrados. Ao mesmo tempo em que cooperam em projetos comuns e colaboram com os colegas, confrontam-se com a existência de ambientes educacionais fechados e tendem a

84

Os dados que dão apoio a estas interpretações foram colhidos das justificativas de faltas as oficinas, informalmente comunicadas pelos educadores e educadoras participantes, e da observação dos períodos acadêmicos de provas, seleções e atividades de final de semestre.

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reservar o conhecimento para si e para futuras publicações. Encontram uma rede solidária que socializa reflexões e conhecimentos, que se mistura com uma rede onde o que hoje é oferecido de graça, amanhã passa a ser cobrado. No movimento das contradições, em meados de outubro, começaram a emergir os primeiros subprojetos do [zaptlogs], onde as categorias de autonomia e autoria começaram a ter visibilidade pela aplicação dos conhecimentos construídos em projetos individuais e coletivos. Maçada (2001, p. 65), em sua tese de doutorado, conclui que para atingir habilidades em relação ao uso da tecnologia, ao invés de investir em treinamentos, é necessário “que utilizemos a tecnologia vinculada, interligada aos nossos interesses de acordo com nossas necessidades, descobrindo as possibilidades e ajustando-as às necessidades”. Concordo com a autora, pois a tecnologia é transitória, sempre surgem inovações e não adianta aprender apenas a clicar certos botões. É nos seus projetos que os educadores consolidam o que já sabem e criam novas oportunidades de aprender. O [zaptlogs] ramificou-se, internamente, na Faculdade de Educação da UFRGS por vários projetos: o primeiro, o InTramse, o blog de notícias do TRAMSE; o segundo, o Relendo Clássicos, blog de uma disciplina do PPGEDU, organizado por Carmen e Mara; o terceiro, um projeto de convivência com e entre crianças, o Viajando na Maionese, que ainda está sendo construído por Camila e Daisy; o quarto, um projeto meu, o Argumento, uma blogoteca de textos utilizando a tecnologia da agregação de conteúdo via RSS. O InTramse nasceu quase na mesma época do [zaptlogs] e é um blog-jornal que veicula notícias do TRAMSE, nosso núcleo de pesquisa, dos vários grupos de pesquisa associados, da universidade e assuntos ligados às nossas áreas de

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interesse. Tem como objetivo informar e fomentar a participação e o entrosamento dos educadores e educadoras participantes do TRAMSE e divulgar à comunidade as atividades e o pensamento do núcleo de pesquisa, bem como, os outros assuntos relacionados a educação, movimentos sociais e trabalho. As notícias postadas, as quais podem ser lidas usando leitores de RSS/Atom, incluem eventos diversos como palestras, cursos, seminários, defesas e relatórios. A idéia é que este espaço esteja aberto para a colaboração de qualquer participante do núcleo de pesquisa, como editor.

Figura 21 – vista geral do InTramse e seus links

Relendo Clássicos é o projeto de um blog de discussão sobre as leituras de disciplinas da pós-graduação, produção conjunta de Mara e Carmen. Iniciou em

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2003, na disciplina relendo Clássicos Brasileiros e continua na nova turma/disciplina em 2004, com leituras de Gramsci. Dia movimentado. As meninas, seminário, preocupação com o projeto e algumas surpresas. Entre elas, o fato dos colegas me procurarem para explicar como instalar o bloggar e postar no Clássicos brasileiros e me pegar não só explicando, como levando-os para o laboratório e me aventurando , na prática, mostrar para eles o "aplicativo". [Mara, 29/10/2003, Nina] ...comentários: Parece que aprendemos mais, quando nos propomos a ensinar algo a alguém. Ou na versão do Paulo Freire: "Os homens aprendem em comunidade" PS: O que mais gostei no seu blog é que ele é "palmamigável", isto é, o tamplate que você escolheu torna a leitura do seu blog otimizada para a tela de um palmtop ;-) [Sérgio, 29/10/2003, comentário externo] Mara, tu é tão paciente e calma pra explicar as coisas deve ser porque tu é apaixonada pelo que tu faz! beijocas...as meninas são ótimas...! [Daisy 30/10/2003]

Na fala de Mara a comprovação da afirmação de Paulo Freire (2002b, p. 81) de que “ao ensinar o professor re-conhece o objeto já conhecido”.

Figura 22 – Relendo os Clássicos Brasileiros, turma 2003/2

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Bem, aproveitem, bloguem, socializem o conhecimento, as dúvidas, as informações. Com certeza, essa partilha é parte vital de uma formação mais humana. [Mara, 09/12/2003, Clássicos Brasileiros]

Como

se

pode

observar

pelas

falas

anteriores,

a

construção

e

desenvolvimento do projeto Relendo Clássicos foram fatores que impulsionaram a incorporação das TEI no trabalho de suas autoras. Progressivamente, o suporte que dou ao projeto vai diminuindo, enquanto cresce a desenvoltura das autoras ao lidar com o ambiente e com a aprendizagem de seus alunos, enfrentando em outro patamar as mesmas dificuldades que elas enfrentaram no início do [zaptlogs].

Genial as descobertas que começam a aparecer! Tanto as de produção de texto como a de nosso desconhecimento da tecnologia! Eu não sei como resolver a dupla postagenm mas eu sei que no Zaptquest do Blog [zaptlogs] itul podem encontrar a orientação para retirar o que foi publicado em dose dupla. Quanto às questões retomarei presencialmente algumas, hoje! Esta aqui comigo a itu, ainda relutante em aprender a mexer nestas coisas maquinavélicas! Até a tarde. [Carmen, 21/05/2004, Relendo Clássicos]

Figura 23 – Relendo Clássicos, turma 2004.

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Apesar de longo vou deixar exposto o nosso cronograma até meados de maio. Os livros previstos seguem a itulação das antigas edições da obra de Gramsci. A previsão é revermos este cronograma em maio. Há novas informações na bibliografia. [Carmen, 30/03/2004, Clássicos]

Além de proporcionar a colaboração e mediar as discussões dos alunos, o blog Relendo Clássicos dá suporte a outras atividades da disciplina, abrigando o cronograma, a agenda e documentos.

Argumento foi o nome escolhido para o projeto de uma revista eletrônica construída por meio de weblogs interligados. Penso, e nisso me ajuda Paulo Freire (1983) que não é no fechamento e nem na pesquisa escondida, que se transforma o mundo. É neste contexto e à semelhança do [bloglab] que pensei o Argumento.

Nós educadores, alunos e professores, construímos, ao longo das nossas práticas, textos, reflexões, apresentações, palestras, imagens, etc. – trabalhos de todos os tipos que, na maioria dos casos, ficam empoeirando numa pasta ou esquecidos num arquivo no computador. Saber isolado, inativo, morto. Este blog é o ambiente geral do projeto que tem como objetivo resgatar e agregar toda esta produção. [Su, 21/03/2004, argumento]

O projeto, ainda em fase inicial, tem como meta expandir-se e agregar, além dos textos e resenhas, objetos de aprendizagem produzidos no núcleo de pesquisa. Os diversos blogs são rssficados podendo ser lidos em agregadores de notícias ou até recebidos por e-mail. A página principal mostra o resumo dos últimos textos com links para os textos completos. Os links fixos remetem ao índice que lista os textos por categoria, por nome do autor e por título. As categorias, até o presente momento são:

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educação, movimentos sociais, trabalho e resenhas. Em cada texto, é colocado o nome do autor, uma breve identificação e uma forma de contato. No final de cada texto encontra-se um link onde podem ser adicionados comentários. Não existem normas de publicação e nem comissão editorial para avaliar textos. A publicação é a critério do autor e não tem periodicidade definida. Sugere-se que os textos não tenham mais que vinte páginas ou que sejam divididos em textos menores, por razões técnicas de velocidade de exibição da página. A avaliação fica por conta dos leitores e de seus comentários. A idéia é a de que os textos estimulem o debate e a crítica, admitindo-se publicar textos que respondam/critiquem outros textos. Pode, em princípio, parecer anárquico e pouco confiável, porém é uma idéia que põe à prova a coragem dos educadores em expor suas construções teóricas, mesmo imperfeitas, mas abertas à colaboração e ao diálogo. Neste sentido, a proposta subverte o formato dos textos acadêmicos, burla o engessamento das publicações tradicionais e questiona as autorias fechadas, a produção restrita aos pares e sinaliza na direção de um conhecimento distribuído, solidário, autoria compartilhada, socialmente construído na polifonia de muitas vozes. Tenho consciência das dificuldades e considero as muitas reservas com que esta proposta pode ser e vem sendo tratada, mas acredito na força do conhecimento aberto, como bem humano, construído de modo a vir ao encontro dos interesses da humanidade e ser de livre acesso e utilização por todos.

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Figura 24 – Argumento

Externamente, o [zaptlogs] deu origem ao projeto Prática Educativa, na Faculdade de Medicina da UFRGS, produção cooperativa da Sônia, Mara, Carmen e minha, desenvolvida na pós-graduação em medicina, na disciplina de mesmo nome. Na sua segunda edição, está diversificando a atuação da equipe e acoplando um subprojeto inspirado no Argumento, reunindo a produção de alunos e professores.

Figura 25 – Prática Educativa, turma 2004/1, vista da página principal e de um comentário.

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Como foi explicado em aula, muitas das atividades serão realizadas no nosso Blog. Para trocarmos informações e possibilidades de convívio, convido a pensar, promovendo um “passeio da alma” como diziam os gregos, [...] [Sônia, 17/03/2004, Prática Educativa]

Projetos utilizando weblogs como ambiente virtual de aprendizagem e convivência, abertos e públicos, possibilitam um grande enriquecimento das relações constituídas na sala de aula. Por exemplo, no subprojeto Prática Educativa, as relações proporcionadas somente pela aula presencial aconteceriam apenas entre os alunos e as professoras que atuam na disciplina (gráfico – Figura 26).

Figura 26 – Prática Educativa: relações estabelecidas na aula presencial

Considerando as interações na sala de aula presencial e as interações por meio do blog, ampliam-se os canais de ligação com a adesão de uma interlocução externa por meio dos comentários, de uma interligação com outros ambientes e pessoas por meio dos links, trackbacks e RSS e, ainda, a possibilidade de participação das pesquisadoras. (gráfico – Figura 27)

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Figura 27 – Prática educativa: relações ampliadas pelo uso do blog.

No gráfico da figura 27, foram colocadas apenas as relações mediadas pelo blog e as relações da sala de aula presencial. Estas relações podem ser novamente ampliadas com as relações diretas que podem se estabelecer entre as pessoas.

Após quase seis meses de interação, o [zaptlogs] começou a constituir-se realmente como comunidade. Não apenas pelos projetos comuns, mas pela integração dos diversos projetos em rede. Uma rede com espaço para emergência de novos projetos, híbridos, tecidos pelo movimento dos projetos iniciais, outros nós a serem interconectados expandindo academia.

a rede inicial para fora e para além da

181

Figura 28 – rede construída pelo projeto [zaptlogs]

A comunidade entendida na sua dimensão de relação social entre pessoas, que escolhem unir-se pelos seus interesses e afinidades, estejam onde estiverem. No caso dos blogs, individuais e ambientes de nossos projetos, uma comunidade que se mostra, em sua dimensão on-line, pela ligação dos nossos textos.

Acho que o poema do João Cabral de Melo Neto traduz um pouco do que é e tenta ser o [zaptlogs], um projeto que congraga vários blogs, entre eles este pelo qual escrevo. Um grupo que de uma maneira solidária e cooperativa troca informações, idéias, experiências, ânimos... Um lugar virtual e presencial onde cada “vários galos tecem idéias”, onde cada galo necessita do outro, não para consumi-lo... mas para a UNIÂO QUE FAZ A FORÇA!!! [Vivi, 08/02/2004, Práticas de Vida]

Em todas estas construções os weblogs, foram essenciais, como publicações dinâmicas, que impulsionam a criação de novas sociabilidades e de um verdadeiro viver em rede. Cada post uma mão estendida, uma possibilidade de encontro, de sentido

compartilhado,

de

cooperação

e

de

solidariedade.

Cada

blog

182

desestabilizando a rede à sua maneira, quebrando a simetria dos trajetos, a cadeia dos sentidos, provocando a bifurcação. Bakhtin (2000) entende que cada enunciado é em si mesmo completo e irreproduzível. O simples repetir já muda o sentido do que foi repetido. Um enunciado é sempre inédito, embora criado sobre algo de antemão dado, um sentimento, uma visão de mundo: “o objeto vai edificando-se durante o processo criador” (BAKHTIN, 2000, p.349). Num blog, cada post, é um enunciado completo, aberto para comentários e que, assim, engendra uma relação dialógica com outros enunciados. Cada post ou comentário é um enunciado novo, irreproduzível, que vai além de refletir algo dado e externo. O aspecto público de um post é uma condição que não apenas permite, mas que propõe o diálogo. Esta dimensão, ausente na maioria dos ambientes virtuais de aprendizagem onde o participante interage apenas com seus colegas, deixa posto a existência de um terceiro no diálogo, um superdestinatário que não é nem a Ciência, nem Deus, mas o outro-que-nos-lê. Um post é palavra que não se intimida com este terceiro no diálogo, que põe no mundo o enunciado e o torna real para o outro e, portanto, para seu autor (MARX, 2002). Um post está, deste modo, sempre aberto às novas vozes que se somam ao diálogo e compõem polifonicamente outros textos, posts, comentários num diálogo que não se fecha, sentido sempre inacabado. A intertextualidade que se estabelece entre weblogs impulsiona o movimento que interliga a compreensão, como relação dialógica que se dá pela confrontação de sentidos. Compreender, como propõem Bakhtin (2000, p. 352), entendido como “tornar-se parte integrante do enunciado do texto [...]”, um enunciado considerado em sua relação com a realidade, com o sujeito real e com outros enunciados.

183

Esta relação dialógica entre enunciados, mesmo os que estão separados no tempo, é que permite trazer Marx, Freire e Bakhtin para darem suporte a formas de relação como as que se estabelecem em ambientes tão recentes, como é o caso dos weblogs. Quando lemos um post e o compreendemos, tornamo-nos parte deste texto, tornamo-nos o “terceiro num diálogo [...]” (BAKHTIN, 2000, p. 355), o superdestinatário que interage responsivamente por meio dos comentários ou de outros posts interlinkados. O comentário num post pode possibilitar “primeiro uma delimitação conciliadora, depois a cooperação” (BAKHTIN, 2000, p. 376). Cooperação que parte do reconhecimento da existência de zonas fronteiriças, onde a competição, mesmo a retórica, não tem sentido, onde a autonomia se firma no diálogo e os limites se tornam faróis que guiam a ação. Weblogs, comentários, trackbacks, RSS, compõem redes sociais, são pontos de contato entre textos. Nestes pontos de contato é que pode surgir “a luz que aclara para trás e para frente, fazendo com que o texto participe de um diálogo”, considerando que por “trás deste contato há o contato de pessoas e não de coisas”. (BAKHTIN, 2000, p.404-405). A interação entre pessoas e objetos de conhecimento possibilita a aprendizagem colaborativa/cooperativa, que produz liberdade, que significa autoria e autonomia. Para professores e alunos, a participação e a interação, o diálogo e a cooperação, a teorização e a reflexão são o espaço possível do sentido, que produz meios

de

aprender/ensinar.

Ensinar/aprender

como

atividade

criativa,

aprender/ensinar como processo e como movimento social. Aprender/ensinar que implica na conscientização, como forma de inserir-se no processo histórico como sujeito (FREIRE, 1983, 2002a, 2002b).

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Um processo permeado de avanços e recuos, de dúvidas e certezas provisórias, de ritmos e estágios diferentes de aprendizagem, de relações construídas e reconstruídas individual e coletivamente. Tudo isso se mostra nas palavras de algumas educadoras do [zaptlogs]:

Levei a proposta dos blogs a outros grupos e ao lado de meus senões passa a existir o reconhecimento das possibilidades que pode trazer o uso do blog na educação, como um meio, um espaço de partilha de conhecimento e da constituição de autonomia e autoria, dependendo é claro, do uso que dele possamos fazer. É desde esse movimento, que partilho aqui meu processo e a idéia das possibilidades de um espaço contra hegemônico que podemos constituir através dos blogs. [Mara, 06/04/2004, Nina]

No "Um Novo Tempo" não sei explicar com tanta segurança o que estava acontecendo. Talvez porque ainda esteja acontecendo! Imagino que, quando os momentos ainda estão em processo, é mais difícil de explica-lós e até mesmo de entendê-los. Mas sei que algumas coisas mudaram... Uma das coisas que mudou foi o meu "relacionamento" com o computador, acho que estou entendendo ele melhor!!! Percebi isso agora, com as aulas do Jean (que são para ajudar eu e a Daisy a atualizar a página "Retrados da Escola Rural"). Antes de começá-las, estava achando que eu não saberia nada, que seria tudo muito diferente, porém me dei conta que muito do que o Jean nos mostra eu já conheço. Os encontros do semestre passado, [...], os trabalhos cooperativos desenvolvidos no Zapt, e o próprio ato de mexer com o computador contribuíram para meu melhor entendimento sobre computação: como fazer pesquisa, como instalar algum programa, compreender um pouquinho da linguagem HTML... Meu problema maior ainda é ter a hábito de escrever no meu blog, não consigo ter muita liberdade com ele!! Fico me questionando se o que vou escrever não é muita bobagem, se não vai ter muitos erros, se vai servir para alguma coisa, o que os outros vão pensar... [Camila, 04/06/2004, Um Novo tempo]

Quero dizer, que juntamente com o sentimento de que sei muita coisa sobre internet, aparece também o sentimento de que nao sei nada, que paradoxo o meu! (sei que sei, mas não sinto-me preparada para fazer). Tentei refazer o caminho que fiz quando construí a página "viajando na maionese" e não consegui, com isso cheguei a conclusão que precisaria fazer muitos vezes a mesma coisa para "memorizar" o caminho feito, e mais, precisaria precisaria de alguem me mostrando como fazer e acho que anotar o trajeto percorrido iria ajudar. [Daisy, 18/05/2004, [zaptlogs]]

185

Acho que agora estou mais “aberta” para utilizar as tecnologias na educação. Durante o meu estágio curricular, apesar das insistências dos alunos em utilizar o laboratório eu não me sentia capaz. Via que não bastava utilizar o computador apenas como um outro modo de escrever, pois na rede a questão do espaço, do tempo, da colaboração... estão presentes, é outra relação com a aprendizagem que pode ser desenvolvida. O engraçado é que não encontrei no curso regular de Pedagogia o que precisava, nunca vi como trabalhar colaborativamente com a informática e mesmo durante o estágio, quando fui perguntar para a professora responsável pelo laboratório de informática (apenas nos turnos manhã e tarde, à noite – o meu caso – cada professor era responsável) na escola em que estagiava ela me mostrou que o trabalho deveria ser o seguinte, por exemplo, produzir num programa atividades de português para preencherem, ou pedirem para escrever no Word textos. Acho que pode ser feito muito mais, com a minha inserção no projeto vejo que há muitas formas de trabalho e, aos poucos, vou vendo onde procurar as ferramentas... vendo que preciso me colocar na condição de aprendente. Acho também que preciso ler a respeito da colaboração, das redes... para entender melhor o papel das tecnologias, hoje, na educação. [Vivi, 06/06/2004, Práticas de Vida]

O projeto [zaptlogs], estava programado para encerrar em dezembro de 2003, segundo o cronograma apresentado no projeto de dissertação. Porém, é difícil dar por encerrada uma proposta que ainda está em crescimento, onde subprojetos estão em andamento e muitas idéias surgindo. Assim, encerrei o que considero uma primeira fase do [zaptlogs], suspendendo as oficinas e os encontros presenciais. Iniciou, então, a fase II, com a colaboração no ambiente, o suporte aos subprojetos, a elaboração de novos subprojetos e pesquisas para possível continuação numa fase III, após julho de 2004.

7 RE- LINKAR

Linkania é a proposta de um novo tipo de cidadania, fundamentada nas ligações que fazemos e não unicamente na geografia.

Uma cidadania em

movimento e constante transformação. Assim, a polis ganha novos e mutantes contornos, uma nova amplitude. Linkar é ligar e religar e se, por um lado, traz para perto o fantasma da fragmentação e da efemeridade, por outro, afasta a possibilidade do engessamento e da paralisia.

Linkar é agregar as respostas

provisórias às nossas dúvidas. Na perspectiva da linkania, revisito os meus pontos de partida, objetivos e questões de pesquisa, fazendo algumas sínteses e tecendo algumas conclusões que põem em evidência as categorias que emergem do trabalho realizado.

A interação em ambientes virtuais entre educadores pesquisadores na elaboração e desenvolvimento de seus projetos contribui para a constituição de comunidades de pesquisadores e para a construção de alternativas para a formação de educadores autores e autônomos no trabalho com as tecnologias educacionais informatizadas?

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Um ambiente de aprendizagem, presencial ou virtual, dá suporte para inúmeros processos no seu interior, porém, por si só, não garante que estes processos ocorram. A interação pode acontecer espontaneamente, mas só terá consistência e objetivo ao ser posto em prática o plano, projeto ou atividade que reuniu aquelas pessoas. No [zaptlogs], as interações aconteceram presencialmente ou por meio da internet, usando, principalmente, os blogs e o correio eletrônico. Estas interações foram possibilitadoras dos demais processos, como o diálogo, a colaboração, a cooperação e a aprendizagem. O suporte oferecido pelos ambientes de aprendizagem, em especial o [zaptlogs], foi importante neste processo, modificando a relação dos educadores e educadoras com o conhecimento e possibilitando a reflexão sobre as construções de cada um. Pessoas reunidas em torno de interesses comuns constituem uma rede que, à medida que vai se desenvolvendo a convivência e consolidando as relações entre as pessoas, tende a operar como uma comunidade. Comunidade como um tipo de relação social entre pessoas, onde prevalece o cuidado e a solidariedade como dimensões éticas e a participação como dimensão política (SANTOS, 2000b). No [zaptlogs], por exemplo, a partir de três de seus subprojetos: o InTramse, o Prática Educativa e o Relendo Clássicos foi possível mapear o estabelecimento das ligações em rede entre educadores e educadoras, conforme gráficos representados nas figuras 29, 30 e 31.

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Figura 29 – Subprojetos e relações em junho/2003.

Figura 30 – Subprojetos e relações em outubro/2003.

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Figura 31 – Subprojetos e relações em março/2004.

Estas ligações, se estendidas aos participantes de cada subprojeto85 e considerando os períodos de interação em cada um dos projetos e a duração desta participação, informam que o esquema acima retrata recortes de momentos de uma rede em constante transformação. Nesta rede, em diversos momentos ao longo da investigação, emergiram relações comunitárias. O aumento do número de participantes envolvidos, a expansão das ligações e do fluxo de interações, a organização e a reorganização da rede é que determina a bifurcação e a emergência desta outra forma de relação. A recorrência destes movimentos permite que, num dado momento, possa se usar a palavra comunidade para designar partes desta rede ou a rede como um todo. Os subprojetos criados não foram inicialmente pensados como projetos de pesquisa, mas como práticas educativas usando as TEI. Nesta concepção inicial, existe a intenção de testar os novos meios, de integrar os conhecimentos 85

Ver, também, os gráficos das figuras 26 e 27.

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construídos e de implanta-los progressivamente junto aos alunos. A pesquisa desenvolve-se à medida que os projetos se desenvolvem e se consolidam como práticas educativas confiáveis para seus autores. Hoje, já começam a surgir propostas de pesquisa no interior dos subprojetos. Estes projetos de pesquisa, que emergem entre os educadores e educadoras participantes no [zaptlogs] ou nos subprojetos, e as relações que eles possibilitam constroem dialeticamente a colaboração/cooperação na comunidade. Assim, partindo dos projetos de cada um, foi possível realizar uma aproximação com as TEI que foi significativa para a maioria dos educadores e educadoras, construindo progressivamente o trabalho individual e coletivo, a autonomia e a autoria. Penso que a interação virtual/presencial em torno dos projetos comuns e das oficinas de aprendizagem contribui para a formação do educador, na medida em que ele transforma estes conhecimentos e práticas em algo para si. No [zaptlogs], esta transformação tornou-se visível na construção e na execução dos subprojetos usando as TEI e na colaboração/cooperação nos projetos dos colegas. No [zaptlogs], ambiente desta investigação, estabelece-se uma relação dialética entre planejamento, conteúdos, oficinas, projetos, onde os conteúdos trabalhados nas oficinas subsidiam os projetos e, estes, retroagem sobre o planejamento, que se reorganiza, movimentando os objetivos, conteúdos e dinâmica das oficinas, que tornam a incidir sobre os projetos. Na reorganização de todos os processos é necessário considerar, também, os aportes externos recebidos por meio dos comentários e trackback. Esta possibilidade do aporte externo é uma das características dos weblogs que os diferencia dos demais ambientes virtuais.

191

Autonomia e autoria são categorias interligadas, que se constroem e se reforçam mutuamente. A autonomia, como liberdade na ação que se funda na consciência de nossa interdependência como seres humanos, torna-se evidente quando os educadores e educadoras passam a alterar os ambientes criados, inicialmente com auxílio e, posteriormente sozinhos. Estas alterações incluem a adição de links, a re-estruturação da concepção da página, a construção de novas páginas, mudanças nas cores e formas, acoplamento de outros meios e ferramentas etc. A autonomia está presente, também, quando os educadores e educadoras participantes decidem-se a instalar programas sem solicitação, a partir de vivências das oficinas e quando replicam com colegas e alunos os conhecimentos que construíram. Por exemplo, ao serem iniciados, os subprojetos exigiram que seus autores ensinassem aos participantes as TEI que seriam necessárias. A autoria emerge na elaboração dos subprojetos e na busca, apropriação e uso dos conhecimentos necessários para que estes projetos se materializem. A busca, a apropriação dos conhecimentos e a construção dos subprojetos evoluem conjuntamente, uma incrementando o desenvolvimento da outra. A execução dos subprojetos

retroage

sobre

estas atividades reorganizando o processo e

aperfeiçoando as propostas elaboradas. Os educadores e educadoras desta investigação, em sua maioria, foram autores e autônomos ao replicarem a construção de conhecimento das TEI com seus alunos em seus projetos e na criação dos seus blogs individuais e ambientes dos projetos. Um replicar entendido como movimento de reconstrução e não de simples reprodução. Todavia, isso deve ser entendido como um processo que continua em desenvolvimento para todos os participantes, cada um seguindo o seu ritmo de aprendizagem.

Acredito que pelo tempo de duração desta proposta e

192

pelos conteúdos das TIC/TEI desenvolvidos, conseguimos chegar muito além do que eu pensava inicialmente, que era o nível de construção e manutenção de blogs ou outros ambientes individuais. Neste sentido, posso afirmar que, dentro dos pressupostos teórico-práticos e dos limites desta experimentação, mas, também, do contexto e circunstâncias de sua realização, a interação em ambientes virtuais entre educadores pesquisadores na elaboração e desenvolvimento de seus projetos contribui para a constituição de comunidades de pesquisadores e para a construção de alternativas para a formação de educadores autores e autônomos no trabalho com as tecnologias educacionais informatizadas. Uma das críticas colocadas na qualificação do projeto de mestrado foi sobre a minha intenção de mapear, já anunciada no título e, também, sobre a amplitude dos objetivos e questões propostos. Não exatamente uma crítica, mas um alerta coerente de quem tem experiência em pesquisa e em lidar com os sonhos de pesquisadores iniciantes. Neste sentido, acatei a crítica sem deixar de ter paciência comigo mesma e compreender o meu próprio processo como parte da realidade investigada, que a altera e distorce, assim como qualquer mapa distorce o que representa para poder representar. O que procuro, em todos os momentos, é deixar às claras o tipo de projeção que faço, a escala e a perspectiva de meus achados. Não desisti de mapear, entendendo este mapear como processo, mas procurei localizar o meu mapa dentro da totalidade investigada, considerando toda a zona de sombra, de territórios desconhecidos, porém, clareando e mapeando uma rota possível. Uma rota que se insere, orientada, dentro desta totalidade e que descobre inícios de trilhas que podem ser pontos de partida, links para explorar a região de sombra.

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Foi meu objetivo geral:

Investigar a constituição e o desenvolvimento de comunidades de pesquisadores, analisando e interpretando as contradições em movimento neste processo, a fim de contribuir para a construção de alternativas para a formação de educadores autores e autônomos no trabalho com tecnologias educacionais informatizadas.

Analisando as tendências contraditórias no interior do fenômeno de inserção das TEI no trabalho de educadores, tendências estas reconhecidas e vivenciadas durante esta investigação, é importante aprofundar algumas idéias e interpretações. Considerando este fenômeno dentro da totalidade onde está inserido e no contexto histórico, político e sócio-cultural em que a investigação foi realizada, é possível comprovar que as TEI vêm crescendo espantosamente em número, diversidade e potência. Ao mesmo tempo, os conhecimentos e as possibilidades de trabalho de educadoras e educadores decrescem com as modificações progressivas na formação, que tende

a se aligeirar e precarizar e com a degradação das

condições materiais de vida e trabalho. Junto com isso, aumentam sobre todos as exigências em termos produtivos, sob critérios tomados emprestados às empresas. As próprias instituições educacionais, as públicas e algumas privadas, vêm se empobrecendo e perdendo a autoridade como instâncias formativas. O panorama educacional converge para a hom*ogeinização de uma formação precária e voltada para as exigências flexíveis de mercado, que co-existe com pequenas ilhas inacessíveis de excelência em educação.

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Neste mesmo contexto, o conhecimento se torna mercadoria, conhecimento construído socialmente e apropriado privadamente. Um conhecimento que deve ser competitivo e eficaz, não importando as conseqüências que possa desencadear. Neste quadro de oscilações quantitativas, conforme estas oscilações desestabilizam o sistema, tendem a forçar a bifurcação, a romper os limites da medida, dando lugar a uma nova qualidade. Neste sentido, é

possível, no que

concerne à inserção das TEI no trabalho do educador, que se chegue a situações onde teremos o trabalho do educador nas TEI ou, em extremo, as TEI no lugar do trabalho do educador. São tendências claramente visíveis no rápido desenvolvimento de algumas propostas de formação usando a educação à distância, por exemplo, onde se verifica, em grande parte, a inclusão subalterna dos educadores como provedores de conteúdo e tutores de treinamentos pré-estabelecidos, em ambientes prédefinidos e sem possibilidade de alteração, cujos proprietários, muitas vezes, são os próprios donos dos cursos. Este quadro insere-se dentro de uma sociedade que, em relação ao conhecimento, tende a se cindir em dois grupos, o primeiro formado por uma elite independente de produtores e usuários ouro86, que compete entre si e com um segundo grupo formado por uma massa dependente de consumidores e usuários básicos, que aspiram chegar ao status do primeiro grupo nos termos deles. Que movimento dentro deste quadro pode ser feito, que leve a sínteses provisórias e recorrentes que tendam a nos constituir todos como seres humanos

86

Brinco, aqui, com o tipo de classificação usada por bancos, planos de saúde, sites pagos etc., onde usuários básicos têm acesso a recursos mínimos, oferecidos como forma de fomentar necessidades, e usuários ouro são os que pagam e usufruem formas diferenciadas de atendimento.

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interdependentes, continentes, autores e autônomos, que cooperam e compartilham os frutos do conhecimento e do trabalho? Esta é uma questão que necessita ser pensada e respondida em múltiplas frentes. Penso que, em relação à inserção das TEI no trabalho do educador, uma rota possível passa por fazer esta inserção de forma consciente e crítica, não como adaptação passiva, mas como resistência aos pacotes fechados de formação e tecnologia, optando pelo conhecimento livre e aberto, pelas formas colaborativas e cooperativas de trabalho. Não apenas resistir, mas tomar nas mãos este processo, aprendendo, garimpando meios de contornar os fechamentos, transgredindo os formatos prescritos pela sociedade das mercadorias e minando as formas que nos deformam. Proponho, a partir dos resultados desta pesquisa, que a inserção das TEI no trabalho dos educadores e educadoras formadores e dos educadores e educadoras em formação seja realizada fora das disciplinas específicas e de cursos de capacitação. Uma formação que aconteça a partir dos projetos destes educadores e educadoras, portanto não apartada do seu trabalho, ao contrário, que inclua este trabalho no processo. Minhas idéias e sugestões passam pela criação de instâncias de apoio, que sejam transversais aos cursos e:

que possibilitem suporte e formação e promovam a pesquisa. Uma pesquisa que considere a realidade das instituições educacionais e que, a partir desta realidade, construa alternativas de criação e uso da tecnologia.

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que privilegiem as ações que promovam a autonomia e a autoria no trabalho com as TEI e potencializem a opção tecnológica consciente. que considerem as possibilidades da cultura hacker, do movimento software livre, dos ambientes públicos, interativos e abertos, das formas colaborativas e cooperativas de trabalho, como exemplos de uma reconstruída relação com o conhecimento, como bem humano. que não se fechem na academia, ao contrário, que a levem para a rede e tragam a rede para a academia, mesclando o que cada uma tem de melhor.

Que estas instâncias de apoio não sejam esferas estanques incrustadas dentro de guetos especializados, desvinculadas da totalidade onde se inserem e impermeáveis à rede de sentidos que é a internet. Ao contrário, que partam da imersão na rede, na sua cultura, mas, também na sua contra-cultura; do que é instituído pelos órgãos educacionais, mas, também pelo que é instituinte e negador, que se coloca como possibilidade, como as alternativas livres que emergem na internet. Mergulhar na rede, não como peixes aprisionados que se debatem impotentes, mas como pescadores que tecem as suas malhas de acordo com o que necessitam e podem pescar.

8 LOG OUT : FECHANDO JANELAS

Mais alguns passos a levaram para a borda do riacho. A Oitava Casa, afinal! – gritou enquanto saltava ...................................................................... .......................................................................................................................... e se atirava ao chão para descansar num relvado tão macio quanto musgo, pontilhado de canteiros de flores aqui e ali. “Ah, como é bom ter chegado até aqui!”87

Ao chegar na oitava casa, Alice se tornou Rainha e acordou, encerrando aquele sonho. Se não acordasse, possivelmente suas aventuras continuariam por muito mais tempo, pois sempre existem perguntas a fazer, mundos a descobrir, e ela teria dificuldades em decidir quando voltar para casa. Todavia, acordar do sonho ou voltar para casa podem ser ótimas formas de voltar a sonhar ou voltar a sair para o mundo. É comum em quem mergulha na rede a dificuldade em abandonar o ritmo das interações, o fluxo comunicacional e o movimento das relações. É tentador se render à narcose das profundezas88 e se transformar em uma sinapse em tempo integral do grande cérebro que se desenha nas infovias. Para quem mergulha num processo de investigação e conhecimento de um fenômeno, mesmo sabendo que ele é inapreensível como totalidade, também é difícil parar, organizar o que foi construído e apresentar: - Vejam, foi isso que encontrei até aqui.

87

(CARROLL, s/d, p.138) Narcose das profundezas ou narcose por nitrogênio é um quadro sintomático semelhante à embriaguez por álcool, com manifestações psíquicas, sensitivas e motoras. É provocado pela impregnação do sistema nervoso central do mergulhador por elementos da mistura gasosa respirada, que, além dos 30 – 40 metros de profundidade, aumentam de pressão. 88

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Neste sentido, concluir é um ato de vontade que toma forma no exato momento em que intuímos que é hora de, como Alice, acordar; como a orientadora, entregar o cartão de controle; e como a cibernauta, fechar as janelas e desconectar. E é desta forma que pretendo, provisoriamente, encerrar esta investigação. Como uma pausa para poder continuar.

Projetar o desconhecido para depois dissertar sobre o conhecido. Que não seja como despejar uma visão de um único olhar, mas que possa aprender as múltiplas visões, não como quem enclausura, mas como quem agrega. Links, sínteses provisórias escavando a contradição. É difícil mesclar a flecha do tempo com a rede e linearizar de certa forma aquilo que era pra ser hipertextual. O que era para não ter começo, tem que ter primeira linha e segunda e terceira. O que era para não ter fim, tem que ter ponto final, mesmo que seja de interrogação. Então vou me deixando circular, imersa, respirando aqui e ali. Pensando descer cada vez mais fundo para constatar, não sem surpresa, que chego à superfície. Primeira rodada, 1 x 0 para a totalidade, o todo segurando sem prender cada uma de suas partes. [Su, 07/04/2004, Onde anda Su?]

Se meu tempo foi controlado ao seguir estas rotas, não o é o do leitor. Não há pressa, então, em apresentar uma conclusão e fechar o caminho para o leitor. Mostrei este caminho como uma rota possível, porém todo o caminho passa próximo de desvios, atalhos, clareiras e lugares de descanso, atoleiros e perigos , onde os passos têm de ser avaliados, medidos, detidos, apressados e podem mudar radicalmente o ritmo e o rumo da caminhada. Deixo meus mapas marcados, quem quiser pode me seguir. Andando ou correndo pelas trilhas, fluindo pelos links, considerando os meus passos e fazendo suas opções. Conferindo os mapas, pois eles não são permanentes.

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APÊNDICE A - DADOS GERAIS SOBRE OS EDUCADORES PARTICIPANTES DA INVESTIGAÇÃO

210

DADOS GERAIS INVESTIGAÇÃO

SOBRE

OS

EDUCADORES

PARTICIPANTES

DA

A sondagem teve como objetivo levantar alguns dados sobre os educadores participantes da investigação com a finalidade de agregar subsídios para o planejamento das atividades. Os educadores que responderam ao questionário de sondagem foram os educadores que participaram no início do projeto em junho de 2003. Embora as características de formação e outras tenham variado o movimento de saída e entrada de participantes, o que se refere a conhecimentos e utilizações das tecnologias educacionais informatizadas permaneceu quase que inalterado. Preencheram o questionário oito educadoras, sendo cinco com formação em nível de graduação e três em nível de especialização.

Formação

80 60 40 20

63 % 38 %

Graduação Especialização

Figura 1 – Formação dos educadores e educadoras

A faixa etária variava conforme o seguinte gráfico:

211

Faixa Etária 50,0

50 %

40,0 30,0 20,0 10,0

25 % 12,5 %

12,5 %

20-30 anos 31 a 40 anos 41 a 50 anos 51 a 60 anos

0,0 1 Figura 2 – Faixa etária dos educadores e educadoras

Esta disposição modificou-se ao longo do projeto com a adesão de mais educadoras na faixa etária até 35 anos e desistência de educadoras na faixa dos 40 anos em diante. Esta variação modificou, também, o nível de formação do grupo, aumentando o número de participantes graduadas e diminuindo o número das especialistas. Algumas considerações sobre este fato encontram-se no capítulo seis da dissertação. A maioria das participantes utiliza o computador em casa e no trabalho, porém o uso da internet se restringe a metade das participantes. No gráfico a seguir estão os percentuais relativos ao uso do computador e da internet em casa e no trabalho, considerados em relação ao tempo em que estes meios são usados pelas participantes.

212

100%

Uso do Computador - Internet mais de 8 anos

90% 80%

6-8 anos

70% 60%

4-6 anos

50%

2-4 anos

40% 30%

1-2 anos

20% 10%

não usa/NP

0% casa trabalho 1 2 computador

casa 3

internet

trabalho 4

Figura 3 – Uso do Computador e Internet

No geral, o uso de computador e internet situa-se majoritariamente de quatro anos para cá e pode-se observar que tanto o computador quanto a internet são mais utilizados em casa do que no trabalho. Nota-se, também, que mais da metade das educadoras não utiliza a internet no trabalho e é grande o percentual das que não utilizam o computador. Como a maioria trabalha em escolas, pode-se inferir que estes recursos são pouco acessíveis ou inexistem em alguns locais de trabalho. Em relação aos conhecimentos básicos no uso de alguns recursos tecnológicos, as participantes avaliaram o seu nível de conhecimento, escolhendo entre opções que variavam de um nível alto até o desconhecimento do equipamento ou meio. Considerando os recursos mais utilizados em sala de aula: retroprojetor, tv/videocassete, projetor de slides, equipamento multimídia, os resultados foram os seguintes:

213

Nível de conhecimento no uso dos recursos tecnológicos

Multimídia/Computador

TV/Videocassete

Projetor de Slides

Retroprojetor

0,0

5,0

10,0

15,0

20,0

25,0

30,0

35,0

40,0

Percentual Alto

Acima da Média

Médio

Baixo

Não Conhece

Figura 4 – Nível de conhecimento dos recursos tecnológicos

O único meio que aparece como desconhecido é o equipamento multimídia para apresentações. Os níveis mais altos de conhecimento a respeito do manuseio e utilização vão para os recursos mais conhecidos e mais encontrados nas escolas: o retroprojetor e o conjunto tv/videocassete. Em relação ao uso básico do computador, que envolve as habilidades de ligar, desligar, executar programas, localizar arquivos, copiar, colar, usar o mouse etc. as participantes situam-se nos níveis de conhecimento médio e acima da média.

214

Uso Básico do Computador - Nível de Conhecimento 70

60

50

40

30

20

10

0 Ligar e desligar o computador, abrir programas,

Alto

Localizar arquivos, copiar, recortar, colar, criar pastas, salvar

Acima da Média

Médio

Uso do mouse, botões (dir, esq, central), arrastar, selecionar

Baixo

Não Conhece

Figura 5 – Conhecimento básico sobre o uso do computador

No conhecimento e utilização de outras tecnologias: aplicativos e ambientes diversos, recursos de internet etc. o panorama foi o seguinte:

215

Nível de Conhecimento no uso dos Meios

windows update 0

weblogs 0 comportamento na 0 internet regras de proteção na 0 internet Alto

Sistemas de Busca Acima da Média

Listas de 0 discussão/fóruns Médio

E-mail Baixo

Chat / irc / icq /... Não Conhece

Fazer download e 0 upload de arquivos, etc Softwares para 0 download Software para FTP 0

Editor de Html 0 Software para 0 apresentações Banco de dados 0

planilhas eletrônicas 0

Editor de Texto

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

Figura 6 – Conhecimento no uso da tecnologia

90%

100%

216

O nível alto de conhecimento aconteceu nos meios considerados os mais populares entre professores: o editor de textos, os sistemas de busca, o correio eletrônico e tecnologias de comunicação síncrona (chat, icq etc). Como o questionário foi aplicado já com o projeto iniciado, apareceu um nível acima da média para os weblogs o que é um resultado não fidedigno, pois nenhuma

das participantes tinha qualquer experiência no uso de um weblog. Outra questão foi sobre o uso de tecnologias no trabalho dos educadores. Numa lista de recursos mais usados os professores deveriam marcar a freqüência com que utilizavam a tecnologia em suas aulas. Os resultados compõem o seguinte gráfico: Uso de Tecnologias nas Aulas 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10%

Freqüente

Freqüência Regular

Pouco Freqüente

Figura 7 – Uso da tecnologia nas atividades docentes

Softwares

Ambientes Virtuais

Homepage

Pesquisa Internet

Listas de discussão/foruns

E-mail

Chat / irc / ...

multimídia

Vídeocassete / TV

Projetor de Slides

Retroprojetor

0%

Nunca

217

Quase metade das participantes nunca utiliza ou utiliza pouco todos os meios listados. Havia na questão um espaço para que o educador pudesse acrescentar algum meio não listado, mas não foram feitos acréscimos à lista. Pode-se pensar que a maioria dos professores utiliza apenas os meios tradicionais como quadro e giz nas suas aulas.

Em relação ao correio eletrônico, que é um meio de

comunicação assíncrona, simples e de muito potencial para as atividades educativas, tem-se que a metade dos professores não o usa ou usa-o pouco em suas atividades com os alunos, mesmo dispondo de internet em casa. Compare: Acesso à Internet em Casa

Uso do correio eletrônico N 13%

25,0

F 25%

tem % não tem %

62,5

PF 37% FR 25%

Figura 8 – Possibilidade de acesso à internet e uso do correio eletrônico

Este levantamento teve como objetivo dar uma idéia geral do perfil dos educadores em relação aos aspectos relevantes para o projeto e prover alguns subsídios para planejamento e não caracterizar profundamente o grupo participante da investigação.

218

Questionário de sondagem - Projeto [Zaptlogs] Diagnóstico sobre o uso das tecnologias da informação e da comunicação

1 - Dados Gerais: .:: marque com um X Seu nível de formação é: Graduação Especialização

Masculino

20 – 30

Mestrado

Doutorado

Outra - citar

Faixa Etária 41 – 50

51 – 60

+ 60

Sexo: Feminino

31 – 40

2 – Uso do computador e da internet: Assinale com um X se usa: Computador Internet Em casa No Trabalho Em casa No Trabalho

Preencha com o número de anos Tempo de uso do computador / internet Computador Internet Em casa No Trabalho Em casa No Trabalho

Windows

Sistema Operacional Linux Outro (qual)

3 - Conhecimentos e habilidades em relação ao uso de aparelhos e softwares: .:: legendas Æ nível A = Alto AM = acima da média M = Médio B = Baixo NC = não conheço N conhecimento/habilidade geral 1 Ligar e desligar o retroprojetor, acertar imagem, etc 2 Ligar e desligar o projetor de slides, projetar 3 Ligar e desligar o videocassete/tv, projetar, gravar 4 Ligar e desligar o Datashow/computador, apresentar

A AM M

B NC

219

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19

computador internet: Ligar e desligar o computador, abrir programas, Localizar arquivos, copiar, recortar, colar, criar pastas, salvar Uso do mouse, botões (dir, esq, central), arrastar, selecionar Editor de Texto (word) planilhas eletrônicas (excell), criar, utilizar Banco de dados (Access), criar, utilizar Software para apresentações (powerpoint) Editor de Html – ferramentas de web design (front page) Software para FTP (cute) Softwares para download (get right) Fazer download e upload de arquivos, etc Chat / irc / icq / netmeeting /msmessager E-mail (correio eletrônico) Listas de discussão/fóruns – criar, moderar, configurar Mecanismos de Busca (google, altavista,...) Mecanismos e regras de proteção na internet (anti-virus) Netiqueta – comportamento na internet Weblogs – o que são, como usar Windows update Outros (listar abaixo):

A AM M

B NC

20 4 - Freqüência no uso de tecnologias na sua ação pedagógica (atualmente): .:: legenda Æ F = Freqüente N = Nunca

FR = Freqüência Regular PF = Pouco Freqüente NC = não conheço

Nº Tecnologia 1 Retroprojetor 2 Projetor de Slides 3 Vídeo Cassete / televisão 4 Data Show (power point) 5 Chat / irc / icq / netmeeting /msmessager 6 E-mail (correio eletrônico) 7 Listas de discussão/fóruns – criar, moderar, configurar 8 Consultas/pesquisas (usando sites e mecanismos de busca) 9 Homepages , murais eletrônicos de disciplina 10 Ambientes Virtuais 11 Softwares Outros (listar) 12

F

FR PF N

NC

6 - Descreva o seu interesse, como professor, nas tecnologias da informação e da comunicação, para uso educacional:

APÊNDICE B - ROTEIRO DE TRABALHO

221

APÊNDICE B - ROTEIRO DE TRABALHO

Projeto [zaptlogs]

Período: Julho à Dezembro de 2003. Carga horária: 4 h/a semanais presenciais - 4 h/a semanais on-line Local: LIES / UFRGS

Objetivo Geral:

Utilizar com autonomia as TEI no trabalho, construindo conhecimentos por meio da vivência de situações de construção e utilização das TEI em atividades colaborativas/cooperativas num ambiente virtual de aprendizagem.

Cronograma

Semana

Conteúdos / Atividades*

09 jul 2003

Apresentação geral do Cronograma. Internet. Redes.

16 jul 2003

Correio eletrônico. Cadastro no blogger. Postagem.

23 jul 2003

Instalação do wbloggar. Criar blog de teste. Explorar possibilidades.

30 jul 2003

Postagem, uso de ferramentas do wbloggar

06 ago 2003

semana acadêmica – oficina de apresentação do Projeto ZAPT http://planeta.terra.com.br/educacao/Gutierrez/pres/zapt/

13 ago 2003

Listas de Discussão

20 ago 2003

seminário: sondagem, retrospectiva, projetos, avaliação.

27 ago 2003

Listas de discussão. Sistemas de comentários.

setembro

recesso

01 out 2003

Reunião

08 out 2003

Imagens: visualizar, editar, compor. Criar arquivo virtual.

222

15 out 2003

Estruturando os weblogs. Adicionar links.

22 out 2003

Servidor de hospedagem de páginas. Disco Virtual. Página básica.

29 out 2003

Chat. html. RSS. Projetos.

05 nov 2003

Oficina de criação de pôsteres

12 nov 2003

Treinamento para apresentação no Salão de Iniciação Científica.

19 nov 2003

Sistemas de Busca

26 nov 2003

Hipertexto

03 dez 2003

Hipertexto

10 dez 2003

Seminário sobre projetos

17 dez 2003

Pesquisa na web. Encerramento das oficinas.

janeiro

Acompanhamento dos projetos.

* Atividades detalhadas em http://planeta.terra.com.br/educacao/Gutierrez/blogs/ativ

Avaliação:

Permanente, em conjunto com o grupo, retroagindo sobre as atividades. Realizada nos encontros ou durante a semana na interação por meio do blog / lista de discussão.

APÊNDICE C - NOTAS SOBRE A REVISÃO DE LITERATURA

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APÊNDICE C - NOTAS SOBRE A REVISÃO DE LITERATURA

Anotações breves sobre alguns trabalhos lidos e considerados relevantes para este estudo. Nestes estudos procurei enfocar os pontos principais abordados pelo autor e destacar os assuntos que trouxeram alguma contribuição para esta dissertação.

1 Rede virtual de aprendizagem: interação em uma ecologia digital

MAÇADA, Débora L. Rede virtual de aprendizagem: interação em uma ecologia digital. Tese (doutorado) - Pós-Graduação em Informática na Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2001. 158p.

Tese em Informática

na Educação da Pós-graduação em Informática na

Educação (PGIE) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O objetivo geral desta tese é “identificar atratores de interatividade em ambiente virtual de aprendizagem constituído por uma rede de tecnologias, com base na concepção de uma ecologia cognitiva digital” (MAÇADA, 2001), a partir de uma experimentação em um AVA (Ambiente Virtual de Aprendizagem), a fim de dar visibilidade e amplitude a convivência de professores em formação nestes ambientes. O estudo tenta responder as seguintes questões: a – Que atratores podem subsidiar uma análise da interatividade em situações de aprendizagem em um AVA? b – Como os resultados deste estudo podem contribuir para delinear uma proposta de curso de formação de professores em um ambiente virtual de aprendizagem, considerando as possibilidades de convivência que se abrem, trazidas pelas novas tecnologias?

225

A pesquisa foi classificada como um “estudo-ação” e analisa a interação de um grupo de professores de matemática num AVA, tendo como foco a interatividade nas situações de aprendizagem. Os

professores

trabalharam

construindo

projetos

de

aprendizagem

cooperativos, escolhidos pelos autores, partindo da realidade vivida. Projetos que satisfizessem a curiosidade de seus criadores, alunos e professor, onde regras, atividades eram elaboradas pelo grupo em decisões heterárquicas, proporcionando a construção do conhecimento. O parâmetro conceitual utilizado é o processo de tomada de consciência verificado no movimento das relações entre os atratores. Os atratores considerados foram: aprendizagem cooperativa; atitude e prática interdisciplinar; versatilidade tecnológica; projeto de aprendizagem. O referencial teórico principal que dá suporte a esta investigação é em Piaget e Maturana. Para Maçada, a interação é o operador da possibilidade de aprendizagem e o conjunto de interações produz cooperação, pois pressupõe reciprocidade e produz liberdade e autonomia. A versatilidade tecnológica é desenvolvida não por treinamento específico, mas por imersão em assuntos do interesse dos alunos. “Para desenvolver a versatilidade tecnológica, não é necessário um treinamento específico sobre o funcionamento do hardware e do software. É necessário, sim que utilizemos a tecnologia vinculada, interligada aos nossos interesses de acordo com nossas necessidades, descobrindo as possibilidades e ajustando-as às necessidades.” (MAÇADA, 2001, p. 65). Concordo com a autora, pois a tecnologia é transitória, sempre surgem inovações e não adianta aprender apenas a clicar certos botões.

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O estudo apontou para a ampliação das interações e constituição de um espaço de convivência e possibilitou mudanças significativas nos ambientes de aprendizagem. Os resultados podem servir de subsídio para a construção de um modelo de AVA focado nas interações que dão visibilidade as relações entre os atratores e aos processos de aprendizagem. Algumas conclusões: “[...] suas necessidades, tanto pela interação como para construção dos projetos de aprendizagem, que determinaram o uso de tecnologias.” (p. 141) “A comunidade tornou-se ativa em seu próprio processo de desenvolvimento [...]” (p. 141) “[...] criou-se um novo domínio para seus participantes, um domínio digital, que se acopla a outros domínios da existência.” (p.142)

2 Perspectivas e sentidos na interação virtual em rede telemática

MARTINS, Márcio André Rodrigues. Perspectivas e sentidos na interação virtual em rede telemática. Porto Alegre: UFRGS, 2001. 158p. Dissertação (Mestrado) Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2001.

Estudo realizado com base nas teorias de Piaget e da complexidade, principalmente os sistemas dinâmicos auto-organizativos (Prigogine). A investigação partiu da seguinte questão: “Como o processo de interação/reflexão na rede telemática, que se produz no entrelaçamento com/na lista de discussão, levaria, pelos processos organizativos e auto-organizativos neste espaço, a transformar um aparente 'sem sentido' em organização complexa, como se fragmentos desencontrados fossem articulando-se,

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produzindo novas coerências, invadindo as mentes individuais e gerando um sentido mais amplo, próprio de uma inteligência coletiva? E se esta transformação produziria/potencializaria o interesse e o envolvimento emergente pelos processos de mudança permanente, pela surpresa de explorar o ainda desconhecido?” Referencial teórico: Piaget, Prigogine, Morin. Traz o conceito de ZIT (Zona de interação Telemática), como espaço que se cria no âmbito da lista de discussão (ambiente de interação). Procura mapear os atratores e restritores em relação aos processos de reflexão e participação. O estudo trouxe visibilidade para os atratores e possibilitadores por meio de sua relação de tensão entre os paradigmas educacionais presentes na escola. O estudo demonstrou que, por meio da interação, os restritores podem vir a ser possibilitadores, sendo o ambiente telemático operador deste processo. Isso, a partir da tomada de consciência dos professores e teve como conseqüência a apropriação crítica dos próprios recursos utilizados. O trabalho prevê uma continuidade com foco na ZIT, aproximando as teorias de Prigogine na interpretação das instabilidades e flutuações. O autor conclui que a teoria das estruturas dissipativas de Prigogine “permite reconhecer nas instabilidades de um evento, a possibilidade de uma transição: da descrição em termos de trajetórias individuais desencontradas, a uma descrição probabilística, produzindo uma quebra de simetria temporal e provocando uma dinâmica equivalente à dos sistemas caóticos.” (p. 150) Pode tornar possível a novidade por meio de novas coerências tida anteriormente como impossível.

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3 Informática educativa no Rio Grande do Sul: um estudo das possibilidades de inclusão em uma escola pública

BOLL, Cíntia. Informática educativa no Rio Grande do Sul: um estudo das possibilidades de inclusão em uma escola pública. Porto Alegre: UFRGS, 2000. 204p. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2000.

Este trabalho faz uma abrangente cronologia e apresenta os principais projetos de Informática Educativa no Brasil, no Rio Grande do Sul e no município de Novo Hamburgo. Historiciza as políticas públicas e o processo de implantação da Informática Educativa, discute o momento atual do PROINFO e centraliza a investigação sobre uma escola Municipal de ensino infantil e fundamental de Novo Hamburgo. Tem como foco fortalecer a idéia de que as políticas públicas em Informática educativa necessitam ser contextualizadas e problematizadas em sua implantação. Usa, para isso, um referencial teórico em Paulo Freire. Algumas constatações do estudo: •

Resistência por parte dos professores a alterar seus processos de trabalho e incluir a com informática educativa.

Falta de tempo e de condições de trabalho para que os professores possam aderir as propostas de implantação da informática educativa. A maioria trabalha em dois turnos, em duas escolas e leva tarefas para casa. A maioria não tem computador em casa.

Para a autora, esta inclusão da informática educativa no trabalho dos professores é um processo que não pode ser acelerado. Deve, por exemplo, esperar o momento em que os professores possam se colocar ao mesmo tempo como professores e pesquisadores.

Na formação de professores, existe a tendência a que a informática educativa se restrinja aos laboratórios e seus professores, não se estendendo a escola como um todo.

229

A autora propõe uma formação continuada/em serviço como processo onde o educador ensina pesquisando.

4 Experiências de formação e capacitação de professores em informática da educação em nível universitário e básico.

ORTH, Miguel Alfredo. Experiências de formação e capacitação de professores em informática da educação em nível universitário e básico. Porto Alegre: UFRGS, 2002. 167p. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2002.

Trabalho que busca conhecer as ações desenvolvidas na década de 90 do século XX, pelos coordenadores, docentes orientadores, docentes orientados, egressos e equipe técnica do GIE/FACIN da PUCRS e do LEC/PSICO da UFRGS, na formação/capacitação de professores em Informática da Educação. Para o autor, o PROINFO não logrou alcançar seus objetivos, embora a sua inovadora política descentralizada de formação e de ter sido introduzido via pesquisa, em parte devido às contradições surgidas de sua interação com as políticas públicas nacionais para a Informática na educação e de sua interação com práticas sociais e culturais historicamente construídas e instituídas. Aponta a aproximação com a teoria do capital humano e o tecnicismo e a adequação ao capitalismo mundial que perpassavam as políticas públicas como motores destas contradições. Um dos resultados é que na década de 80 a informática era priorizada em detrimento da educação.

APÊNDICE D - LISTA DE DISCUSSÃO

231

APÊNDICE D - LISTA DE DISCUSSÃO

Página da Lista de Discussão em http://br.groups.yahoo.com/group/zapt

APÊNCIDE E - TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO

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APÊNCIDE E - TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO Termo de Consentimento Informado Eu, _____________________________________________________, autorizo a utilização, para fins de pesquisa, dos dados fornecidos à pesquisadora Suzana de Souza Gutierrez, durante pesquisa realizada no Programa de pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Declaro que: 1 – Fui informado(a) que a pesquisa tem como título “Mapeando caminhos de autoria e autonomia: a inserção das tecnologias educacionais informatizadas no trabalho de educadores que cooperam em comunidades de pesquisadores”. Seu objetivo geral é: Investigar a constituição e o desenvolvimento de comunidades de pesquisadores, identificando e analisando as contradições em movimento neste processo, a fim de contribuir para a construção de alternativas para a formação de educadores autores e autônomos na construção e na utilização das tecnologias educacionais informatizadas. 2 – Estou ciente que se justifica a realização deste estudo considerando que todas as questões referentes ao uso da tecnologia, a sua criação, seu papel no cotidiano das pessoas e na educação, os espaços e interações que elas criam, as relações que emergem nestes espaços, são questões importantes e urgentes para a humanidade. Para isso, tornase vital a investigação, a ampliação e a troca de conhecimentos nesta área por parte dos educadores e das instituições educacionais. 3 – Estou ciente de que serei observado(a) e concordo com os seguintes procedimentos: a) participação em reuniões e oficinas; c) responder questionários e entrevistas gravados e transcritos ; d) participar na construção e utilização de ambientes virtuais; e) participar de avaliações no âmbito desta pesquisa. 4 – Estou informado (a)

que: a) A pesquisa obedece às normas éticas e não

apresenta riscos a minha pessoa; b) Serei esclarecido(a) antes, durante e no final da pesquisa sobre quaisquer questões sobre a pesquisa; c) Minha identidade e os dados fornecidos serão utilizados da forma como se apresentaram/publicaram e concordo em ser identificado(a) no relatório de pesquisa; d) Este consentimento poderá ser retirado em qualquer fase do estudo sem penalização. Porto Alegre, ____ de ___________ de 2003.

____________________________ Pesquisado Nome: Ident:

___________________________ Pesquisador Suzana de Souza Gutierrez Ident: 4031907548 SSP contato: 51-9965092

[PDF] Suzana de Souza Gutierrez - Free Download PDF (2024)

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